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10 de setembro de 2018

{O demônio me forçou a fazer isso de segunda}


1ºQuadro (esquerda para direita)
Lúcifer E os mortais, eu te pergunto -- Porque? Me diga porque?
Sandman "Porque" o que, primeiro entre os caído?
Lúcifer Porque eles me culpam por todas suas falhas?
2ºQuadro
Lúcifer Eles usam meu nome como se eu passasse o dia todo sentado em seus ombros, forçando-os a cometer atos que eles de outra forma achariam repulsivos.
3ºQuadro
Lúcifer "O demônio me forçou a fazer isso". Eu nunca fiz nenhum deles fazer nada. Nunca. Eles vivem suas próprias vidas. Eu não vivo a vida deles por eles.
Lúcifer  Não. Eles pertencem a si próprios... ...Só odeiam ter de aceitar isso.
(Gaiman/Jones/Russel)


Reupando um velho post mas que continua tão poderoso quando quanto foi publicado na década de 90.

23 de outubro de 2016

RIP Steve Dillon

Com grande tristeza comecei meu domingo com a notícia do falecimento de um dos mais brilhantes artistas dos quadrinhos Steve Dillon aos 54 anos.

Com seu traço simples que mescla o cartunesco com o real, Dillon deu vazão a uma enormidade de tresloucadas criações na brilhante série Preacher (como Cara de Cu, o Santo dos Assassinos para citar alguns) e em suas várias passagens por títulos mensais como Hellblazer, Justiceiro e inúmeros outros.

Realmente fará falta no cada vez mais tradicional e sem imaginação mundo dos quadrinhos atuais.

Uma pena...

10 de janeiro de 2015

{EDITORIAL} Je ne suis Charlie

Jornalismo irresponsável
Quando comecei a escrever sobre a atrocidade ocorrida na França durante a semana que passou, eu comecei todo orgulhoso com a frase que pulula na internet em que, por solidariedade, fãs, amigos e outros membros da imprensa admitem que também são Charlie (Je suis Charlie).

A verdade é que sou um covarde (ao ponto que eu mesmo me auto censurei em algumas ocasiões para não escrever sobre tópicos espinhosos ou gente 'processadeira' como o juiz que se acha deus), e perto dos caras da Charlie Hebdo então? Porra, perto deles eu sou o Leão de O Mágico de Oz...

Não, não... Eu não sou Charlie, mas bem como eu queria.
Como eu queria ter essa coragem e falta de vergonha na cara de não só apontar o dedo pra ferida como cutucar e jogar álcool em cima como a Hebdo tanto e tão brilhantemente fez - e digo mais, ainda fará. E eu ainda tenho um enorme débito ao nunca falar antes, em meio a tantos 'grandes clássicos' e tantos quadrinhos que admiro, em meio a tanta coisa que comentei aqui no blog, foi necessário dois imbecis para que eu viesse a citar a revista. Uma pena que seja necessária uma tragédia para ver - e em alguns casos inclusive conhecer - a ousadia e o talento dos artistas do jornal.

Sutileza nunca foi marca da Hebdo (quando Michael Jackson morreu estampava na capa 'Enfim branco') e o desrespeito com as instituições sempre foi carro chefe (o conclave da igreja católica reunido em uma orgia homossexual ou a sugestão da igreja lidar a pedofilia tal qual fez Roman Polanski) mas a verdade é que a coragem destes senhores não é apenas um exemplo como realmente invejável, afinal, clamar em meio a ameaças que é preferível a morte à censura, é para poucos.

Não gastarei espaço para falar mal do oportunismo nesse momento, não quero eu também parecer ou ser um. Farei minha singela homenagem, no entanto.
Uma vez por mês, o já tradicional 'Filosofia de segunda', dará espaço para 'Je suis Charlie (au moins pour un jour)' ou "Eu sou Charlie (pelo menos por um dia)", com espaço para capas e charges do periódico.

Que ao menos nos sirva de exemplo.

19 de novembro de 2014

Pax Americana: Ou Como Grant Morrison escreveu Watchmen em 40 páginas

Na quarta parte do mega-evento 'Multivesity' (que poderia ser categorizado com outros megas: Confuso E enfadonho), Morrison finalmente mostra todo o talento do autor ao entregar um de seus melhores trabalhos de toda a carreira.

Se isso parece exagerado para quem reinventou o metalinguagem nos quadrinhos e escreveu materiais definidores do gênero de quadrinhos através de Homem Animal, Invisíveis, Grandes Astros Superman e Patrulha do Destino e muito mais que pode ser visto no fascinante documentário 'Talking with the Gods', na íntegra no Youtube... Bem, digo que não é.

Multivesity ganhou todo um novo contexto a partir desta edição, e, eu que vinha lendo no automático, me vejo impelido a aplaudir e louvar o trabalho dessa edição sem qualquer vergonha, pois é impecável.
Pra começo de conversa, é uma leitura para se fazer TANTO de frente parar trás quanto de trás pra frente, e não apenas isso, como recomendável essas duas leituras, no mínimo.

Eu em uma hora tive que reler essas duas vezes, e na empolgação voltei a quadros específicos, procurando alguns detalhes que passaram batido, mas sem dúvidas essa hq voltará a ser lida e relida (quando estiver com a versão em papel então, que procurarei detalhes virando o papel ou que talvez se omitiriam numa versão digital).

Por se tratar dos personagens da antiga 'Charlton Comics' (que inspiraram Watchmen), a história faz óbvios paralelos que ao mesmo tempo beiram os eventos da graphic novel de Alan Moore, os reinventam e os complementam - há uma dezena de cenas que são mencionadas em Watchmen e não mostradas, e Morrison faz questão de mostrá-las aqui.

Com alguns dos melhores roteiros de Morrison e uma das melhores artes de Frank Quitely, essa é uma das mais impressionantes colaborações da dupla, e ver todo o talento destilado em uma exuberante contribuição, é algo que vale a pena prestar atenção.

14 de novembro de 2014

Uma breve história do Flash - 75 anos do homem mais rápido do mundo


Existem alguns personagens que eu gosto, alguns que odeio, e outros que eu simplesmente adoro.
O Flash, principalmente sua fase pós anos 80 até anos 2000, com o brilhante Wally West, tendo de lidar com a morte de seu tio, o Flash anterior, e, assumir a responsabilidade do 'cargo', está em pé de igualdade com o brilhante Jack Knight de Starman (e sim, admito que várias vezes tentei incorporar o cavanhaque 'knightiano' e nunca ficou legal) como o herói mais legal pra mim.

