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20 de fevereiro de 2025

{Resenhas de Quinta} John Wicked

Enquanto eu preciso ser bastante honesto e dizer que eu não gostei de Wicked - e os motivos vão desde o fato que eu não gosto de musicais no geral, de que o filme não termina somente estabelecendo uma continuação para a parte dois além de que a história é bastante rasa (não justificando que o filme fique sem um fim ou mesmo uma continuação, enquanto tenta argumentos bobos para criar uma escola de magia que não é tão legalmente distinta de Hogwarts) - eu genuinamente não posso dizer que o filme é ruim.

Talvez esteja revirando sua cabeça, a minha eu sei que está, mas é isso mesmo. Por mais que eu não goste de uma série de coisas no filme, não tem como eu dizer que ele é ruim. Droga, pelo contrário eu tenho que elogiar muito mais que criticar.

Veja por exemplo o fato que a Ariana Grande parece uma filha do Cigano Igor com a Jade Picon depois que fez um botox e ficou com uma única expressão facial que é de constipação. Por mais que isso seja claro e ela não consiga atuar nem que a vida dela dependa disso e isso seria sob qualquer condição algo ruim, o filme consegue reverter isso para que funcione. Como? Bem, de maneira geral fazendo com que a personagem de Ariana Grande pareça tanto ingênua como que seu diálogo seja irônico.

Ela continua incapaz de atuar, no entanto as cenas fluem de maneira que isso parece deliberado, usando essa atuação ruim dela para o benefício das cenas, além de elevar a performance já muito boa de Cynthia Erivo para algo realmente impressionante.

Além disso a cinematografia consegue tanto capturar o espírito da Oz clássica, enquanto constrói com o material um mundo idílico com suas rachaduras, e os efeitos especiais conseguem capturar e potencializar isso belamente.

Não posso falar das canções além de que elas não me incomodaram (não estou tentando fazer um elogio), ao ponto em que parece que a transição entre diálogo e música flui naturalmente (ou o mais natural possível dado o contexto de musicais).

Pra quem gosta de musicais é uma baita recomendação, pra quem não gosta, eu acredito que ao menos não vai incomodar como outros filmes do gênero.

 

16 de fevereiro de 2025

{A vida depois do Netflix} Afinal de contas para que servem os Oscar?

Cidadão Kane foi considerado em diversas ocasiões o melhor filme já produzido, inclusive figurando em primeiro lugar numa listagem do Instituto de Filme dos Estados Unidos (AFI) no aniversário de 100 anos da instituição. No entanto, na premiação do Oscar de 1942, Orson Welles não ganhou como melhor diretor, ator ou mesmo com melhor filme, perdendo para Gary Cooper em Sargento York (esse obviamente clássico atemporal que você ouvir falar muitas vezes, não?) e John Ford na direção e melhor filme com Quão verde era meu vale (eu não vou repetir a piadinha cretina anterior, você já pegou o tom, né?). Isso foi na 14ª cerimônia do Oscar, em um momento histórico com a segunda guerra mundial e bem, é um dos primeiros e talvez maiores exemplos de escolhas ruins da premiação...

Como em 1974 com o prêmio de melhor ator com Marlon Brando, Jack Nicholson, Robert Redford e Al Pacino... Todos superados por Jack Lemmon com Sonhos do Passado...? Ou que tal o ano seguinte de O Poderoso Chefão Parte 2 e Chinatown que trouxe novamente Nicholson e Pacino concorrendo com o prêmio de melhor ator (que talvez são os papéis mais icônicos de ambos) e perdendo novamente, mas dessa vez para ART CARNEY (é eu também não sei quem é mesmo olhando a página do imdb dele) por um filme em que ele cruza os Estados Unidos com seu gato.

Podemos facilmente falar dos anos 1990 com a Miramax ou mais recente, o filme que é considerado o maior fiasco da cerimônia, Crash de 2004... Ou ainda outros tantos exemplos sobre o esnobismo da cerimônia (e nem precisa ir mais longe que o ano atual em que Denzel Washington rouba a cena facilmente em Gladiador 2 - que é um filme bosta, sejamos honestos - e sequer recebeu o mínimo que é uma indicação) mas nada disso explicaria a grande pergunta: Afinal de contas para que servem os Oscar?

Bem, essencialmente é uma questão de poder, dinheiro e influência (ou se preferir, 'pretígio'), que reside nos estúdios usando sua reputação para garantir mais prêmios que os concorrentes para melhorar seu crédito, facilitando novas produções.

Enquanto grandes bilheterias oferecem esse exato mesmo cenário (poder, dinheiro e influência), muitas vezes isso é uma mera questão de sorte ou coincidência que resulta no sucesso quando em outras é o mais completo azar que colocar um filme que tinha tudo para dar certo com um resultado meh. (e nada disso garante qualquer poder de barganha aos envolvidos que são substituídos com enorme facilidade das continuações)... Além disso, o estúdio tende a imaginar quais filmes serão sucessos e tem potencial para franquias (inclusive pelos contratos de merchandising) e  aposta de maneira apropriada, forçando mais um produto entregue no prazo que um bom filme.

Com prêmios, no entanto, a qualidade do diretor, ator, atriz ou qualquer elemento no geral pode suplantar as limitações técnicas, de orçamento, de distribuição ou qualquer outro fator. Na verdade, é bastante comum que filmes com orçamentos minúsculos apresentem vencedores para premiações.

Por exemplo, com o orçamento de Duna Parte 2 (de 190 milhões de dólares - que nem é o filme mais caro lançado em 2024) seria possível fazer 31 vezes (com seus 6 milhões de dólares), e eu nem vou falar de Centenas de Castores (que custou somente 150 mil). Outros concorrentes mais caros como O Brutalista (10 milhões), Nickel Boys (23 milhões) ou Conclave (20 milhões) ainda que somados mal chegam aos pés do orçamento de efeitos especiais de Duna ou Wicked (e eu sei que você provavelmente se perguntou porque eu não citei Ainda estou aqui que custou 1,5 milhões, mas não faz sentido apontar cada filme).

Tudo isso ajuda e muito a atores, diretores e, bem, mais um monte de gente a conseguir destaque e maior percepção para outros mercados. Selton Mello que o diga gravando um remake de Anaconda...

Ainda assim, existem elementos que convergem para buscar não apenas nomes associados com filmes de maior prestígio como copiar ideias que deram certo para maior prestígio. Uma biografia de Freddie Mercury conseguiu um Oscar...? Ei, que tal Elton John, Bob Marley ou Bob Dylan?

Ou musicais se um deles deu certo e conseguiu prêmios ou maior destaque... 

Mais até que isso, o destaque a determinados filmes alimenta o ciclo de atenção, discussão e debate sobre esse material. Enquanto Emilia Pérez com suas 13 indicações recebe críticas e comentários sobre se são merecidas ou não, se é o novo Crash ou não ou o que mais for, filmes ou performances que escaparam do radar da academia (como Daniel Craig com Queer ou o filme Sing Sing). Mais destaque, mais discussão, mais engajamento (e mais receita)... Enxague e repita.

E, diga-se de passagem que isso nem é uma situação exclusiva do cinema, né? Vide o quanto de séries deram espaço para reboots e remakes ou novos projetos pura e simplesmente pelo sucesso com prêmios (sabe, como Chuck Lorre emplacando vários prêmios com Dois Homens e Meio para depois emplacar vários prêmios com The Big Bang Theory), e, facilmente podemos achar exemplos similares em outras áreas.

