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16 de janeiro de 2025

{Resenhas de Quinta} Moonshadow

Eu decidi que em 2025 eu não farei posts sobre quadrinhos de super-heróis (ou filmes, ou seriados - com a única exceção de Superman e da segunda temporada de Pacificador, e olhe lá), então voltei minha atenção para outros materiais que geralmente escapam minha atenção, e eu geralmente pouco (ou nada) falo sobre.

Em breve quero falar sobre Asterix e outros quadrinhos europeus, quero falar mais sobre mangás e voltar a falar sobre filmes e séries que saiam um pouco do horizonte desse mundo que eu não construi.

Dito isso, Moonshadow é uma hq de J M Dematteis com arte de Jon J Muth publicada entre 1985 e 1987 e eu passei muito tempo tentando ler esse quadrinho, sem muito sucesso. Ou o preço era proibitivo da versão da Globo ou o preço era proibitivo nos sebos, sites de quadrinhos e onde quer fosse ou na republicação da Pipoca e Nanquim ou eu simplesmente não achava alguma versão em inglês com uma oferta que justificasse a compra e, por uns bons quinze ou vinte anos eu tentei ler um quadrinho que eu não conseguia encontrar ou comprar.

Eu não sei direito como, mas lembro que na época da faculdade eu consegui ler o capítulo final (entitulado "Adeus, Moonshadow", e que é um epílogo da série e, na verdade, nem é parte da série como eu descobri agora terminado o material), e fiquei embasbacado com a qualidade, e passei os anos seguintes tentando ler mais e efetivamente ler o material todo.

Foi minha Moby Dick, por assim dizer, e eu meio que fui esquecendo da existência do material até que encontrei numa boa oferta para o kindle e, bem, a espera não fez nenhum favor ao material.

Talvez se eu tivesse lido nos meus vinte anos recém saído da faculdade e após chorar copiosamente com o final de Sandman, esse material teria funcionado de outra forma pra mim, e eu realmente acredito que bateria diferente em outro momento da minha vida.

Mas lendo hoje, bem, o material é verborrágico, alguns elementos se perdem pela falta de estrutura clara e mesmo erros na escolha dessa estrutura (por exemplo a morte de uma personagem importante já no segundo capítulo sem que ela tenha tempo para se desenvolver - e essa morte tenha algum impacto real para o leitor). Mesmo a arte de Jon J Muth que é excelente no geral tem seus pontos inconstantes e flutuantes em que parece mirar para qualquer lado e ver o que acaba colando (até porque parte da estrutura narrativa é de que os personagens pululam entre mundos alienígenas - que bem claramente são alucinações da mente de Moonshadow recordando sua juventude).

E eu acredito que em grande parte é na escrita onde reside o problema da série, e não apenas na verborragia, ainda que este seja um grande problema. Fica bem claro que é um quadrinho que quer mostrar que é um 'quadrinho para adultos' e em que Dematteis tenta ser ousado (seja na violência, palavreado ou sexo) mas que soa extremamente vazio e desprovido de qualquer significado, e, que eu facilmente posso citar em exemplos de quadrinhos (ou outras mídias) produzindo um material adulto que não recorreu ou recorre desse tipo de conteúdo para se destacar. O material não precisa de palavrões, violência ou sexo para ser adulto, e, ao contrário da forma como é feito fica bastante pueril.

Na verdade só preciso citar a obra de Bill Willingham (que traz de fato um conto de fadas para adultos - e lida com sexo, violência e palavrões) mas consegue conduzir o material de maneira mais inteligente e estruturada, em partes por eliminar a verborragia, mas principalmente por saber dosar quando e como usar estes elementos. Lendo o primeiro arco de Fábulas, por exemplo, existe muito pouca violência (quase nenhuma), e além de algumas insinuações de sexo, o material é bastante inofensivo.

No entanto, com um único diálogo entre Pinóquio comentando que quer reclamar com a Fada Azul por ser uma criança por vastos anos e que ele quer envelhecer para finalmente poder fazer sexo, Fábulas consegue fazer muito mais que Moonshadow com todos os peitinhos, insinuações e tentativas de parecer adulto.