Wally que surge como um imaturo garoto super veloz precisa lidar com uma série de mudanças em sua vida quando um dos personagens mais queridos do universo de quadrinhos (ei, mesmo vivendo no mesmo lugar que o Superman, quem tem um museu em sua homenagem?), e ver esse personagem amadurecer durante quase duas décadas - até que na última revisão do universo ficcional ele deixou de existir para seu tio, o Flash mais icônico Barry Allen, voltasse a ação.

Diferente de outros personagens, o poder do Flash é bastante simples e prático: Ele é rápido.
Ponto.

Ele se move rápido, ele controla seu corpo pra vibrar tão rápido que seja capaz de atravessar paredes e objetos sólidos (é, é, bem científico, eu sei), e, devido a velocidade ele também manipula o mundo ao redor através do uso de velocidade (correndo rápido o suficiente para brecar tornados - sim, eu já admiti que é incrivelmente científico - e correndo sobre corpos d'água).

Mas é isso. Seu poder é algo incrivelmente comum, bastante mundano até se considerarmos alienígenas superpoderosos que movem planetas, amazonas guerreiras com o poder de deuses ancestrais e guerreiros que carregam a arma mais poderosa do universo na forma de um anel que projeta pensamentos... O Flash faz o que Usain Bolt faz, só que bem mais rápido...

E essa é até a grande diferença. Ao contrário dos outros, ele pode muito bem fazer muitas e muitas coisas ao mesmo tempo. Ele consegue proteger e defender sua cidade como poucas, e, graças a uma genial combinação de artistas, ele manteve um estilo de quadrinhos que abraça os elementos absurdos (e idiotas como um vilão que atira bumerangues contra um homem que pode dar uma volta ao mundo em segundos), mantendo uma atmosfera mais amena, perspectivas até mais humorosas e vilões divertidos ainda que realmente interessante, sem perder o absurdo quadrinhístico (com direito a macacos telepatas que vivem em cidades escondidas no centro-oeste africano... JURO!

Essa é justamente a ideia do que faz o personagem ainda relevante nos dias de hoje cheios de heróis violentos rangendo dentes e vivendo em contextos ultrarrealistas... O Flash é um cara que corre rápido e enfrenta Gorilas falantes e homens que atirar bumerangues.
Sinceramente, quem poderia dizer em sã consciência que não gostaria de ser um pouco mais rápido?

7 de novembro de 2014

Como as pessoas não sabem que Clark Kent é o Superman?

Frank Quitely explica essa:


Ao contrário de outros personagens com pontos muito mais óbvios (sério, só eles detém a tecnologia, os recursos, o dinheiro e treinamento e NINGUÉM suspeita de suas identidades...), a questão que sempre perturbou fãs e não fãs de quadrinhos foi a ideia de que o 'disfarce' do Superman são meros óculos.

Quitely nesta arte fantástica e simples do encadernado 'All Star Superman' resume as diferenças entre os dois personagens com perfeição. Veja a postura (a linha azul apontando a coluna cervical, a condição do peito estufado no Superman enquanto Clark tem uma corcunda), assim como o cabelo (ensebado de Clark e lustroso, bonito do Homem de aço) e a expressão facial (submissa no primeiro, imponente no segundo).

Visualmente essa demonstração é perfeita, mas existe mais.
Clark usa um tom de voz diferente (essa o Christopher Reeve demonstra melhor que o Frank Quitely, é verdade), e o fato que o Homem de Aço não usa máscara (e é um alienígena com uma fortaleza inviolável no Ártico) faz com que a opinião popular de quem reside no Universo DC seja de que, bem, o Superman NÃO tem uma identidade secreta.

Isso mesmo.
Pra maioria da população da Terra, Clark não é o Superman porque simplesmente o Superman não tem uma identidade secreta...
Mas quem define melhor a história toda mesmo?
Quentin Tarantino (isso mesmo, em Kill Bill - volume 2, numa das cenas mais verborrágicas da história do cinema)

"O Superman não se tornou o Superman. Ele nasceu o Superman. Quando ele acorda pela manhã, ele é o Superman. Seu alter ego é Clark Kent. Seu uniforme com o "S" vermelho faz parte do cobertor com que ele foi envolvido quando bebê e com o qual os Kent encontraram. Aquelas são suas roupas. O que Kent usa - os óculos, o terno - aquela é a fantasia. É a fantasia que o Superman usa para se misturar conosco. Clark Kent é como o Superman vê a humanidade. E quais as características de Clark Kent? Ele é fraco... Inseguro... Um covarde. Clark Kent é uma crítica do Superman à raça humana".

Não obstante, a Universidade de Emory reforça a teoria de Tarantino como uma brilhante análise das duas personas e da necessidade de ambas para o personagem.



Pro alto e avante!
Alex Ross

24 de agosto de 2014

Batman 75 anos - Uma análise (pt 1)

O Cavaleiro das Trevas, o Cruzado Encapuçado, o Protetor de Gotham, o Terror do Submundo, o Maior Detetive do Mundo, o Bilionário Psicótico que combate o crime fantasiado... Os subtítulos acumulados nesses 75 anos são muitos.
E os motivos também.

O personagem representa uma junção catártica da noção de vingança (pais assassinados = vingança abnegada ao crime) com aquela noção distorcida do sistema judiciário norte-americano de 'justiça' (o criminoso que apodreça na cadeia e, se, for condenado à pena de morte que seja por um crime que cometeu - digo isso graças a graphic novel "Advogado do Diabo", em que o Coringa é sentenciado à cadeira elétrica mas o morcegão impede que seja executado por não ser autor do crime em questão) e isso somado a aventura, noções detetivescas (o gênero mais popular e explorado não obstante).