13 de fevereiro de 2025

{Resenhas de Quinta} A Sustância 2: Boogaloo Invernal

Comparar Um Homem Diferente com A Substância é injusto com o primeiro por vários motivos (principalmente porque o elenco parece saído de uma das continuações de Birdemic e a direção tem problemas enormes para manter o compasso da trama e fazer a história fluir), mas é possível ver elementos para a comparação.

O protagonista tem uma vida miserável até que um procedimento milagroso permite que consiga atingir padrões de beleza e com isso realizar muitos de seus sonhos reprimidos, é, usando esse resumo bem simples você pode contextualizar os dois filmes sem grandes problemas... Além do fato que isso é um resumo bem genérico e que ignora exatamente tudo o que faz os dois filmes se diferenciarem.

A personagem de Demi Moore é uma mulher realizada que conquistou tudo em sua vida e não quer abrir mão do sucesso custe o que custar. Com o personagem de Sebastian Stan, no entanto, ele nunca soube o que é uma vida normal ou mesmo uma vida comum, e esse anseio por uma vida comum o coloca no caminho para realizar seus sonhos reprimidos.

O problema é que quando ele consegue, bem, é isso. Sua vida não melhora porque ele continua sendo o mesmo homem que ele era antes (mas com a aparência do Soldado Invernal), com a mesma dificuldade para interagir com outros, os mesmos medos, receios e, bem, toda a bagagem que ele não deixou para trás quando sua aparência mudou.

E isso forma o aspecto para um estudo de personagem muito mais complexo e elaborado, o que permite para uma atuação com mais nuance e desenvolvimento pelo protagonista. Principalmente quando o filme tem a grande virada no roteiro por volta dos quarenta minutos (depois que fomos apresentados a todos os elementos e Edward sai de cena para que Guy seja o protagonista), quando Oswald, um sujeito que tem a mesma doença que o protagonista do filme aparece.

O filme se transforma completamente.

Oswald é um personagem incrível, cheio de energia e otimismo e que transforma a experiência claramente desagradável do filme sob a perspectiva de Edward/Guy até ali em algo bem diferente, mudando efetivamente a perspectiva sobre o universo em que os personagens vivem. E a presença dele muda a dinâmica do filme de maneira dramática.

Enquanto até a chegada dele só tinhamos atores ruins, uma direção meh e um único personagem que parecia se esforçar para criar uma experiência mais miserável que a Centopeia Humana, Oswald aparece e está sempre de bom humor que parece contagiar o núcleo da história.

Não que os atores ou a direção melhorem (ou mesmo o roteiro) mas o filme se torna uma experiência bem mais interessante, oferecendo uma perspectiva bem mais complexa sobre a natureza da situação toda.

Ainda assim (com um roteiro fraco, um elenco que se resume a uns três atores além de Sebastian Stan que estão se esforçando, e um diretor que provavelmente não sabe o que está dirigindo), o filme oferece uma experiência bem diferente, e ouso dizer, bem mais interessante que boa parte dos filmes de 2024.

Chances no Oscar? Bem, uma vez que o filme só foi indicado para Cabelo e Maquiagem, e as chances são boas nesse departamento, sim (afinal os prostéticos para transformar Stan em Edward são impressionantes), mas, eu acho que A Substância supera o filme nesse quesito. Para melhor ator, Sebastian Stan não foi indicado por esse filme, (o que é bem absurdo considerando que o outro filme - O Aprendiz - apresenta uma atuação bem pior), mas ele e o Timothée Chalamet estão ali somente porque precisavam de cinco indicações...

Se existir alguma justiça no prêmio de melhor ator, Colman Domingo  leva a estatueta, mas sejamos honestos, tudo indica pro Ralph Fiennes, e nem tanto pelo papel dele, mais naquelas de quando o Al Pacino ou o Denzel Washington ganharam (simplesmente porque foram ignorados em outros momentos com papéis bem melhores).

9 de fevereiro de 2025

{Deixa eu resenhar?} O que aconteceu com Emilia Pérez?

Até algumas semanas - mais ou menos na época do Globo de Ouro, quando o Brasil Para lerdos lançou uma campanha para difamar o Oscar - parecia que Emilia Pérez singrava os ventos como um dragão imparável e dominaria tudo em seu caminho, e, com um número gigantesco de indicações ao Oscar ficou cada vez mais claro que esse parecia o caminho para o filme.

É verdade que a indicação redundante para melhor filme e melhor filme internacional são bastante ridículas (ainda mais quando os papéis principais trazem várias atrizes estadunidenses bastante conhecidas como Zoe Saldana - sabe, que está no Avatar e em Guardiões da Galáxia - e Selena Gomez - da Disney e seriados como Somente Assassinatos no Prédio), mas se esse fosse todo o problema, bem, esse post seria bem diferente.

Para falar brevemente sobre o filme (porque o foco é cada vez menos ele e muitos dos próximos parágrafos focarão em questões de bastidores e até da vida pessoal dos atores envolvidos), a história retrata um líder de um cartel de drogas mexicano extremamente perigoso que solicita a ajuda de uma advogada não ortodoxa para ajudá-lo a se livrar da cadeia. Depois de assistir a um filme de 1997 de John Woo e sem a disponibilidade de Nicholas Cage, o traficante, simula a própria morte enquanto se submete a uma cirurgia de mudança de sexo para ressurgir como Emilia Pérez, e, em contato com sua feminilidade e nova identidade feminina tentar reparar o estrago que fez em seu passado.

E o filme é um musical (por algum motivo).

Sinceramente é bastante inofensivo, e não acredito nem que os elogios que o filme recebeu sejam merecidos (é bem medíocre) e ainda que eu não goste de musicais no geral (eu não consegui terminar Cantando na Chuva até hoje e duvido que um dia o faça), não é como se o filme oferecesse alguma experiência melhor pela existência dessas músicas. Ao menos me parece que o excesso de elogio se deva a um cenário de festivais que vislumbram algo bem diferente da realidade do cinema comercial - e que já vimos acontecer de novo e de novo.

Era pra ser um filmezinho pequeno e sem grande espaço que acabou inflando e crescendo para algo de proporções muito maiores que o material comportava (e obviamente merecia - com Globo de Ouro e recorde de indicações ao Oscar). Obviamente não foi produzido para ser o grande fenômeno global além de festivais e premiações (e talvez mesmo nesse cenário quando competia com algo como O Brutalista ou Verdades Duras ou Nickel Boys ou, acho que você já deve ter sacado o argumento, né?). Quando chegou ao grande público - que estava ouvindo somente enormes elogios e vendo o material ganhando atenção de prêmios da crítica, bem, a reação foi mais ou menos a mesma para a continuação do Coringa... Diante da espectativa, o material não entregou ou chegou perto disso.

Talvez seja algo fantástico do ponto de vista técnico (não saberia dizer sobre isso), só que isso nunca foi o suficiente para agradar o público, e honestamente, o material teria que ser estelar para conquistar o público além de um ponto de vista técnico... Sendo medíocre como é, bem, é só munição para a galera que produziu Mr Birchum.

No entanto, as críticas no geral são bastante inócuas e bobas no que tange o filme.

"Ah, mas o filme não retrata muito bem tal situação ou tal outra". É um filme, oras. Os diretores tem que tomar decisões para produzir a peça de ficção da maneira que melhor represente o material e a história que querem contar e não da maneira mais fidedigna com os fatos.