Ainda no que tange a narrativa, honestamente eu seria remisso se ignorasse o que pra mim é o pior personagem não apenas deste material mas um forte candidato para pior personagem de toda a ficção (sim, pior que Jar Jar Binks, Scrappy Doo, o Grande Gazoo e Joffrey Baratheon), na forma do melhor amigo, figura paterna e cruzamento do primo Coisa dos Addams e Chewbacca de Star Wars, ninguém menos que o Chewbabaca Ira.

O personagem já apresentado de maneira extremamente escrota como um sujeito obcecado com pornografia (que se torna amigo de um adolescente quando ele oferece pornografia nova para ele), e durante toda a série não demonstra qualquer característica redimível. Ele é covarde, trapaceiro e em mais de uma ocasião trai a confiança do protagonista, Moonshadow. Não bastasse isso, quando você finalmente se vê contente porque esse personagem detestável desaparece da série e o protagonista Moonshadow tem mais tempo para introspecção e desenvolvimento (inclusive finalmente encontrando porto seguro com um grupo que o recebe como parte da família em um paraíso idílico), o personagem abandona tudo para partir em busca de Ira para o personagem voltar com seus maneirismos e personalidade escrotos.

Sinceramente a história se beneficiaria imensamente com a subtração deste personagem que não agrega nada, e eu confesso que não entendo qual o apelo ou a ideia por trás do mesmo. Ele não funciona como alívio cômico, ele não funciona para desenvolver a história e ele não é interessante.

Tudo bem que no geral os personagens não são muito interessantes - e em grande parte o protagonista é um personagem passivo que tromba de uma história à outra sem agir ou tomar qualquer decisão que mude os rumos da narrativa (no máximo com algo que o leva a trombar de um episódio para o próximo), mas Ira consegue somar uma personalidade escrota e detestável que clama constantemente por atenção quando ele está na página - o que é diferente dos outros personagens que ou não são interessantes ou simplesente blasé.

Vamos deixar isso bem claro: A arte é espetacular e mesmo com os problemas da narrativa, o material é bem mais agradável que muita coisa que eu li (ou assisti) nos últimos 10 a 20 anos. Não é muito acima da média, mas um sólido 6,5 que chega a um 7,5 pela arte espetacular (e o final/epílogo que são muito melhores que todo o restante da série - o epílogo em si é um sólido 11/10).

Francamente é uma recomendação apenas se estiver em (boa) promoção e ciente de todas as ressalvas.

12 de janeiro de 2025

{Mentira não é liberdade de expressão} Não, Sonic 3 não foi excluído do Oscar por não incluir minorias

Menos de uma semana após o anúncio de que o Facebook eliminaria a moderação em suas plataformas (algo já feito por Elon Musk em seu Twitter), vemos uma história nojenta como a do Brasil Paralelo e amplamente difundida, inclusive pelo Estadão e vários canais do youtube de nerdolas otários de que Sonic 3 não estaria na listagem para o Oscar por não incluir minorias e mais uma outra grande dose de teorias conspiratórias depois de um evento em 2016 ou alguma bobagem do tipo.

A verdade, obviamente, é bem mais simples, obviamente. Para um filme ser considerado para o Oscar, ele precisaria ser exibido por pelo menos 7 dias consecutivos em cinemas em uma das seis maiores áreas metropolitanas dos EUA durante o ano anterior (2024), e ter pelo menos uma hora e quarenta minutos (para as categorias longa-metragem). Sonic foi lançado em 26 de dezembro (com algumas pré-estreias que anteciparam o filme justamente pelo feriado do Natal), o que significa que para conseguir 7 dias consecutivos, dezembro teria que terminar no dia 32 (pelo menos).

Então porque o Brasil Paralelo lançou essa balela obviamente ridícula? Bem, em partes porque é o que eles já fazem mesmo, e é impressionante que não tentam nem ser um relógio quebrado para pelo menos acertar de vez em quando, mas o objetivo é sempre causar indignação seletiva e direcionar o ódio a algum grupo específico (as instituições de ensino com o terraplanismo, a indústria do entretenimento com argumentos de políticas inclusivas e por aí vai).