O personagem mudou bastante durante as sete décadas e meia, adaptando-se aos períodos e mudanças, algumas impostas, como o Comic Code que exigiu uma mudança de tom do personagem violento criado por Bob Kane - aquele com a luva roxa - que não se importava em matar, ou deixar o criminoso morrer. Ganhou um parceiro mirim nos anos 40, lutou na segunda guerra como todo norte-americano... Com uma baixa nos anos 50 (o Mccartismo e o início de recessão econômica entre a segunda guerra e o início da Guerra Fria).
Com o início da Era Marvel e Stan Lee trazendo mais atenção aos quadrinhos nos anos 60, o Homem Morcego também ganhou notoriedade com um estilo mais camp (sim, de Adam West), e com a atenção voltada ao personagem motivou a melhor qualidade editorial nas linhas do personagem - e aproveitando para trazer atenção para o universo de personagens com parcerias na série 'The Brave and the bold'.
Denny O'Neil, Neal Adams, Jim Aparo, Dick Giordano, Len Wein e companhia mudariam o foco das histórias para uma perspectiva mais aventureira - e os vilões começaram a ganhar o tom mais ameaçador, fazendo com que as ameaças fossem mais coerentes. Sumiam os 'bat-sprays-que-resolvem-tudo' e o personagem tinha maior propensão para falhar e esses erros tinham invariáveis conseqüências.
Nesse período, inclusive, há uma mudança de perspectiva na estrutura de combate ao crime do personagem (que vinha com um longo relacionamento com a personagem Silver St Cloud ) tornando-se um senador (sério), tentando mudar as políticas públicas e estruturar uma Gotham melhor.
Nos anos 80, após uma extensa revisão editorial para tornar o universo mais coeso, o personagem passa pelas mais drásticas mudanças de tom, assumindo uma perspectiva ainda mais séria e dramática (aproximando o foco numa perspectiva de 'mundo real'), colocando o personagem com problemas mais mundanos - que incluem o Homem Morcego ter as rodas de seu carro roubadas. Essa mudança de perspectiva traz histórias mais densas, vilões mais cruéis (A Piada Mortal com o Coringa aleijando Bárbara Gordon, ou Uma Morte na Família com o mesmo personagem matando violentamente o Robin com um pé de cabra), e se estende até a enérgica mudança de tom no início dos anos 90, com a Queda do Morcego, onde Bruce Wayne é substituído por quase um ano inteiro por um novo Batman (Jean Paul Valley, também conhecido com Azrael, e aquele Batman de armadura) que é mais violento, com uma visão mais direitista de que 'bandido bom é bandido morto' (e que a polícia não deveria atrapalhar sua visão de como o trabalho deve ser feito.

Esse é o período em que Tim Burton inicia a franquia de filmes (que acabaria nas mãos de Joel Schumacher) e uma adaptação muito melhor sai na forma da ultra-premiada série de televisão de Paul Dini e Bruce Timm, que revitalizou a galeria de vilões, e aumentando a percepção do público sobre as histórias do personagem, com um visual mais sombrio e um tom menos colorido (ei, era um desenho pra crianças, mas mesmo assim tem um tom sério e inteligente - e sim, TEM, no presente).
Com isso o personagem se tornou o forte para geração de franquias e séries derivadas com personagens secundários (coisa feita a exaustão durante os anos 90, quando o personagem tinha quatro séries mensais - Batman, Detective Comics, Shadow of the Bat, Lengends of the Dark Knight - enquanto gerava títulos como Mulher Gato, Robin, Asa Noturna - o antigo Robin - e, Azrael).

Desde o então o personagem não mudou mais muito.

Após a revitalização do personagem em 85 com o Ano Um de Frank Miller, a intenção que se seguiu foi de estabelecer o personagem como uma força irrefreável (que não se abala com um terremoto que destrói sua cidade, ou com a falta de ajuda e suporte que receba quando lhe são negados os recursos para reconstruir a cidade), e ao mesmo tempo obcecado e consumido por sua missão e jornada.

O personagem teve mais algumas adaptações cinematográficas (a trilogia de Christopher Nolan) agora nos anos 2000, e surgiu uma franquia de jogos de video game (os jogos 'Arkham') que reproduzem exatamente isso.

Ele combate e luta e insiste até o final, não importando com as conseqüências. 

E isso é parte de seu charme e apelo com o público.
Enquanto o personagem tem falhas, ele também é capaz e auto-suficiente. É um homem, sem poderes, sem anabolizantes, sem aranhas radioativas ou anéis mágicos, e ainda assim se impõe perante os vilões mais poderosos assim como seus aliados (muito mais poderosos).

19 de junho de 2014

Hellblazer - Tainted love

Arte de Francesco Francavilla
"I did my usual trick - took something good and made it rotten. Took love and made it into hate".

(Fiz meu truque de sempre - peguei algo bom e tornei estragado. Peguei amor e transformei em ódio).

Faz um pouco menos de um mês que pedi os três encadernados da fase de Garth Ennis publicados ano passado (na verdade o terceiro saiu esse ano, mês passado, mais precisamente) e, às vésperas de meu aniversário só recebi o volume 7 - Tainted Love, que por coincidência traz a emblemática edição 63, Forty, com o aniversário de 40 anos do mago canalha.

Há um que de sincronicidade que chega a ser curioso, mas sem dúvidas, me traz um grande presente antecipado.

Se eu recomendo esse material?
Poxa, com histórias incríveis como "Fear and Loathing" (que ao que me parecia seria o título do encadernado), o anual com a Confissão do Diabo, e a vingança do Rei dos Vampiros, além de minha história favorita de toda a parceria de Garth Ennis e Steve Dillon (que não é curta e inclui Preacher e o Justiceiro): A fantástica edição 71 "Finest Hour".

A história do piloto da segunda guerra que vê seu avião sem combustível e abatido por tiros tentando manter a calma e perseverar (mesmo contra qualquer chance e mesmo esperança) é simplesmente soberba, e uma leitura pra lá de recomendada.

Sempre bom ter algo de bom para ler num feriadão (após terminar de redigir e revisar um longo e enfadonho artigo científico).

21 de fevereiro de 2014

Potentes, prepotentes e impotentes de Quino


Quino é particularmente conhecido pelas suas tirinhas com a corpulenta garotinha altamente politizada Mafalda (que completa 50 anos em 2014! UAU!) - e sua trupe - mas nem por isso o argentino se resuma somente a esse trabalho.

Na verdade, longe disso...
Mas eu sou suspeito por demais para falar do trabalho do argentino... Sou fã mesmo, e não ligo pra quem achar que isso me tira a subjetividade. O cara é excelente, e é por isso que sou fã, e mais que isso: Ele é alguém capaz de encontrar sua própria voz - e expor um talento ímpar - num meio extremamente competitivo e repleto por sujeitos brilhantes e talentosos.

Seus outros trabalhos, compilados em diversos e fantásticos livros - como esse selecionado - trazem um humor satírico e ácido, que ora é tímido e bobo e ora consegue flertar com as verdades mais fundamentais da natureza humana, dividindo-se em temas comuns e cotidianos (trabalho, saúde, desigualdade social), e se compilam de maneira brilhante nas coletâneas da Martins Fontes (que também trouxe a maioria dos livros da Mafalda). Potentes, prepotentes e impotentes, como o nome já deixa bem claro pela sagacidade de uma poderosa alfinetada na estrutura capitalista.

Quino consegue traduzir seus pensamentos com um sutileza demonstrando toda a tenacidade, competência e o domínio da arte, tanto em quadrinhos sem qualquer palavra, naqueles pouco ilustrados, em outros cheios dos detalhes e nuances, noutros com um bocado de textos...