Tubarões raramente atacam pessoas (menos de CEM pessoas por ano), Oskar Shindler não foi um sujeito tão bonzinho (vocês sabem que ele era um nazista, né?) e provavelmente não existe nenhuma guerra nas estrelas com sabres de luz, lasers e tudo mais - e mesmo se tivesse, não faria barulho no vácuo do espaço. E será que precisamos falar sobre o retrato pueril (e até um tanto racista) de filmes como Conduzindo Miss Daisy ou O Livro Verde sobre o racismo?

Droga, eu poderia facilmente partir para centenas de exemplos para justificar que ficção não precisa se basear em fatos reais (que absurdo, não?), mas esses não são os problemas reais.

Sim, o filme retrata mal e porcamente a situação do tráfico de drogas mexicano e suas vítimas e a ausência de atores mexicanos para papéis proeminentes tira qualquer elemento de legitimidade para esse mesmo problema... Enquanto o cenário da transição de mudança de sexo redimindo um criminoso altamente violento (e não apenas isso) é preocupante para dizer o mínimo. 

Mas, lembremos, Martin Scorcese ganhou um Oscar por Assassinos da Lua das Flores ano passado, então justamente como um pedido de desculpas extremamente atrasado da organização por décadas de retratos racistas de indígenas (incluindo em Assassinos da Lua das Flores, mas ei), e, não é como se fosse muito melhor com o povo mexicano (que ou são retratados como preguiçosos, festeiros ou criminosos) ou com pessoas trans (que ou são alívio cômico, festeiras ou criminosas)...

Os problemas surgem aos poucos, de maneira gradual e vão erodindo a situação toda - e que mostram que bem provavelmente não se esperava que o filme ganhasse todo o destaque que recebeu porque as equipes de relações públicas não estavam minimamente preparadas para agir ou reagir.

Como com o diretor arrogantemente dizendo que não precisava pesquisar sobre um assunto que não conhece para melhor explicá-lo em seu filme, ou a equipe responsável pela seleção de elenco que ignorou atrizes mexicanas (para uma história que se passa no México - mesmo que filmada na França), depois foi ganhando mais gás com uma campanha suja tentando diminuir Fernanda Torres e o filme Ainda Estou Aqui na internet.

E aqui a coisa ficou feia. Meu Deus a coisa ficou feia.

Desencavaram alguns tweets de dois ou três anos da protagonista de Emilia Perez que são assustadoramente racistas... O tipo de coisa que faria Elon Musk fazer uma "saudação romana" (pisca, pisca), e olha que nem procuraram tanto, e, caralho a equipe de relações públicas só deixou a coisa degringolar e piorar mais e mais.

Teremos mais novidades nos próximos dias ou as coisas podem piorar ainda mais com alguma outra situação nova? Não ficaria surpreso e honestamente acho que por mais que a coisa tenha ficado bastante séria (e todo mundo envolvido com o filme entrou em modo pânico total), as coisas devem piorar um bocado antes de melhorarem um pouco.

A protagonista do filme provavelmente não será escalada nem para um documentário sobre essa tempestade de merda de campanha para o Oscar até a poeira baixar (e baixar bastante), e não sei se o diretor consegue se salvar muito melhor também...

Honestamente, não ficaria surpreso se o filme sair dos Oscar sem uma única estatueta...

6 de fevereiro de 2025

{Resenhas de Quinta} A Sustânça

Essa é uma resenha sem spoilers, ainda que para os elementos do final eu destacarei alguns spoilers específicos - para justificar minhas críticas ao filme.

Enquanto o material me lembra muito mais A Mosca de David Cronenberg (mas com mais peitinhos e menos elementos de horror biológico - até o último ato), eu confesso que em vários momentos MaXXXine de Mia Goth me vinha à mente, sobre como A Substância faz direito enquanto MaXXXine não... E não apenas porque eu assisti aos dois filmes num intervalo de duas semanas... Os filmes trabalham com tons semelhantes sobre sucesso, e como a concorrência é difícil (e desleal) em Los Angeles, o que força pessoas a, bem, nem sempre seguirem o caminho lógico e ético com isso aproveitando qualquer oportunidade que apareça não importando as consequências.

Ti West TENTA fazer o que Coralie Fargeat faz com a maior naturalidade. As escolhas de transições ou a edição, a forma de apresentar personagens, situações e conflito, e, ainda que seja uma diretora com pouquíssimos projetos em seu currículo, o talento se destaca.
 
A ideia do filme é de que, usando um tratamento químico misterioso seja possível obter uma versão melhorada de si mesmo (daí Demi Moore vira Margaret Qualley - e vamos manter nisso para limitar spoilers), e são estabelecidas as regras de maneria bem simples e prática de como o processo funciona. Isso claramente é absurdo (mas o filme nem tenta fingir que não é), partindo para uma estrutura de Além da Imaginação ou Black Mirror de como funciona o cenário e expandindo sobre ele com o desenvolvimento da história.

O filme é ótimo com uma direção estelar que apresenta uma aula de teoria cromatográfica e construção de cenas (com ângulos estranhos para câmeras, além de edição e cortes no momento certo para fortalecer o censo de alienação).

Além disso, claro, existe toda a maquiagem para a criação dos efeitos práticos das personagens - que se combina com os elementos anteriores - e se somam à extraordinária atuação das duas protagonistas que conseguem contrapor de maneira fantástica o dilema apresentado (com Demi Moore lidando com toda uma gama de dúvidas devido aos efeitos da idade - e mais importante do etarismo - enquanto Margaret Qualley externa confiança, e até uma certa inocência), principalmente o dilema existência das personagens que as regras do roteiro deixam bem claro desde o começo: Elas são uma única pessoa e não duas entidades separadas.

Isso representa uma série de rusgas entre as duas personagens que o filme explora muito bem e vai escalonando até um conflito final.

Mas o final é ruim na minha opinião. Não sei se o roteiro não sabia como terminar a história, se não sabiam quando terminar a história ou efetivamente qual deveria ser o final, ou se o roteirista é uma reencarnação de J R Tolkien e pensou que três horas e meia de finais seria a melhor solução e acabaram cortando uma parte disso mas para explicar melhor isso, só com spoilers, me desculpem.

Podia terminar uns dez ou vinte minutos antes (com o conflito final que eu apontei pouco antes), mas a história continua sem agregar algo novo e diferente para o que já vimos até ali.

Antes dos spoilers: Chances no Oscar? Cabelo e maquiagem é praticamente certeza mas, se houver alguma justiça remanescente no mundo para direção e roteiro original. Não acho que Demi Moore ganhe como melhor atriz, ainda que a indicação seja bastante justa (e num outro ano ela ganharia facilmente).


Então agora vão os spoilers:


Última chance, se você não quer saber sobre o fim do filme e porque ele é ruim você já recebeu dois avisos para parar de ler, não haverá um terceiro.


O fim do filme tem um conflito entre Sue (de Margaret Qualley) e Elisabeth (de Demi Moore - que acaba sofrendo dos efeitos colaterais do experimento com a substância), e, termina com Sue subjugando e matando Elisabeth.

Porém, isso resulta em uma rápida deterioração de seu corpo, e ela vê seu sonho se tornando um pesadelo - e isso seria um final perfeito (Sue perdendo os cabelos, dentes e todo e qualquer controle sob seu corpo) - mas esse não é o fim, ainda, e é a partir daqui que eu vejo os problemas se avolumarem.