Curiosamente, porque é bem óbvio que quem lê esse tipo de mentira só vai espumar as conspirações e não vai sequer tentar raciocinar minimamente, é muito fácil apontar o quanto o argumento é ridículo. Considerando que Sonic não fosse excluído automaticamente da lista do Oscar por uma 'tecnicalidade', lembremos que só em 2024 foram lançados 569 filmes (número que caiu significativamente com a pandemia, quando em 2019 eram 792 filmes), ou seja, mais de 10 filmes por semana do ano.

Obviamente, esse número de filmes tem de diminuir drasticamente para que os jurados possam apurar de acordo com os critérios subjetivos do que consideram melhor, e, dessa feita quantos mais filmes sejam eliminados previamente (por tecnicalidades ou não), melhor para os juízes.

Mesmo assim, uma série de filmes são meio que ignorados automaticamente. Com mais de vinte filmes, a franquia de James Bond historicamente só foi indicada a prêmios como melhor canção (que no caso dos grandes compositores para a franquia, quase nada tem a ver com a direção, os atores ou os filmes em si), melhores efeitos especiais, melhores mixagem e edição de som, com apenas uma única indicação por melhor CINEMATOGRAFIA. Mais de vinte filmes de uma das franquias mais reconhecidas do mundo, com um elenco extraordinário e alguns diretores que viriam a ganhar premiações pro outros filmes, e Bond não teve um único filme indicado com melhor filme, melhor ator, atriz ou ator coadjuvante. (Diga-se de passagem, outros prêmios pelo menos indicaram melhores coadjuvantes dos filmes da franquia).

Não é muito diferente com Jurassic Park, os filmes do MCU ou droga, gêneros todos como horror ou comédia! E com filmes para o público infantil (onde Sonic se enquadra) só se estivermos falando da categoria específica para animação ou algum prêmio técnico de efeitos especiais, mixagem de som ou o que for. Roger Rabbit apresentou toda uma revolução para a indústria da animação e, bem, reforçando o que foi dito até agora, nada além de prêmios técnicos (no ano de Uma Secretária de Futuro e O Turista Acidental - filmes que eu tenho certeza que você se lembra).

Então porque seria diferente com o terceiro filme de uma franquia que mal é um sucesso no Kid's choice awards nos primeiros dois filmes?

Mas e as animações alguém pode perguntar? Porque não seria indicado como melhor animação?

Bem, as regras aqui são um pouco diferentes com a condição de pelo menos 75% do filme tem que ser animação (o que já exclui os filmes da franquia - assim como os Transformers e outros similares) e um número significativo dos persoangens principais tem de ser animados (de novo, temos James Marsden, Jim Carrey e toda uma quantidade significativa de personagens humanos interagindo com Sonic e companhia).

É tão absurdo sequer considerar esse tipo de narrativa que é assustador ver isso funcionar. Mas aí que tá, o meu sobrinho de nove anos (que foi quem me contou que ouviu essa história) não tem o menor motivo para entender como funciona o Oscar, e, para ele soa perfeitamente aceitável o argumento, já o colocando na rota terrível de odiar minorias por excluir seu filme favorito de uma indicação (QUE ELE JAMAIS RECEBERIA DE QUALQUER JEITO!)

Mas porque disseminar essa mentira específica?

Bem, olhando os resultados do Globo de Ouro que são um forte indicativo para os rumos da temporada de premiação do ano e onde vemos um forte favorito ao Oscar num filme cuja história é de um sujeito violento que faz transição de sexo e se torna uma pessoa melhor (inclusive advogando contra a violência), um outro sobre um sobrevivente do Holocausto se deparando com a ganância e corrupção nos Estados Unidos mas mais importante, o Brasil ganha destaque com um filme que retrata os horrores da ditadura militar (com fortes chances não apenas de indicações como de vitória para Fernanda Torres e até para o filme na categoria de Melhor Filme Estrangeiro), esses caras precisam imediatamente criar um factóide para justificar que existe toda uma cabala conspiratória em Hollywood para desligitimizar as conquistas.

Porque eles precisam usar a mentira como uma ferramenta.