28 de janeiro de 2014

Grandes Clássicos dos Quadrinhos (ainda não lidos): Como evitar a morte e os impostos... e viver para sempre.

Há certa vergonha em dizer que eu nunca li essa obra - ao menos não mais que as primeiras páginas disponibilizadas num preview em um site de vendas que acho nem existir mais - até porque nos quase dez anos desde a primeira vez que soube da existência desse fantástico guia cômico de Will Eisner, somente uma vez me deparei com uma cópia física do mesmo (em um sebo de Barão Geraldo, com um valor que chega a ser obsceno na minha opinião, e é o motivo pelo qual o material não se encontra em meu poder).

Em sites não foram raras as oportunidades que vi o material, nem é pequena a lista de frustrações que tive nas tentativas de comprar (não entrega no Brasil; o frete pro Brasil é duas vezes o valor do livro; o site onde usei o cartão era falso e fez meu cartão ser clonado...), mas ainda tenho certeza que mais dia menos dia alguma alma caridosa dessa terra tupiniquim descobrirá essa pérola nunca dantes publicada por aqui. Ou alguém se deparará com tal volume - lembrem, meu aniversário é em junho! - ao que me avisará.

Claro que é chover no molhado elogiar o brilhante Will Eisner, e mesmo dizer que o homem foi capaz de operar verdadeiros milagres na arte de escrever quadrinhos e criar histórias e personagens cativantes e bem construídos. Eisner que se aventurou por quase todo tipo de estrutura (drama, ficção científica, super-heróis, contos detetivescos, guerra, humor e inclusive material didático), chega a ser difícil achar o que ele pôde fazer de ruim.

Nessa obra - que sequer consegui de fato ler, só a nota introdutória do autor foi suficiente para, dez anos atrás, me cativar: "Com o desenvolvimento das ciências e da medicina moderna, cada dia se torna mais possível evitar a morte. Os impostos, por outro lado, são um pouco mais complicados de se evitar"

É claro que é um material prévio ao seminal "Contrato com Deus" (de 1978), então fica difícil esperar algo no mesmo nível - e pela obviedade dos tempos e piadas - que seja mais que perfeito. Oras, é Will Eisner, e pra mim isso já é motivo suficiente para querer ler!

26 de dezembro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos (?): Os Invisíveis

Há mais de um ano eu tinha acabado de receber em casa a pesada coletânea com todos os sete encadernados com suas mais de 1500 páginas (que reúne os três volumes, com respectivamente 25, 22 e 12 edições em cada volume com uns dois contos curtos publicados numa revista chamada Vertigo Jam).

E confesso que ler o primeiro volume me deixou bastante empolgado... Já conhecia algumas das histórias, tinha lido alguma coisa quando foi publicado no Brasil, então realmente me interessava ver onde a história seguiria. E é quando surgem histórias de viagem no tempo (com alguma conexão a origamis e a bomba atômica de Hiroshima), reviravoltas sobre reviravoltas para alguma outra reviravolta (juro que não estou exagerando), e alguns finais brochantes. E então a história parte para seu desfecho no volume final, e... É algo para se ficar sem palavras.
Mas não num bom sentido.

Há um bocado de comparações com Matrix (juro que não sou o único que acha isso, veja aqui), sobre a questão da alegoria da Caverna de Sócrates (da possibilidade da realidade não passar de uma ilusão conforme o contexto do observador) inclusive sobre a estrutura de células terroristas organizadas para minar a figura autoritária dominante (que quer subverter a humanidade a uma condição de um vazio êxtase como meros instrumentos e ferramentas para as tais figuras dominantes). Até as noções dos personagens se balanceiam entre o filme e a história de Grant Morrison - um novato com enorme potencial que é conduzido pelo líder carismático e uma mulher fodona que quebra tudo (e que é o interesse romântico do novato) e passa a conhecer a realidade como ela é - enquanto descobre que tem um grande papel e destaque nessa nova condição.

Destaco que a ausência de nomes no parágrafo anterior é proposital.

Vou além: Tantos nos filmes como nos volumes, há enorme similaridade quanto a qualidade do conteúdo (No 1 é muito bom, tem grandes ideias e potencial, apesar de algumas limitações claras, que não existem no segundo e por isso, esteticamente é mais bonito, mas com um conteúdo menos empolgante, e que se perde num roteiro confuso - que descamba de vez tanto ao final do segundo quanto na parte final, o terceiro).

E é inclusive pelo excesso de confusão e problemas (o volume final com apenas 12 edições tem DEZESSETE ARTISTAS[!] e, inclusive no arco final alguns deles não seguiram o roteiro definido para as edições - fizeram só a arte que depois foi incorporada ao roteiro) que a série perde o impacto e um discernimento de constância na qualidade do material, e parte de sua relevância... Chegando a um ponto ao final em que as histórias de bastidores são mais interessantes que a própria história que foi publicada.

Como por exemplo a história que Morrison foi abduzido por alienígenas no Nepal e lá eles lhe contaram o roteiro das 59 edições... Ou as cartas trocadas com os editores para justificar o lançamento (e relançamento de vido a baixas vendas)...


Com certo pessimismo (até por isso o ponto te interrogação no título) vejo que a série padece dum mesmo fim de materiais como Lost em que, seja devido ao desgaste, sejam os mistérios mal conduzidos/dosados no desenvolvimento, ou principalmente pelo final sem sal - e conflitante com o que se prometia e havia de potencial no começo.

E justamente por isso, com o tempo é bem provável que seja apenas uma pequena e mixa nota de rodapé da história num futuro não muito distante...

20 de dezembro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos: O fim de uma era

Crise de identidade, publicada em 2004 como série mensal, traz algo que dificilmente vemos em histórias em quadrinhos... Ou filmes... Ou séries... Ou mesmo na literatura: A quebra de preconceitos de forma brutal e deliberada. Quase cruel.

É impossível não simpatizar com o protagonista e sua dor, cuidadosamente construída (contando no primeiro capítulo os detalhes de como conheceu a esposa e de seu relacionamento com ela), até a dolorosa cena em que ele descobre que ela fora covardemente assassinada em sua casa. Mas não é o mistério, não é o tom de investigação - do tradicional Who dunnit? (Quem fez isso, numa tradução livre) - que de fato prende a atenção.

Claro, isso faz parte, e Brad Meltzer trabalha de maneira magistral esse aspecto do roteiro. Estamos falando de um mundo onde assassinos podem se teleportar, carregar carros por sobre suas cabeças ou controlar mentalmente um exército de aparentemente inofensivos animais - ou insetos... Mas é o lado humano que caracteriza o desenvolvimento da relação destes que tão comumente são vistos combatendo monstros interplanetários e deuses conquistadores de outra(s) dimensão(ões), e nunca foram tão vulneráveis quanto nestas páginas, porque afinal, a dor é um sentimento universal.