Sue parte para um novo uso da substância na tentativa de criar uma nova versão melhorada de si própria, e isso fracassa criando uma aberração dismorfa e que segue para criar um espetáculo sangrento com explosão de órgãos e vísceras até o final da coisa toda, que incluí uma sequência de sonho bizarra (que ou eu não vi o propósito, ou não faz sentido ou é estúpida somente), e daqui temos um grande pastiche com o monstro sangrando volumes copiosos de sangue e explodindo membros e enquanto eu entendo alguns dos elementos (como os mesmos ângulos usados anterioremente ou a simetria narrativa com o começo e por aí vai), eu sinceramente não vejo o ponto no geral.

3 de fevereiro de 2025

{Resenha Lixo} Jurador Número 2

Olha, eu acho que essa é a resenha mais difícil que eu vou fazer por uma série de motivos.

O filme nem é tão ruim quanto muitos outros dos exemplos que eu já publiquei sob a tag de resenhas lixo, mas existe algo que continuou de novo e de novo martelando na minha cabeça sobre como o material não funcionava. Sobre condições normais de temperatura e pressão o filme seria meramente medíocre e esquecível.

Quer dizer, o elenco é ótimo, ainda que nenhuma das atuações seja particularmente memorável, o roteiro traz um dilema interessante no seu cerne, ainda que seja mais um drama de tribunal e inequivocadamente remeta logo de cara - inclusive pelo título - a um dos filmes mais famosos do gênero, Doze Homens e uma Sentença (e sim, eu sei que é baseado em uma peça para televisão), e, apesar dos clichês e de tudo o mais, bem, o filme é morno e sem graça no máximo.

Algo perfeitamente esquecível e que talvez seria inclusive legal de assistir enquanto se recupera de uma cirurgia da tireóide ou algo do tipo.

Mas onde eu vejo o meu maior problema com Jurado Número 2 vem de um ponto de vista político e ignorar seria hipocrisia. Por um lado talvez se o diretor fosse alguém diferente (sabe, não o ultra-republicano Clint Eastwood), é possível que o filme teria algumas sensibilidades diferentes e talvez se aproximasse de pontos tópicos de maneira bem mais contundente e crucial, e é incrível como as falhas do roteiro coincidem enormemente com argumentos repetidos exaustivamente pela extrema direita.

O protagonista do filme (e o jurado número 2) é um jovem JORNALISTA cuja esposa está grávida (de uma gestação difícil) e ele solicita sua exclusão do processo do juri, que é negada com a base de que ele (esse hipster jovem preguiçoso) não trabalhará um minuto a mais que sua jornada normal.

O QUE NÃO É O MALDITO DO PONTO! Mesmo que ele tivesse uma 'jornada' menor como jurado que em seu trabalho normal, ele não estaria disponível para uma emergência enquanto muito provavelmente estaria desfocado no assunto sério de um julgamento enquanto sua cabeça foca em sua esposa grávida que talvez esteja com alguma dificuldade...

E vai por mim esse não é o primeiro e nem o último exemplo que veremos durante o filme.

(Se não ficou claro, esse tipo de coisa foi e vai me deixando incomodado e irritado, por isso as maiúsculas e negritos extras - e eu diria até desnecessários).

Você tem o policial aposentado herói que continua se esforçando e devotando tempo livre para garantir que a justiça seja aplicada (ao contrário desses policiais liberais preguiçosos, HARN, HARN, HARN!), ou o alcóolatra que usa sua doença como escudo ou a mulher jovem que só pensa em sapatos...

Quer dizer, temos dois jurados negros que do começo ao fim destacam que enxergam o réu como culpado sem que, em momento algum, um deles que fosse destaque o ponto mais óbvio acerca do fato de que se o réu fosse negro a deliberação seria bem mais rápida (com um veredito de culpado antes mesmo de esfriar o café do meirinho - e se fosse um latino com tatuagens de gangue o advogado de defesa sequer falaria na sessão), mas tanto eles quanto outros dos personagens só tangenciam o fato de que o réu e a vítima são brancos e por isso o caso ganha alguma repercussão (inclusive a atenção de uma promotora buscando reeleição para o cargo).

O juri inclusive atua da forma de um tribunal das mídias sociais cancelando um sujeito inocente sem embasamento ou fatos concretos (enquanto, sabe, é trabalho da polícia e do promotor - e advogado de defesa - apresentar esses fatos concretos). Só porque o réu brigou com a vítima na noite que ela morreu e a chamou de vaca (além de demonstrar claramente comportamento violento) vão condenar o pobre coitado branco?

Ou mais especificamente, que um grupo com diversidade étnica (que incluem mas não se limitam a um homem e mulher negros, uma jovem médica asiática, uma jovem do oriente médio) esteja disposto a condenar um homem branco à cadeia (mesmo que o caso não apresente provas além de dúvida razoável) e seguir com suas vidas.

E isso foi gradualmente fazendo com que eu perdesse o interesse no filme e abandonasse a suspensão de descrença... Conforme a argumentação dos jurados chega a conclusões mais rápido que todo mundo que analisou o caso (incluindo o advogado de defesa) sem que em qualquer momento seja destacado o fato que a cor de pele do réu (e da vítima) são um fator importante no caso.

Quer dizer, o sujeito fazia parte de uma gangue (tanto que tem as tatuagens para provar isso), que é uma gangue com histórico de venda de narcóticos ilegais mas de alguma forma a promotoria não apresenta estes fatos como relevantes para a definição do caráter do réu? Droga, um video do réu de alguma rede social em que ele confessa seu amor inegável à vítima é apresentado como argumento da defesa, mas a promotoria não tem absolutamente nada de um sujeito que fez/faz parte de uma gangue que vende narcóticos...?

E enquanto os antecedentes não são reflexivos ou mesmo justificativas para um crime específico em julgamento (além de contaminar a opinião do juri conforme esse artigo do jusbrasil), será que uma promotora concorrendo à reeleição escolheria um caso tão frágil e fraco para atuar?

Quer dizer, o filme aponta que o casal brigava constante e frequentemente (e que o réu demonstrou comportamento violento inclusive na noite em questão), mas essa é a base toda do argumento da promotoria? Não existe alguma testemunha ou registro de agressão prévia para que tanto a polícia quanto a promotoria considerassem o caso como conclusivo e concreto?

Percebe como isso coincide com pontos da retórica da (extrema) direita de que as pessoas são condenadas sem um julgamento justo ou de que a polarização e a internet forçam a julgamentos rápidos e ríspidos sem o direito a contextualização e coerência... Mesmo que o próprio filme deixe claro que um sujeito violento que cometeu outros crimes ficaria livre enquanto uma pessoa lindando com um problema de alcoolismo ser condenado a até 30 anos de cadeia (por um acidente) correspondem a um cenário de justiça.

Se o roteiro ofercesse alguma dúvida sobre o caso (algo com a possibilidade de que o réu de fato tivesse cometido o crime - é, eu sei, que absurdo que um traficante branco com histórico de violência e abuso pudesse agredir uma mulher) ou mesmo maior espaço para reflexão sobre o real culpado (que talvez ele estivesse confundindo os fatos - inclusive em virtude de seu problema com alcoolismo), algo que um diretor como David Fincher ou Bill Hader (sim, depois de Barry eu acredito que ele faria algo muito bom com o material), nos mostra o potencial desperdiçado e os principais motivos pelos quais esse filme é uma resenha lixo.