Isso acompanha todo um precedente que tenta desviar o foco do problema enquanto permite aos verdadeiros culpados capitalizarem em cima disso.

E eu nem precisaria de muito mais para falar de Mark Zuckerberg (que anunciou no começo da semana que vai demandar da checagem de fatos), quando seu facebook está sob investigação do congresso americano desde pelo menos 2021, além do caso da Cambridge Analytica (de 2014), o site vem perdendo usuários há um bom tempo e honestamente virou um paraíso para golpes e fraudes há um bom tempo, e não é citado como referência para nada além de alguma piada de mal gosto.

Claro que ele tentaria surfar na onda dos tech-bros para seguir nas boas graças do governo republicano (talvez diminuindo o impacto de investigações, talvez permitindo maior restrição aos principais competidores globais (como o Tik Tok).

Esse (infelizmente) é só a primeira instância desta nova coluna periódica abordando o uso da mentira como ferramenta para disseminar ódio e desinformação, e, espero cobrir uma variedade de assuntos, ainda que a cultura popular seja o foco sempre que possível (já estou trabalhando no próximo rebatendo os argumentos de um "fã" de Star Wars).

22 de dezembro de 2024

{A vida após Netflix - parte 2} Hannibal vs Hannibal (filme vs série)

Com três temporadas entre 2013 e 2015 Hannibal foi lançada com a ideia de adaptar os livros de Thomas Harris, mas, a verdade é que os nomes na série (inclusive do próprio autor) não são desconhecidos.

Antes de Mads Mikkelsen, Hannibal já foi vivido por Anthony Hopkins em 1991 (e 2001 e 2002) e mesmo Brian Cox (sim, Logan Roy) no filme de 1986 de Michael Mann Caçador de Assassinos, e, ainda que algumas das histórias compartilhem elementos das histórias dos livros, existem diferenças consideráveis entre as adaptações.

Os filmes tentam manter o foco para que a narrativa conte em um intervalo de pouco mais de 2 horas todos os elementos da história (qual é a ameaça, porque o protagonista está envolvido na investigação e como pode resolver o caso em questão), enquanto a série cadencia estes elementos para que sejam apresentados aos poucos (como qual é a ameaça, que vai se desenvolvendo aos poucos, enquanto oferece dúvida e questionamento ao protagonista sobre sua própria motivação).

Por exemplo, na série não existe um único vilão como no(s) filme(s). Will Graham e essencialmente sua divisão do FBI passa episódio após episódio caçando um psicopata diferente, enquanto aprende mais e mais sobre a mente dos assassinos em série, ao passo em que aprende mais sobre as motivações sinistras de seu psiquiatra Hannibal Lecter.

Mesmo em temporadas subsequentes em que exista um vilão maior (seja o Dragão Vermelho ou o próprio Hannibal), isso faz parte da estrutura narrativa para desenvolver esse conflito de maneira cadenciada episódio após episódio, e, para isso precisa de uma estrutura narrativa para que cada episódio construa de maneira sólida os degraus para ascender até a conclusão, ainda que funcione individualmente.

Funciona porque tem um excelente roteiro, uma direção brilhante e um elenco extraordinário - afinal, se você tenta a mesma coisa sem nada disso, você acaba com 'Clarice' - e, de maneira geral é o mesmo que acontece com os filmes (com um excelente roteiro, uma direção brilhante e um elenco extraordinário O Silêncio dos Inocentes é fantástico enquanto O Caçador de Assassinos mal passe pelo radar de qualquer pessoa).

Mas é uma visão bastante simplista de que as coisas só funcionam quando tudo é brilhante, excelente e fantástico, com um time incrível trabalhando para produzir e construir o produto final, e, considerando que a série mal chegou ao final na terceira temporada (enquanto coisas vastamente inferiores passaram da décima temporada - e com muito mais episódios por temporada), é fácil dizer que ela não foi um sucesso - nem mesmo de crítica, com uma lista bem modesta de prêmios ou indicações - enquanto tanto Anthony Hopkins quanto Jodie Forster levaram indicações por suas performances no filme de 1991, né?