E dificilmente alguém seria capaz de descrever ou capturar dor de forma mais poderosa que Rags Morales, como a cena em que Ralph Dibny encontra sua esposa (a primeira à esquerda) ou a angústia de Timothy Drake (o Robin) tem de ouvir os momentos finais de seu pai ao telefone enquanto a casa é invadida - e impotente em voltar pra casa à tempo.

Ainda há todo um pano de fundo de traição, hipocrisia e decisões difíceis para qualquer um - quanto mais para aqueles que deveriam ser um compasso moral para a sociedade... Lembrando muito de Watchmen de Alan Moore e Dave Gibbons com uma diferença marcante: Empatia.
Os personagens da obra de Moore, sem dúvidas são concebidos com uma análise psicológica elaborada - e ultra realista... Só que invariavelmente TODOS são canalhas, cretinos ou psicóticos em níveis perturbadores. Meltzer, por outro lado, trabalha com seres humanos facilmente identificáveis, com sentimentos de culpa, remorso e dor que são palpáveis (quase chegam a romper a quarta margem), e facilmente além de fazer o leitor pensar, também o fará sentir.

Coisas que a primeira imagem (sim, a do porta-retrato, apesar que essa do Ralph Dibny também é fantástica) retrata de maneira sutil e com um brilhantismo em todo o simbolismo que ela carrega que eu conseguiria falar por horas só sobre ela.

Mas é a citação final de Arthur Miller - "Podemos dizer que uma era chega ao fim quando suas ilusões básicas foram exauridas" (An era can be said to end when its basic illusions are exhausted) que expõe de forma visceral todo o tom deste trabalho que sem dúvidas merece uma - e possivelmente muita - (re)leitura.

Rags Morales esbanjando talento

11 de dezembro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos - Sandman (o mestre dos sonhos)

Muita gente já falou (e ainda fala) sobre Sandman, a saga mór de Neil Gaiman trazendo a vertente dos quadrinhos britânicos e - com ele dos artistas menos conhecidos do grande público, com uma arte mais 'suja' e até underground, de gente que dificilmente se adequa aos gêneros populares nos EUA, como o artistas Kevin Nowlan, Marc Hempel ou mesmo outros mais populares como Jill Thompson ou Charles Vess.

É interessante notar que a serie retrata muitas coisas ao mesmo tempo. Enquanto a vasta pesquisa de Gaiman traz logo de início uma breve demonstração do conteúdo que veremos no desenrolar da série - com o Rei demônio Roderick Burgess (figura real, que disputava no inicio do século XX o título de maior mago do reino unido com Aleister Crowley, que também é citado), a curiosa doença do sono que acometeu centenas durante o século XX e nunca teve exatamente muito de uma explicação e toda uma vasta cultura dos anos 80 (que se vê manifesta na participação de John Constantine ou nas figuras góticas, tanto de Morfeus, o senhor dos sonhos, como da Morte, sua irmã), além de muito mais, como história e fantasia confluindo e se misturando e confundindo.

A jornada do mestre do sonhos reverbera muito com uma questão de adaptação, de mudança. Gaiman, inclusive, uma vez perguntado como descreveria a saga em quinze palavras ou menos como "A jornada de um homem que precisa decidir entre se adaptar ou morrer".
Isso é, de fato, contemplado diversas vezes durante o desenrolar da série, inclusive no arco que considero meu favorito "Vidas Breves", quando o Rei dos Sonhos busca seu irmão perdido, Destruição, que séculos atrás havia abandonado o posto - e curiosamente as coisas continuaram a funcionar como se nada tivesse mudado.

J. H. Williams III

6 de dezembro de 2013

Grandes Clássicos dos quadrinhos: The Walking Dead


Completando dez anos agora em 2013, a série perdeu um pouco do vigor, é verdade, mas ainda é uma leitura muito interessante com reflexões sempre pertinentes sobre a nossa sociedade moderna - e o que significam os luxos e privilégios que desprezamos. Robert Kirkman brilhantemente tece uma longa trama sobre essa sociedade que chegou ao fim, e que, mesmo depois de qualquer vestígio de esperança.
E os mortos-vivos são apenas um pequeno empecilho diante dos verdadeiros monstros e dilemas.

Apesar de ser encontrada na ala de 'horror' (inclusive vem marcado na lateral de cada encadernado), e do tema de zumbis, a série mensal The Walking Dead desde o começo caminha nos rumos de um drama, dos contextos de relacionamentos interpessoais e o que representam as pessoas umas para as outras.
O apocalipse zumbi é só um cenário...

E existem muitas questões a serem discutidas... Segurança, o real valor das coisas (do tempo, das relações humanas e do dinheiro), a função do homem na sociedade (e da questão de emprego e trabalho), e a mais perturbadora de todas as questões: O que define um ser humano num momento de crise?

Pânico? Medo? Senso de sobrevivência - inclusive genética?
Sobra algum espaço para a bondade... Ou justiça?

Há um dinamismo bastante diferente na tentativa de trabalhar em 22 páginas algo que prenda o leitor (até o próximo mês) ao mesmo tempo que conduza uma narrativa maior, que se prolongue pelas seis edições (que completam o arco) e, em alguns casos se expanda de forma de melhor explorar as nuances deste terrível mundo novo que possui pessoas assim.

Eu poderia gastar páginas falando de momentos marcantes (a filosófica realização da natureza dos eventos ao final do volume 4, a brilhante virada de mesa ao final do volume 11 - só duas palavras: "Carne estragada" - o surgimento e queda do Governador - e agora de Negan)... Mas acho que vale mais a pena trilhar esse caminho sem saber exatamente o que esperar, além de uma história muito bem escrita, e personagens brilhantemente desenvolvidos... Até porque a graça da série está justamente nas surpresas e reviravoltas inesperadas. Como aquele personagem favorito dos leitores levando uma flechada no glóbulo ocular sem qualquer aviso ou cerimônia.

Vale a pena ler, ainda mais agora que é possível encontrar mais de cem edições já disponíveis para se ler numa tacada só - e promoções do Comixology já trouxeram todo o material publicado por menos de cem dólares (ainda melhor quando na época o dólar estava abaixo de dois e cinquenta).

ATUALIZAÇÃO (23/12/2013) --:> E eis que depois de muito tempo eu finalmente fui apresentado a verdadeira noção dos zumbis de The Walking Dead.
Sim, existe uma noção de simbolismo neles inserida, diferente das versões antigas de George Romero ou mesmo Mary Shelley com o monstro de Frankenstein (o morto-vivo original).