Honestamente? Passe longe e veja qualquer uma das muitas versões de Doze Homens e uma Sentença que vale muito mais a pena.

30 de janeiro de 2025

{Resenhas de Mais uma Vez} E mais uma Quinta!

Existem alguns fatos que eu acredito que são importantes para entender a história do Guia do Mochileiro das Galáxias e porque ele funciona - e porque a continuação de Eoin Colfer não.

O primeiro livro da série foi publicado em 1979 (com os livros seguintes saindo em curto intervalo até 1984, com o quarto livro da série Até mais, obrigado pelos peixes, e um intervalo mais longo para o quinto e último livro em 1992, Praticamente Inofensiva). A série efetivamente nasce em 1978 com uma série de rádio, e isso vem de um autor que passou praticamente a última década se esforçando de toda maneira no que a BBC produzisse - com Monty Python, Doctor Who e o que mais caísse em seu colo, mas, como vemos, com o misto de comedia (surreal) e ficção científica que são os pilares fundamentais para a série.

Mais que isso, Adams permitiu dosar estes elementos, e inclusive testar as águas com as aventuras no rádio para então adaptá-las na forma narrativa de uma série de livros, e, enquanto eu particularmente não gosto do terceiro livro (que deve funcionar melhor na Inglaterra com todo o papo sobre críquete), os quatro primeiros livros são sólidos. O quinto livro da série é horrível, em grande parte porque ele nem parece entender o que a série se transformou, mas, principalmente, porque ele não funciona...

O último livro de Douglas Adams propõe universos paralelos e tramas que pouco ou nada são desenvolvidas (e principalmente, pouco ou nada são relevantes), mas, e talvez isso seja especulação demais da minha parte, fica a impressão que ele estava cansado com a franquia e queria mesmo era dar um ponto final e deixar por isso mesmo - tanto que até seu óbito em 2001 ele não produz mais nada para a série.

No geral, Arthur Dent é, bem, um típico bonachão inglês que mal sabe o mínimo para entender sequer o menor condado da Inglaterra do século XX (que dirá nosso planeta como um todo) e se vê diante de todo tipo de insanidade de um universo caótico que Douglas Adams apresenta a ele, que, obviamente, replica e recria os elementos absurdos (na enésima potência) de nossa vida cotidiana.

A burocracia da prefeitura com toda uma série de subterfúgios para justificar seu pequeno poder para demolir a casa de Arthur é replicada nos Vogons fazendo o mesmo com um planeta inteiro. Um show de rock barulhento é replicado em um evento que é tão barulhento que precisa de um planeta desértico inteiro para ser permitido e por aí vai.

Com o quinto livro, no entanto, Arthur já não serve mais o mesmo propósito (ele se acostumara com toda a sorte de maluquice que o universo jogara nele) e aí Adams parece querer reverter alguns elementos - apagar a namorada do volume anterior, trazer Trillian de volta (e fazê-la mais relevante ao ter uma filha com Arthur) e tudo isso para terminar com uma piada boba que remete ao final ao primeiro livro é o ponto final definitivo para a história (afinal a Terra é destruída DE NOVO, só que dessa vez Arthur, Ford, Trillian e que outro protagonista a série ainda possuia vivo até esse ponto estava no planeta no momento que ele é destruído).

Ponto, fim e nada mais de o Guia do Mochileiro das Galáxias para Douglas Adams, afinal ele criou outras séries e produziu outros trabalhos, então nada mais coerente que perseguir essas ambições, certo?

Bem, em um mundo ideal isso seria o fim da história (ou talvez até o quarto capítulo em que Arthur termina razoavelmente bem com Fenchurch e todo mundo parece seguir com suas vidas, no que seria um epílogo feliz e contente), mas algum editor pensou "Ei, e se a gente fizer mais um livro nessa série...?"

Não sei a história de bastidores disso exatamente - se propuseram para o criador de Artemis Fowl, Eoin Colfer para produzir mais um livro do Guia do Mochileiro das Galáxias ou se ele propôs o livro para seu editor - mas o resultado é que temos um sexto livro para a série e esse é o primeiro não produzido por Douglas Adams, ainda que, evidentemente, existam alguns fragmentos e ideias que o autor deixou para trás em algum diário ou rascunho e que tomaram forma sob esse livro.

Obviamente o livro é ruim, afinal Colfer mesmo em seu momento mais inspirado não chega perto do momento menos inspirado de Adams, e, mesmo que isso não fosse o caso, a série terminou categoricamente com o quinto livro... E isso até pode servir para diminuir o tom de críticas e avaliar como um mero projeto de fã (ou fanfic), mas uma vez que esse fã é um escritor profissional com vários livros no currículo e essa fanfic foi lançada por uma editora profissional (e vendida como um livro como todos os outros), eu não vejo qualquer motivo para avaliar de maneira diferente de qualquer outro livro, e, nesse caso específico até de maneira mais pesada por comparação com alguns de meus livros favoritos de todos os tempos que o antecedem.

Colfer tenta alguma justificativa boba para salvar a trupe de Arthur Dent de último minuto da destruição da Terra (do final do quinto livro) enquanto passa capítulos e mais capítulos tentando justificar uma história para continuar a narrativa. E dá-lhe bobagens sobre deuses de Asgard (e Zaphod atuando como empresário para eles) ou uma colônia de terráqueos que ainda existe e portanto os Vogons precisam destruir e o que é mais bizarro conforme o livro avança, nada disso tem qualquer relação direta ou indireta com os personagens da série.

Arthur não faz absolutamente nada no livro (ainda que isso seja um clichê para o personagem e frequentemente ele sirva para que alguém lhe explique a trama), e ele nem está sozinho nessa. Ford e Random meio que estão nessa porque estão nessa, enquanto Trillian só está no livro para se apaixonar por um personagem minúsculo de um dos livros anteriores que volta aqui (e acaba não só central para a trama como efetivamente o personagem sem o qual o livro todo não aconteceria).

Essa é a história de Zaphod e o sujeito minúsculo de um dos livros anteriores, e, isso poderia funcionar é claro, se fizesse algum sentido ou, bem, só funcionasse. Zaphod parte de lugar em lugar em uma busca por deuses asgardianos enquanto o restante da trupe parte para salvar o que sobrou dos terráqueos dos Vogons (que tem em seus planos a destruição dos humanos que sobraram).

Ok, a história é ruim, os personagens não fazem nada interessante, mas pelo menos as piadas e situações são boas? Bem, não...

Colfer não consegue construir piadas no ritmo da história e precisa constantemente interromper o material para inserir notas onde o material cômico deveria transparecer, e, honestamente, se provocar algo mais que um sorriso amarelo está no lucro. Geralmente essas notas vão travando o desenvolvimento além de não agregar nada minimamente interessante... Nisso os personagens da história parecem secundários, as ações parecem inconsequentes e os fatos irrelevantes (e as piadas forçadas).

Se você é fã de Eoin Colfer, talvez o material seja bom, droga, talvez seja o melhor que ele escreveu em toda a sua vida (o que pra mim, não soaria como um elogio para ler o restante do material), mas, honestamente, se você é fã do Guia do Mochileiro das Galáxias, e, considerando que esse é o sexto livro e o primeiro (e tomara que único) póstumo, não tem como ignorar tudo o que veio antes e que é milhões de vezes melhor.