Então, o material ser excelente mas não encontrar o público faz dele um fracasso ou, bem, qual seria a definição para ele? É um problema de marketing, de timing ou, pura e simplesmente azar?

Para um estúdio - que no fim do dia é quem toma as decisões e assina os cheques - compensa bem mais uma produção medíocre com muita audiência que uma grande produção que não consegue nem público nem crítica.

No fim do dia, no entanto, a questão primordial é sobre o público, ou se você quiser ser mais literal, o público esperado para o material. Veja, o cinema sempre foi extremamente conservador, por mais que algumas raras exceções de brilhantismo e genialidade surjam aqui e acolá.

É sempre custoso produzir um filme e justamente por isso adaptações de materiais que já funcionaram em outros meios são uma forma de mitigar o risco de apresentar uma ideia que aliene o público, e, além disso os filmes tendem a seguir estruturas mais familiares e que já funcionaram antes. Fórmulas de sucesso, repetindo não só o que funcionou ou funciona mas mudando pouco (ou muito pouco) para que o público sinta que é uma experiência nova e diferente (como podemos facilmente ver com todos os filmes policiais de duplas inusitadas... Ei, mas esse tem Whoppi Goldberg e um T-Rex!)

Com a televisão as coisas são diferentes - com sets, estrelas e orçamentos menores - e até não muito tempo atrás também com um formato diferente de filmagem, e, equipamento mais pobre também para produzir em quantidade maior e mais rápido. Dito tudo isso, a tv permite maior liberdade que as demandas e exigências de um mercado por retornos, e, boas equipes podem usar isso a seu favor.

De novo, não significa que não existam projetos ousados e com maior liberdade no cinema, mas enquanto vemos o Patolino enfrentando seu criador em um desenho animado para crianças, bem, é muito fácil encontrar filmes para o público adulto (e não filmes adultos, deixemos isso claro) que tem dificuldade em contemplar qualquer assunto com qualquer nuance ou complexidade (como a Paixão de Cristo de Mel Gibson). E nem é difícil encontrar exemplos e mais exemplos (desde a menção a Jorge Luis Borges na animação da Liga da Justiça como Floyd, o barbeiro - que é um título de uma música bem sombria do Nirvana - cortar o cabelo de Freakazoid), enquanto, bem, seriados para um público mais velho trazem cenas infames como a do cachorro comendo um coração (eu não estou inventando isso), mesmo material para um público adulto tem problemas com dilemas morais e complexidade (sabe, como Dexter).

Então, o que Hannibal Lecter dos filmes e Hannibal Lecter das séries nos ensinam e mudam um para o outro? Bem, de forma narrativa, não muita coisa, afinal são essencialmente o mesmo personagem com histórias desenvolvidas de maneiras diferentes, mas o que vemos mudar realmente é o público esperado para essas obras.

Em O Silêncio dos Inocentes ou Dragão Vermelho os detetives protagonistas são chavões de filmes policiais (determinados, firmes e com claras convicções do certo e errado), sem uma personalidade ou um passado marcantes. Sabemos quem é Will Graham por ser Edward Norton no filme, mas não temos nenhum relance sobre a pessoa por trás dos chavões. No seriado Will Graham é um personagem completamente desenvolvido, com suas fixações, neuras e traumas que são dissecados nos episódios nas sessões de terapia que vão se apresentando episódio após episódio. 

O mesmo vale para o assassino serial canibal Hannibal Lecter.

No seriado contemplamos mais de perto como funciona sua mente, aprendemos mais sobre seu passado, traumas e compulsões. Ele não é apenas um clichê de assassino serial (tão competente que deve ter super-poderes), mas um homem altamente inteligente e complexado, e, é claro que a série tem bem mais tempo para trabalhar todos esses elementos (e muitos mais) que um filme, e, que o filme justamente por isso acaba trabalhando com definições mais amplas (e clichês) que são facilmente identificáveis ao público sem maior desenvolvimento para não interromper ou complicar demais a narrativa.