Qual o simbolismo, você me pergunta, caro leitor ansioso?
Os zumbis representam os idosos - e o caos e pânico é uma conseqüência de uma sociedade que envelhece cada vez mais - com menores taxas de natalidade, e maiores idades de óbito. Mais que isso: Durante a velhice essa sociedade convive em condições de semi consciência induzida pelo aumento de medicamentos.

Não obstante, você e todos os demais ao seu redor em breve se tornarão um deles.

29 de novembro de 2013

As melhores histórias do Superman

Duas das melhores histórias escritas para o Superman, como eu disse meses atrás, foram escritas por Alan Moore... E agora é hora de falar sobre elas!

São três as histórias - O que houve com o Homem do Amanhã (imagem ao lado), que traz a história final do personagem das Eras de Ouro/Prata, com o consagrado artista Curt Swan; Para o homem que tem tudo (anual de 1985, desenhado por Dave Gibbons de Watchmen) que traz um aniversário do personagem, vendo como seria sua vida em Krypton, se o planeta não explodisse; e a Linha da Selva (edição de DC Comics Presents, também de 1985, com Rick Veitch na arte) trazendo o encontro do Monstro do Pântano com o Homem de Aço.

Moore escreveu poucas histórias avulsas para os personagens da editora de Batman, Superman e cia - e além daquelas dos nomes citados nesse parágrafo, pouca coisa merece menção. Claro, claro, o Monstro do Pântano é uma excelente série mensal, mas eu nem conto, afinal contém um longo arco, e não apenas histórias avulsas, como as aqui citadas.

É claro que da pouca coisa remanescente, ainda existem histórias interessantes (como coletados num excelente - e hoje raro - encadernado com as histórias da Tropa dos Lanternas Verdes, Arqueiro Verde, Vigilante e outros).

Dessa coletânea, é realmente difícil definir qual delas é melhor, afinal são incríveis individualmente, e cada uma segue para uma vertente bastante diferente. Ainda assim, para uma leitura descompromissada, de alguém que nunca leu muito do personagem ou conheça pouco das cronologias de histórias em quadrinhos das editoras norte-americanas, sem sombra de dúvidas "Para o homem que tem tudo" é a história ideal.

Simples, rápida e direta, mexe com condições bastante clássicas - e facilmente identificáveis da natureza humana (e se alguma coisa pudesse realizar seu desejo mais íntimo? Seja uma droga, outro vício qualquer - ou no caso uma planta controladora de mentes...), e mais que isso... Como voltar ao mundo real depois de experimentar a realização de suas fantasias?
Uma vez que usei as palavras 'desejo', 'íntimo' e 'fantasias' num parágrafo parece que há algum tipo de tensão ou inflexão sexual, mas posso garantir que é a história mais 'para todas as idades' da lista... Apesar das brigas entre seres super poderosos e tudo mais, não há uma exposição de violência que chame atenção, com certeza é o roteiro que rouba toda ela.

O vilão Mongul também oferece uma participação memorável, ameaçador e ao mesmo tempo elegante, e os demais coadjuvantes (tanto no mundo real, como Batman, Robin e a Mulher Maravilha, quanto na Krypton dos sonhos de Superman) são muito bem desenvolvidos. Fica aquela impressão que, dadas as circunstâncias, a dupla Moore e Gibbons poderia render o desenvolvimento de uma série mensal admirável se eles tivessem tempo (ou oportunidade) para trabalhar nisso.


A Linha da Selva, também lida com uma condição bastante intimista, da mortalidade, quando o Homem de Aço percebe que foi exposto a uma terrível espécie vegetal de seu planeta natal, e, após enfrentar os sintomas iniciais de uma doença fatal, parte em viagem rumo aos pântanos da Lousiana onde encontra o bom e velho deus do Pântano.

O medo da morte, o suadouro frio e o pânico (marcantes no traço de Veitch) vão definindo o tom da história... E o tom de urgência, de desespero crescente...
Excelente história, mas não um pouco de foco, como as demais histórias, para caracterizar como  clássico incontestável, mas sem dúvidas é uma grande leitura.

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Por fim, volto ao começo do texto, com a história mais convoluta, que reúne toda sorte de vilão, herói, conhecido e bizarrice que fez parte da história do Homem de Aço até o ano de 1986 (que representa um reboot editorial, reintroduzindo os personagens ao mundo moderno... doas anos 80 pelo menos), e é de fato um deleite ao passado do personagem e seus leitores... Mas algumas coisas podem assustar leitores novatos, incluindo as bobagens envolvendo Jimmy Olsen ou os vilões patéticos como Mestre dos Brinquedos (juro) e o Galhofeiro (mesmo).

A história dos últimos dias, do(s) confronto(s) definitivo(s) com cada vilão, contada pela perspectiva de Lois Lane - como uma entrevista a um jornalista no futuro, tentando rememorar a história e vida do maior herói que o mundo conheceu... Sem saber que, como o final deixa a entender com uma simples piscada de olhos, ainda exista todo um longo futuro pela frente.

22 de novembro de 2013

Quem vigia os vigilantes?


Talvez a obra mais importante dos quadrinhos desde que a indústria nasceu nos Estados Unidos, Watchmen é uma marca, sem sombra de duvidas, de uma mudança no panorama da indústria e o estabelecimento de um ponto focal, um divisor de águas sobre o que define as histórias em quadrinhos como obras de arte - e até mesmo literatura, pergunte ao New York Times.

Mas, antes de continuar, é importante destacar que é uma obra difícil, e que acaba tendo grande parte de seu conteúdo perdido - ignorado - pelo fato de muitos dos leitores em sua primeira leitura se fascinarem pelo choque causado pela crueza com que retrate a violência, sexo e a faceta asquerosa do que há em nossa sociedade. E esse choque retratado pela belíssima arte de Dave Gibbons (com uma coloração incrível e perfeitamente combinada com o tom do material), que muitas vezes rouba a atenção dos leitores incapazes de entender uma tira de jornal de domingo - e eu nem estou falando daquelas (sem-graça) tiras cabeçudas do Laerte ou do New Yorker, cortesia de Jerry Senfield.