26 de janeiro de 2025

{A vida após Netflix - 2.6} Uma breve demonstração de boa escrita e escrita ruim

Um diálogo bem escrito diz muito sobre a qualidade do roteiro (e claro, do escritor por trás do mesmo), ao mesmo tempo que nos apresenta melhor o mundo e os personagens nele contidos, e, honestamente seria muito fácil encontrar dezenas e mais dezenas de exemplos para demonstrar exatamente isso.

No entanto, eu acredito que mais que citar exemplos e detalhá-los em diversas mídias, eu posso demonstrá-lo através de um exemplo prático de uma breve troca entre dois personagens em duas séries distintas de quadrinhos, um exemplo negativo (vindo de Daredevil 193 de 1983 escrita por Larry Hama) e um exemplo positivo (da primeira edição da mini-série G.O.D.S. de 2023 escrita por Jonathan Hickman).

Eu não pretendo considerar o restante das respectivas histórias, apenas esse breve diálogo nessas páginas em particular e o que eles dizem e transparecem entre os personagens, e, porque eles funcionam ou não.

Em Demolidor 193, vemos uma no primeiro quadro, mais alongado para demonstrar a mulher em pé de corpo inteiro em relação a Matt que está sentado, temos uma interação entre uma mulher loira com um rosto carrancudo que se aproxima de Matt Murdock e lhe diz "O que você está encarando?", ao que Matt responde "Nada, eu sou cego".

Essa já é uma interação bastante desconfortável entre os personagens, mas logo no quadro seguinte vemos a mulher loira reagindo de maneira exagerada (com o quadro enfocando numa situação dramática em que ela está com o olhar para cima enquanto a boca escancarada diz) "Meu Deeeeeus! Isso é tão embaraçoso! Você deve imaginar que eu sou uma idiota insensível, e você está certo, eu poderia...", no que Matt, conciliador, tenta responder "Não, não, não. Imagine. Na verdade minha resposta foi um tanto ríspida. Eu recentemente me adaptei à minha cegueira que muitas pessoas mal percebem. Amigos?"

O próximo quadro traz os dois continuando a interagir (e agora a se apresentar), mas fica claro que o tom da conversa mudou consideravelmente. Da primeira interação fechada para um seguinte momento de constrangimento, ambos já estão de mãos dadas e conversando de maneira mais aberta.

A loira então se apresenta: "Claro! Meu nome é Willow. De fato Willow, a Fantasmagórica: Mágica Extraordinária! Ato principal do lounge do navio. Que tal ser meu convidado para meu show de hoje?". Matt então responde, deixando claro que ele estava atendo ao que ocorria com a garota e pergunta "Isso não causaria mais problemas com seu namorado?" para a tréplica "Carmine? Eu o conheci hoje. Imaginei que nos entenderíamos por ele ser um magricela alto como eu..." e eu acredito que esse seja especificamente a parte mais rídicula dessa conversa toda.

Willow se apresenta como uma mágica que convida Matt para assistir seu show e ele imagina imediatamente que ela está dando em cima dele ou que isso causaria algum desconforto dela com o namorado (considerando que ela é uma artista que se apresenta em público - e, nesse caso específico, em público em um navio), e tudo isso depois de meras duas interações que denotam claramente que esses dois não começaram em bons termos. Curiosamente, a moça que chega emburrada por um sujeito que a encarava momentos atrás parece ignorar completamente que ele estava de fato prestando atenção na interação dela com o namorado...

O quadro final nos mostra uma visão mais geral (do barco à distância) para concluir as apresentações entre os dois, começando com Willow concluindo seu diálogo do quadro anterior "...Mas ele se demonstrou um verdadeiro estranho! Ei, eu disse o meu nome, qual é o seu?" ao que o protagonista da revista responde "Matt. Matt Murdock, um advogado extraordinário e um ótimo jogador de poker", ao que eu não sei dizer o motivo para o comentário sobre poker (que inclusive eu não me lembro se tem qualquer relevância mais tarde na história) e a moça responde "Ha! Prazer em conhecê-lo, senhor Murdock".

A interação é mal trabalhada de começo ao final, truncada e forçada. Willow que obviamente estava incomodada no começo, não apenas se vê constrangida ao ser corrigida como muda completamente de humor com isso, ao mesmo passo que Matt inicia a interação de maneira grosseira (quando podia facilmente ficar calado e deixar os ânimos se acalmarem) e tudo caminha num ritmo acelerado que claramente aponta que essa personagem será importante mais tarde, não?

Você pode não saber o que vai acontecer a seguir (e honestamente não faz tanta diferença para o experimento aqui demonstrado) mas fica claro por essa interação truncada e forçada, que esse diálogo entre os dois era necessário para mover a história adiante. Matt precisava conhecer Willow (e saber que ela trabalha com mágica além de saber dos problemas dela com seu namorado), ou mais importante, nós leitores precisamos conhecer Willow para que a revelação adiante (de que ela é uma criminosa) tenha algum significado.

Isso obviamente transcorreria bem melhor de outra forma (ou para ser honesto outras dezenas de formas), e principalmente sem essa interação nada natural destes personagens. Esse é um dos grandes problemas da má escrita: A situação não faz sentido contextual.

Focando apenas na interação, Willow que está constrangida com o que disse a um homem cego revela que trabalha com mágica e convida esse homem para o show... Quer dizer, ela espera que ele vá se divertir em um show de mágica sem ver os truques e efeitos? Por outro lado, pouco depois Matt, que a pouco dissera que é cego, se declara um excelente jogador de poker, e, a moça que fizera caras e bocas pelo seu constrangimento não se vê minimamente intrigada com a ideia de um homem cego jogando poker a ponto de perguntar sobre isso? É o ponto desse comentário uma mera piada boba para quebrar o gelo (sabe, ha, ha, um jogador de poker cego)?

Quer dizer, não que seja impossível dele fazer isso (e existam jogadores cegos) eu confesso que isso imediatamente chama atenção. Eu quando li o comentário já parti para pesquisas no google sobre o assunto. Essa garota que estava furiosa e desconfiada, deixa passar como se fosse nada?

Considerando o que aprendemos depois nessa edição - que ela é uma criminosa e, não apenas isso, a criminosa que o Demolidor está procurando naquele momento específico - faz sentido que Willow interaja com pessoas desconhecidas em um barco e não que ao contrário se mantenha o mais discreta possível?

Ao mesmo tempo, da perspectiva de Matt Murdock/Demolidor que na época tinha sua identidade secreta, faz sentido que ele, o advogado da Cozinha do Inferno de Nova Iorque esteja naquele barco sozinho em busca de um criminoso - onde por coincidência o Demolidor da Cozinha do Inferno de Nova Iorque - que está em busca de um criminoso - apareça?

Não seria mais lógico que o Demolidor estivesse nas sombras usando suas técnicas ninjas observando as pistas para capturar o criminoso, ou, ao contrário, fizesse tudo isso como Matt Murdock para preservar sua identidade secreta...?

Isoladamente o diálogo não funciona enquanto no contexto maior do que ele está inserido, é ainda pior.