Essencialmente, um filme (por mais que use de 3 horas e meia ou mais), precisa limitar o desenvolvimento de personagens e traços de suas características mais intrínsecas uma vez que precisa lidar com constrições de tempo (3 horas são o equivalente de 3 a 6 episódios da maioria das séries), e por isso precisa sacrificar estes elementos, com caracterizações mais clichê e lugar-comum em detrimento da história. Com a estrutura episódica, os capítulos permitem maior fôlego nesse desenvolvimento com o intervalo entre episódios (mesmo que você os assista em sequência, é bastante comum que exista um intervalo narrativo, com os episódios se passando em dias diferentes o que reforça traços, características e as personalidades dos personagens).

Os mesmos personagens nos são apresentados de maneiras diferentes dessa forma. Num filme é uma realização impressionante enquanto num seriado é uma estrutura da rotina deste personagem que tem estes momentos marcacntes esporádicos.

E como você pode imaginar, o problema nessa situação de um mundo de streaming onde todos os episódios são disponibilizados imediatamente a maratona se tornou algo bem diferente do que originalmente, acabamos com séries que são produzidos muito mais como filmes longos divididos em partes que como efetivamente séries (episódicas com espaço para desenvolvimento de personagens) para uma estrutura com personagens mais clichês em detrimento de uma narrativa maior (como com Stranger Things ou mesmo Round 6), mas isso é antecipar um bocado coisas que serão discutidas em bem mais detalhe num futuro.

Até lá um bom Natal e um ótimo ano, que esse é o último post de 2024 (e devo voltar somente por volta do dia 15 no ano que começará)!

Um abraço a todos!

19 de dezembro de 2024

{X de Quinta} A Queda da Casa das Resenhas

A Queda da Casa de X (A ascenção dos poderes de X) é talvez a única série completa da Marvel que eu li em todo 2024. E para explicar um pouco mais sobre isso, nós precisamos voltar para 2019 quando Jonathan Hickman lançou duas mini-séries (A Casa de X e Os Poderes de X) para capitanear a franquia pelos dois anos seguintes com a premissa de que finalmente os mutantes se uniram e reuniram sob uma única bandeira em um estado nação na ilha (sentiente) de Krakoa. Existe bem mais contexto que isso - pois tudo isso toma forma com a personagem Moira MacTaggert que tem o poder mutante de ressuscitar com as memórias de sua última vida e usa isso para influenciar Xavier a moldar um mundo melhor para os mutantes, e, mesmo isso é uma simplificação que omite uma série de outros fatores, mas vamos tentar deixar tudo em um único parágrafo.

Obviamente a ascenção dos mutantes causa desconforto à humanidade, e, enquanto nações denotam sua hostilidade claramente com as intenções de Krakoa, são grupos como Orchis e a Hordecultura que vão forjando o caminho da resistência humana (e pós-humana) contra os mutantes, se aproveitando da tensão já existente. Não obstante, na nação dos mutantes, para manter um governo funcional são necessários concessões e maior espaço a vilões (como Apocalipse, Mística e o Sr Sinistro), gerando espaço para vários segredos e intrigas. Dito isso, não são estes os maiores obstáculos ou vilões mais terríveis da fase.

Longe disso. Os piores inimigos dos X-men a partir de 2019 são os péssimos roteiros e autores (como Tini Howard, Bryan Hill, Benjamin Percy e muuuuitos outros que eu provavelmente ficaria um post inteiro só comentando toda a bobagem), e talvez a própria Marvel que não sabia exatamente que rumo tomar com a coisa toda e foi lançando título após título, evento após evento. Nos dois anos de Jonathan Hickman, a série começa com as duas mini-séries citadas no começo do texto - Casa e Poderes de X -, passa por um evento de vários títulos  de toda a editora chamado Impéryo, que já termina em outro chamado X de Espadas - que é um mega-crossover de todos os títulos X -  e o Hellfire Gala (que é verdade um evento menor mas que acaba relevante nos anos seguintes), eclodindo em uma última mini-série chamada Inferno e que encerra a fase de Hickman mas não a fase de Krakoa.