Entender a estrutura e a forma é metade do caminho, uma vez que isso é o que define e compõe Watchmen. É aqui que entram os contos da maldição do A Condenação do Corsário interpolando-se com a narrativa principal, os anexos ao final de cada capítulo (como Sob o Capuz de Hollis Mason, o dossiê sobre o Dr Manhattan e a ficha de produção de figuras de ação de Ozymandias das indústrias Veidt), a composição de páginas e quadros elevada à enésima potência (principalmente no capítulo 6 "Terrível Simetria", que compõe exatamente essa simetria na composição dos quadros tanto do começo pro fim quanto do fim pro começo) além das convenções para o desenvolvimento e estruturação da história. A história não é linear, e esse é um ponto importante - e muito diferente do comum a histórias em quadrinhos.
Na verdade, a história ocorre em momentos diferentes ao mesmo tempo. Temos os flashbacks, temos as versões diferentes sobre um mesmo fato (compondo uma figura maior), temos os bastidores ocultos em toda a história (mas claramente com um papel fundamental, como os presidentes estadunidenses e russos no conflito iminente no Afeganistão), e temos as narrativas em prosa, dos anexos. Há, em sombra de dúvidas, um grande empenho na forma, e, para os olhos mais atentos, cada quadro e enquadramento conta pesadamente para a composição do quebra-cabeças.

Mas, como está no começo do parágrafo anterior... Isso é só metade da coisa.

A segunda metade depende de noções mínimas de história (do século XX principalmente), de fatos históricos e do mercado de quadrinhos norte-americano.
Como a publicação de Action Comics #1 (com a primeira história do Superman), que, aparentemente é um fato inócuo a nós, mas, no universo de Watchmen, levou pessoas a tomarem as ruas fantasiadas como vigilantes para combater o crime. Esse, para o leitor mais atento, é o ponto inicial para perceber a diferença fundamental entre esse universo ficcional e o nosso mundo real, mas ainda há muito mais.
Por exemplo, a diferença no Vietnam quando os norte americanos possuem como aliado um homem capaz de manipular o átomo (e de vencer a guerra com um movimento de mão). Ou que Nixon não tenha passado pelo escândalo de Watergate (o que lhe concedeu sucessivas reeleições), graças, a essa vitória no Vietnam e à popularização dos heróis mascarados, atuando como agentes do governo.
Ou a guerra fria, em um constante alerta máximo, uma vez que toda a teoria de deterrância depende de um único homem (o Dr Manhattan) ao contrário de todo um intrincado e delicado conceito.
Ou ainda, que, num mundo onde um homem com uma máscara é visto como um herói (e tem toda a liberdade para bater em pessoas e ser visto como 'nobre' por isso) que alguns psicopatas possam se aproveitar para ganhar as ruas.
E é justamente essa análise/visão sobre a psicopatia (afinal, que tipo de pessoa acha justificável sair a noite para combater o crime sem o recebimento de um salário?) que define a grande pergunta e mote da série, e cunhada pelo filósofo romano Juvenal no original Quis custodiet ipsos custodes? que equivale a "Quem vigia os vigilantes?".

15 de novembro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos: A piada mortal

Pra alguns, a melhor história do Batman (e, facilmente a melhor história do Coringa). Pra outros é... A história definitiva do Coringa.

Inquestionavelmente importante para os quadrinhos de super herói, e, relativamente discutível em seu papel como marco na história dos quadrinhos como um todo, A Piada Mortal (não confundir com a Piada Mais Engraçada de Todos os Tempos) é uma história sobre loucura, criminalidade e os limites entre os dois.

É uma história polêmica, e com muitas polêmicas atreladas (Por exemplo teria o Coringa estuprado Bárbara Gordon? - vide a imagem abaixo que levanta a questão), com vários pontos que requerem mais que uma simples leitura - e mais abstração para se obter uma simples interpretação.

A obra lida com dualidade (com a presença do vilão Duas-Caras, a cena inicial e final que compartilham vários tons em comum), com as noções de máscaras - sob o contexto de fumaça e espelhos... E a noção de que o inferno está mais perto que parece (todos estamos a apenas um dia ruim dele).

Nisso ela trabalha na possível origem do Coringa (que, realmente nunca foi trabalhada de fato nos quadrinhos). O contexto geral é a história de um humorista fracassado comum, um cara sem dinheiro, sem respeito, com uma mulher que o odeia (e vai ter um filho - que ele não terá dinheiro para sustentar, e pode nem ser dele), e que é levado por alguns 'amigos' a um servicinho fácil em um laboratório químico.
O crime dá errado, e os bandidos são surpreendidos pelo Batman, resultando no perdedor convicto caindo acidentalmente em um tanque de reagentes, e, sair um outro homem (com cabelos verdes e uma pele naturalmente esbranquiçada).

O barato da história - como Christopher Nolan iria trabalhar genialmente depois em "O Cavaleiro das Trevas" (no filme ele conta três histórias diferentes sobre a origem de seu 'sorriso') - é que essa 'origem' pode muito bem ser apenas mais uma história contada pelo Coringa para justificar suas ações, sem nada de verdade nela.
Inclusive, há algo que ressoa na obra de Moore, sobre a vida ser apenas uma piada... Frase repetida pelo Comediante em Watchmen, e que não parece muito distante na interpretação de outros roteiros...



E de maneira semelhante são as (muitas) interpretações e subjetividades.
Porque o palhaço escolhe justamente a família Gordon para atazanar? Porque ao final Batman ri da piada do Coringa? O que é o enquadramento final (como num efeito de zoom in)? Seria a ausência de luz no último quadro uma metáfora para o assassinato do Coringa pelas mãos do Batman? Brian Bolland, o ilustrador, e Grant Morrison, o escritor escocês que vive malucão de drogas e viu ets, acreditam que sim...

Só que, como toda boa piada, você precisa entender sozinho.

8 de novembro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos: A Saga do Monstro do Pântano

Posso dizer, sem frescura alguma, que, de todas as obras de Alan Moore é a Saga do Monstro do Pântano o material que mais me surpreende.

Publicada entre os números 20 e 64 (mais uma edição anual) de 1984 até 1987 com a colaboração de mestres como John Totleben, Steve Bissette e Rick Veitch (que, posteriormente assumiria como o escritor titular da série a partir da edição 65) a série marca um dos primeiros passos da chamada 'invasão inglesa' que levou diversos escritores fantásticos do velho continente (Neil Gaiman, Grant Morrison, Jamie Delano e Garth Ennis, para ficar só em alguns) a trabalhar deste lado do Atlântico, sob a tutela da brilhante editora Karen Berger. 

Com um tom estabelecido como horror logo do início, a obra vai tomando um tom de misticismo-filosofia ao passar das edições, enquanto a figura do Monstro se desenvolve, e o universo ao seu redor floresce.

Personagens cativantes e asquerosos vão ganhando forma à medida que nos perguntamos, vez após vez qual a verdadeira natureza e forma dos monstros.
Está na figura decrépita composta de humus e musgo ou no homem de terno bem alinhado e de fala macia...?
"Quem são os verdadeiros monstros" é a primeira grande pergunta da série, que também questiona a noção de moralidade ("Onde está o mal na mata?"), e vai se desenvolvendo enquanto Alec Holland aprende melhor sobre seus próprios limites, e começa a desvendar mais sobre si mesmo.