Por outro lado, em G.O.D.S. 1, Hickman aparesenta um breve diálogo entre Dmitri e Wyn, mas mesmo sem ler ou analisar o conteúdo, é possível entender pela expressão facial, pelo silêncio no terceiro quadro e pela linguagem corporal dos personagens o que está acontecendo e entender o tom da conversa (e mesmo de como os dois se relacionam).

Dmitri comenta casualmente no primeiro quadro "Ei, olhe, ali está a sua ex." no que Wyn responde "Ela não é minha ex".

O segundo quadro trás Dmitri retificando seu primeiro comentário (nos apresentando mais de sua personalidade com sua necessidade por contextualizar seu comentário anterior) "Ei, ali está a mulher que você ama mais que qualquer coisa e que no lugar de corresponder esse amor, decidiu atirar na sua cara", ao que vemos claramente a reação furiosa de Wyn que se alastra para o próximo quadro (em que permanece em silêncio, esperando que Dmitri se toque, e, após o silêncio constrangedor o quarto quadro concluí: "Oh, agora eu vejo. Você sabia disso o tempo todo, e tentava fingir que tudo estava bem quando na verdade definitivamente não está. Desculpe"

Essa breve interação nos diz volumes sobre os personagens. Sobre o quanto eles já se conhecem (e de que apesar de se conhecerem, não são exatamente amigos, mais para conhecidos e mais especificamente, fica claro que Wyn é alguém hierarquicamente acima de Dmitri, como um professor/mentor, e alguém que ele quer impressionar).

Conciso, direto e ainda assim diz volumes sobre os personagens.

E eu sei que pode parecer uma interação forçosa para gerar o 'humor MCU', demonstrando os personagens fazendo piadas em situações tensas, mas a diferença aqui é que isso mostra a personalidade de ambos os atores na situação e nos apresenta aspectos maiores sobre o todo - elementos que voltam a representar algo no esquema final das coisas, conforme a ingenuidade de Dmitri tem papel crucial para a solução da trama ou o cansaço e frustração de Wyn, por exemplo).

As duas situações aqui apresentadas trazem um dos personagens metendo os pés pelas mãos com uma interação inicial constrangedora, mas a diferença no roteiro faz com que as duas sigam por rumos bastante diferentes e terminem de forma oposta, em uma em que aprendemos mais sobre os personagens enquanto na outra parece contradizer tudo o que faria sentido para eles nesta mesma situação.

 

Mas, o que tudo isso significa afinal de contas?

No entanto existe um elemento que não é diretamente relacionado ao produto final, e, por tabela, com o que está aqui apresentado, mas que diretamente influencia o resultado - e isso se aplica em outras escalas com outros produtos de entretenimento na mesma proporção.

Eu poderia falar por horas sobre talento e competência ou sobre como um roteiro preguiçoso pode usar um chavão ou bordão (mas aí eu não precisaria de um texto desse tamanho, só dizer 'Bazinga' e todo o público já entenderia o argumento de falta de talento e roteiro preguiçocos usando um chavão-bordão), mas esse não é o ponto.

Daredevil 193 é uma edição tampão marcando a transição entre a fase de enorme sucesso de Frank Miller (que terminara na edição 191, ou seja, meses antes) e com toda a certeza é um material produzido a toque de caixa para que tenha uma edição da série nas bancas e livrarias especializadas dentro dos prazos e tudo mais, e, para isso os editores e executivos encontram o sujeito mais barato e que produza o material mais rápido para entregar, bem, alguma coisa dentro do prazo.

Essa é uma situação bem diferente do que Jonathan Hickman com seu contrato de exclusividade com a Marvel pode produzir e, bem, lançando uma mini-série escolhendo a dedo os colaboradores que vão trabalhar com ele.

Mas você consegue entender porque esse elemento de entregar o produto mais rápido possível pelo menor custo (para cumprir algum prazo ou quadrante fiscal) impacta o resultado final, e, bem, como isso é facilmente verificável de novo e de novo (como quando produziram uma sequência para Cassino Royale a toque de caixa durante a greve dos roteiristas de Hollywood). Ou porque os roteiristas enxergam com enorme termor a ascensão das inteligências artificiais generativas, certo?

Isso piora quando executivos visam apenas potencializar lucros com esse tipo de material tampão (que serve apenas para ganhar tempo e não para produzir a melhor história possível - sabe, como a segunda temporada de A Casa do Dragão).

Mais dinheiro para efeitos especiais, menos dinheiro para os roteiros (direção, atores e demais elementos) e a coisa toda fica uma bagunça desconjuntada, não é mesmo? E às vezes nem tem dinheiro para efeitos especiais como Cats ou Quantumania nos demonstram...

23 de janeiro de 2025

{Resenhas de Castores} Centenas de Quintas.

Se existe algum filme que eu possa recomendar mais que Centenas de Castores (Hundreds of Beavers), eu honestamente não assisti ainda.

A comédia que é uma versão com atores (inclusive nos papéis de animais) de Looney Tunes em preto e branco com o mínimo de diálogo possível, um roteiro extremamente simplista e incrivelmente divertido. Fora o fato de que o filme não é fácil de achar, mesmo na era da internet e com tantos serviços de streaming (e infelizmente só se junta a uma quantidade enorme de ótimos filmes que são extremamente difíceis de se achar).

Não quero estragar a história e contar muitos dos detalhes (até porque não é exatamente algo amplamente complexo, ainda que tenha umas boas surpresas e reviravolas) mas posso dizer que é um dos melhores filmes que eu assisti dos últimos anos, e, com toda a certeza eu não consigo pensar em uma única comédia melhor.

Passa fácil dos testes de cinco risadas de Mark Kermode para definir se uma comédia é boa (eu acho que gargalhei forte bem mais que cinco vezes e tiveram algumas risadas menores em vários outros momentos), e mais até, tem um roteiro bem costurado além da comédia e da construção de cenas cômicas.

Ele funciona bem na narrativa que conta, na construção de personagens e principalmente nos rumos idiotas e bizarros que toma  (como uma dupla de castores investigando os crimes na floresta ou mais para o final quando o filme revela o propósito da ação do grupo de castores - inclusive relembrando momentos chaves que explicam o que vimos mais cedo durante o filme).

Não sei o que mais dizer além de recomendar efusivamente.

Vale muito a pena conferir centenas de vezes.

20 de janeiro de 2025

{Resenhas, do latim resignare que por sua vez é formado pelo prefixo "re" de novo, de quinta} Monster

Eu queria gostar de Monster, e, com a premissa e os primeiros cinco ou pouco mais episódios eu realmente estava gostando. Mesmo que o ritmo seja lento (os cinco ou seis episódios facilmente funcionariam em um único - ou talvez dois episódios), o começo funciona muito bem ao apresentar um dilema  bastante claro, com o personagem do cirurgião médico que acaba tendo de escolher seus pacientes, e, nessas escolhas pode ser a diferença entre a vida e a morte, o que acaba elevado a enésima potência quando um destas escolhas acaba levando a ramificações desastrosas (spoilers talvez mas, ele descobre que uma das pessoas que ele salvou era um psicopata e assassino serial - e, o médico acaba como suspeito de seus crimes).