E esse é o grande mote de toda a 'Saga do Monstro do Pântano'. Uma jornada de auto-descobrimento, para entender sobre a natureza/condição humana.

Minha história favorita, sem sombra de dúvidas, a edição 60 batizada "Loving the Alien" (em referência a uma música do Velvet Underground) em que John Totleben apresenta a mais poderosa arte de todo o material, na jornada pelo vácuo do espaço do Monstro do Pântano rumando de volta à Terra, e descobrindo como se deu a origem da vida no universo...

Preciso falar mais?

1 de novembro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos> MIRACLEMAN

Em 1982, Alan Moore (se eu não disse antes, o maior escritor da atualidade, e não é apenas de histórias em quadrinhos), reiniciou pela minúscula editora Eclipse a série do personagem "criado" por Mick Anglo.

Aspas valem bastante, porque de criação o personagem tem muito pouco... Ele, que surge em 1954 tem basicamente os mesmos poderes e coadjuvantes (como parceiros mirins que usam sua mesma fonte de poder - ao gritar seu nome) que o Capitão Marvel (ou SHAZAM) da Fawcett, com primeira publicação em 1940.

As diferenças são bem poucas - que consistem em fazer do personagem uma versão adulta e britânica do personagem da Fawcett, e o 'adulta' se deve ao fato da identidade secreta do Capitão Marvel ser uma criança, enquanto a de Miracleman ser Micky Moran, um jornalista na casa dos trinta.

Moran, ao gritar KIMOTA (ou Atomik ao contrário) recebe os poderes nucleares do Miracleman após encontrar-se com um astrofísico, e concedendo parte dos poderes a dois jovens (o Young Miracleman e o Kid Miracleman) ao proferirem o nome do herói.
Como eu disse, muito próximo da versão americana da Fawcett (troque 'astrofísico' por 'mago', KIMOTA por SHAZAM e Young Miracleman e Kid Miracleman por Mary Marvel e Capitão Marvel Jr, e é exatamente a mesma coisa)...

Até Alan Moore iniciar o Renascimento (Rebirth, título da primeira edição publicada pela Eclipse) que traz de fato uma versão adulta com uma longa e complexa analise sobre física, metafísica, vida inteligente fora do planeta Terra e super heróis (em apenas 16 edições).

É um começo deprimente, uma história pé no chão de um perdedor, gordo e casado, com pesadelos sobre uma vida que nunca aconteceu (as histórias antigas do personagem) sofrendo de enxaquecas, é onde encontramos Micky Moran, e, edição após edição seguindo seus passos como um super herói em um mundo menos colorido que as tradicionais histórias em quadrinhos (incluindo o extermínio de toda a população da Inglaterra na edição 15 quando finalmente dois seres de infundado poder se chocam - curiosamente parecido com o final de O Homem de Aço de 2013, não acham?).

A premissa de um herói realista - que viria a render a fantástica maxi-série Watchmen, na parceria de Moore com David Gibbons - é o que propulsiona o roteiro, que impacta cada uma das cenas chocantes, e encaminha para um bizarro final com toda a faceta psicológica que somente Alan Moore poderia imaginar, mesmo emprestando um pouco que Jorge Luis Borges (seria a realidade apenas um sonho do moribundo Micky Moran, cuja mente faz crer que recebeu poderes de sua exposição à radiação?).

Com o anúncio de que a editora Marvel Comics republique em 2014 o material, me parece bastante oportuno começar a falar desde já, e ir criando alguma expectativa, não?

18 de outubro de 2013

Grandes Clássicos dos Quadrinhos (independentes): Piratas do Tietê

No final da década de setenta, os quadrinhos americanos emularam os quadrinhos franceses e criaram a revista Heavy Metal - como uma variação da Métal Hurlant - com o propósito de oferecer espaço a produtores independentes e não convencionais para suas obras, com espaço para experimentações (e erotismo para ajudar a vender).
Basicamente é uma compilação, reunindo trabalhos de toda sorte de autor, com todo tipo de trabalho (histórias curtas, histórias mais longas, arcos completos e seriados, arcos fechados, textos...), reunindo gente como Moebius, Milo Manara, Alejandro Jodorowsky, Enki Bilal e mais uma leva de criadores talentosos.

Não para ali, inspirando na década de oitenta a Fierro argentina, e, no Brasil a fantástica Chiclete com Banana, reunindo Angeli, Glauco, Laerte na produção de uma revista independente que durou uns bons dez anos, e ao que reza a lenda, a primeira edição de Chiclete com Banana vendeu mais que a edição de Homem Aranha - publicada pela toda poderosa Abril - na época.

Do sucesso da Chiclete com Banana, surgiu a oportunidade do Laerte Coutinho criar uma revista própria para destilar toda a incrível gama de loucura que permeava em sua cabeça. Nascia assim a Piratas do Tietê.
Ao contrário de todos os exemplos citados até agora, Piratas era de produção do Laerte, única e exclusivamente, e a parte integrante da revista era anarquizar a cidade cortada pelo Tietê com todo tipo de assombração, monstro e simplesmente tipinho escroto que se possa imaginar.

E pra mim a grande sacada estava na altíssima octanagem que o brilhante cartunista conseguiu destilar em cada mínimo detalhe das edições... Fosse as capas (como você pode ver acima, da primeira edição), fosse nas tirinhas ou histórias curtas, fosse no desenvolvimento de histórias mais longas, aprimorando um storytelling que é raro de se ver (destaques para a brilhante "A quarta margem", também conhecida como "O Segredo do morcego" - por acaso, quer saber o segredo do morcego? - "O Lobisomem" e na brilhante participação de Fernando Pessoa - declamando poesia num barquinho no Tietê -, talvez a mais icônica história dos Piratas), mas com muito espaço para esquisitices e bizarrices como só o Laerte consegue fazer, ridicularizando a moral, os costumes e a situação da sociedade brasileira nesse período entre anos 80 e 90 (com transição entre a ditadura e a república, as instabilidades econômicas e financeiras e o Playcenter).

Eu ainda rio toda vez que me lembro do "Sindirata" (O Sindicato dos Piratas Bucaneiros Fibusteiros e Corsários em Geral da Região Metropolitana), e é justamente esse caos, essa cultura nonsense que faz sentido que permeia cada momento de uma das mais importantes revistas produzidas no Brasil.

Recentemente a Devir republicou pelo selo Jacaranda boa parte desse material em três volumes (bem caros se alguém me perguntar), com um belo acabamento de capa dura, ótima qualidade do papel e impressão.