Esse dilema é fascinante e eu genuinamente queria ver a história desenvolver organicamente, ou, mais importante, de maneira focada e coesa neste personagem (ou personagens, afinal não é apenas o médico que é interessante nesse conflito) e neste conflito, mas como você já deve ter imaginado, não é o que acontece. O que se segue é um elenco cada vez mais crescente de personagens e dilemas quaternários (eu acho que até a Suzana Vieira aparece como dona de casa rica em algum dos núcleos em certo ponto de tanto personagem que aparece) e que, o que é o pior, vão diminuindo o impacto do dilema central e relevante ao apresentar uma enorme conspiração que tem motivações políticas (não me pergunte) e elementos narrativos que, francamente não são interessantes ou agregam coisa alguma para a história (me desculpe se eu pareço uma pessoa ruim por não me importar com a ex do doutor Tenma que se torna uma alcólatra ou o seu segurança).

Aqui reside o grande dilema narrativo e a escolha que o autor precisa fazer, de escolher em manter um escopo pequeno e contar uma grande história com tensão, impacto e coerência ou partir para um escopo maior e lidar com problemas que mesmo um autor bem mais calejado teria dificuldade de lidar (em virtude de toda a complexidade do tema e a dificuldade não só de solucioná-lo como de explorá-lo de maneira coerente). Com isso derivam outros problemas de escolhas (partir para um estilo mais simples que permita crescer e estabelecer conexões através de paralelos com o mundo real ou para uma estrutura mais realista para permitir uma reflexão mais séria e profunda da natureza humana) que vão marcando o tom, premissa e toda a composição do material.

Como eu mencionei antes, uma das escolhas de Tenma se dá entre salvar um político importante e alguém que se tornaria um psicopata, e, ao deixar o político isso causa alguns revezes em sua carreira. No entanto, esses revezes são facilmente suplantados, e, logo o doutor está em uma condição ainda melhor do que antes, o que nos leva a um salto de nove anos para a história (após, e isso é importante, o chefe e outro médico importante do hospital morrerem de maneira suspeita, e esse fato ser o motivo para Tenma acabar promovido).

Se a história começasse nesse ponto em que Tenma faz uma escolha difícil e acaba, não só prejudicando sua carreira como salvando um assassino, e, para coroar sendo visto como suspeito de outros crimes, a coisa toda funcionaria de maneira mais orgânica para conduzir o restante dos elementos... Ainda que o restante dos elementos sejam toda uma miríade de conspirações que vão do bizarro, absurdo e simplesmente ridículo (que fazem Qanon parecer lógico).

Droga, a conspiração toda vai degringolando e tomando tanto espaço da série que acaba fazendo com que todo o mote inicial seja apenas acidental e inconsequente. Na verdade todos os personagens iniciais são acidentais e inconsequentes porque já havia toda uma gigantesca teia de conspiração ocorrendo e mais dia menos dia os eventos da série degringolariam do mesmo jeito (tivesse doutor Tenma ou não, se salvassem ou não o psicopata e a lista segue de novo e de novo), e por algum motivo que eu não sei se eu perdi algum episódio, se eu dormi ou se simplesmente o negócio é mal escrito (e eu pendo para esse lado mesmo que os dois outros possam ter acontecido concomitantemente), o plano secreto da organização sombria que está puxando todas as cordinhas dos eventos da série envolve derrubar o governo (claro, sempre tem isso) e... São os nazistas, tá, você já deveria ter deduzido nesse ponto.

Claro que tem o teto de vidro de uma história japonesa criticando a Alemanha pelos nazistas, mas, ei vamos fingir que é muito diferente quando os norte-americanos querem se mostrar moralmente superiores? Eu prefiro ignorar o comentário político da série ainda que seja uma série de escolhas ruins que francamente não agregam muito no que o projeto deveria fazer.

A série se passa na Alemanha, tem um psicopata chamado Franz BONAPARTA (meus ovos) e outro chamado Adolf Heinhart (sim, sutil) e, olha, se eu tivesse lido ou assistido a esse material quando eu tinha 15 anos, talvez eu acharia legal pra caramba (droga, talvez eu acharia O Corvo do irmão menos talentoso do Alexander Skarsgard muito legal também na minha adolescência - o que não sirva muito bem como parâmetro pelos meus excelentes gostos na época - ou pelo que valhe, mesmo hoje em dia), mas hoje eu só posso dizer que funcionaria bem melhor como uma série menor, mais focada e com beeeeeeeeeem menos personagens (como os dois sutis pra caramba citados nesse mesmo parágrafo).

Uns 20-25 episódios (que equivalem à primeira temporada da Liga da Justiça de 2001) ao invés dos 75, com uma narrativa mais limitada para o escopo que eu comentei no começo (o médico que salva um psicopata e acaba como suspeito dos crimes dele), talvez expandindo a narrativa para continuar numa estrutura maior em novas temporadas (como Full Metal Alchemist ou Avatar fazem), eu acredito que funcionaria muito bem, obrigado. Do jeito que é, bem é um teste de resistência mais que qualquer coisa, e eu me cansei muito no começo ao ponto que chegar à linha final foi muito mais desafiador e cansativo do que deveria.

E possivelmente até por isso eu acredito que tive maior resistência e mesmo não consegui ver alguns dos argumentos da série como foram apresentados (ou se foram).

Dito tudo isso, o final é incrivelmente estúpido. Quer dizer, é bem claro que o autor quer demonstrar algo que ele acha incrivelmente inteligente e brilhantemente orquestrado (e que faz sentido no contexto da história), mas é muito estúpido no contexto tanto da ideia quanto da execução.

Reforçando o que eu já disse aqui, a coisa toda degringola conforme a série tenta contextualizar o mal (ou mesmo maldade humana como um todo) além de uma pessoa para algo mais complexo, e, político. As tentativas de comentários políticos da série são, pra dizer o mínimo, o tipo de coisa que um aluno da quinta-série montaria sobre o assunto e que não se dá ao trabalho de enxergar uma contextualização mais complexa e interessante (de novo, o teto de vidro de um artista japonês criticando política alemã).

E a coisa toda é leviana e parva com tentativas de contextualizar o mal como algo que depende de experimentos científicos e atividades políticas e quaisquer outras argumentações e justificativas que a série tenta vender aqui e acolá, enquanto ignorando pura e simplesmente a sociopatia e psicopatia. E eu nem preciso demonstrar através de exemplos de vilões complexos de quadrinhos de super heróis ou de filmes detetivescos... Eu posso falar somente do vilão unidimensional Cérebro do desenho dos Animaniacs (e de Pinky e o Cérebro e Pinky, Felícia e o Cérebro e do reboot dos Animaniacs) com sua obsessão de conquistar o mundo.

Às vezes algo é simplesmente o que é e não é necessário mais explicação e contextualização.

Um psciopata não precisa passar por um evento traumático formado por um experimento de um cientista comunista para se tornar um assassino em série... Ele pode simplesmente gostar de matar pessoas (e o dilema do médico de salvá-lo acaba mais interessante por isso que toda uma rede de conspirações que são completamente alheias a esse fato).

E no final, Tenma confronta o assassino serial, e mesmo depois de toda a morte e crime cometido pelo segundo, ele não apenas se recusa a puxar o gatilho para atirar contra o criminoso (que estava ameaçando uma criança), como depois ainda se esforça para salvar a vida deste criminoso! Mas isso não é o final ainda pois, obviamente, Tenma precisa confrontar este psicopata uma vez mais enquanto ele está convalido para contextualizar mais suas ações e o motivo de suas ações.

E claro, fugir do leito do hospital.

Sinceramente, mesmo que eu estivesse gostando do material depois de toda a bobageira conspiratória, o final teria acabado completamente com qualquer traço de boa vontade remanescente.