Após a saída de Hickman, no entanto, vemos os mutantes assumindo papéis mais relevantes do contexto geral da Marvel, com a Vampira se jutando aos Vingadores ao passo que os X-men precisam se aliar a esses Vingadores (e os Eternos) para deter uma ameaça dos Celestiais - mas não é necessário falar muito sobre isso agora - enquanto tentam melhorar a opinião pública, inclusive criando um super-herói de Krakoa para atuar num aspecto global, o Capitão Krakoa (que, sejamos honestos, é uma ideia bosta), e mais um número cada vez maior de relances e ações no universo Marvel maior. Sejam Sentinelas com tecnologia Stark (que inclusive se casa com a Rainha Branca, Emma Frost) ou o Noturno se tornando o Homem Aranha ou mesmo a Mary Jane como pessa crucial do Hellfire Gala, além da Ms Marvel (que morre nas histórias do Homem Aranha, spoilers eu acho) aparecendo como uma mutante, enquanto mais e mais eventos e séries ocorrem (o grupo de Tempestade e Magneto que parte para colonizar Marte enquanto o Senhor Sinistro descobre que possui outros clones de si mesmo cada quais com seus motivos e propósitos).

Enquanto a fase de Hickman surge com uma missão audaciosa de revitalizar a franquia e servir de ponto de entrada para novos leitores (e aqueles que estavam afastados por algum período), os anos seguintes tornam tudo maior, mais confuso e convoluto, o que é curioso, uma vez que Hickman apresenta conceitos complexos e bastante complicados (estabelecendo uma religião própria para os mutantes, contextualizando sua posição no palco geopolítico global enquanto lidando com uma narrativa de viagens no tempo, ameaças tecnorgânicas e o que mais), é fácil acompanhar as ideias e a construção de mundo.

Depois? Bem, surgem mais e mais conceitos que não se encaixam ou funcionam no contexto geral (ou sequer são desenvolvidos), e que vão se avolumando com novos conceitos que não se encaixam ou funcionam no contexto geral. E dá-lhe viagens no tempo, clones brigando por controle, robôs assassinos e efetivamente uma guerra entre a humanidade e os mutantes, que, curiosamente parece vazia de propósitos ou riscos.

Com o Hellfire Gala de 2022 são colocadas algumas das peças que vão tornar a população do mundo ainda mais desconfiadas dos mutantes (ainda que seja como argumento para a série com os Eternos do parágrafo anterior) enquanto no evento de 2023 os vilões Orchis mostram sua cara e entreguem o plano mais terrível contra os mutantes, executando diversos deles no processo e incriminando Cíclope por um ataque em Washington.

Esse é o ponto em que começamos as mini-séries da Queda da Casa de X, Cíclope preso e aguardando julgamento (que não vai a lugar algum, porque não é um argumento relevante), diversos mutantes mortos enquanto um grupo pequeno move uma resistência para enfrentar Orchis (que se resume a espaço para violência gratuita) enquanto Xavier tenta resolver os problemas de Moira (que após os eventos de Inferno traiu os mutantes e se junto a Orchis) e do Senhor Sinistro (que possui outros clones que, eu nem vou fingir que me importei com essa narrativa)...

O grande problema dessa série é que, desde muito antes da primeira página de sua primeira edição ser publicada, já fica bem claro qual é o propósito da coisa toda e qual a finalidade dessa história: Apagar a fase Krakoa e voltar para as histórias convencionais de grupos heróicos mutantes enfrentando grupos vilanescos mutantes (porque, sabe, leitores adoram reclamar que os quadrinhos de hoje são muito repetitivos mas ou não compram ou reclamam ainda mais quando algo diferente e ousado é lançado).

Nisso a grande guerra entre mutantes e Orchis é inconsequente (além de repetitiva quando meses atrás saiu a outra série em que mutantes passaram por uma gigantesca guerra - sem consequências reais - contra os Celestiais), ao mesmo passo que o julgamento de Cíclope (que mesmo como conceito é um argumento raso e extremamente fraco, afinal todos sabemos que ele não é o culpado pelos crimes sob os quais é julgado) e basicamente todo o resto (os mutantes em Marte, os mutantes mortos, a mutante infiltrada na Orchis - e que é odiada por todos os demais mutantes e etc).

{Editado} Por mais que a série 'fale' de um número gigantesco de mortos, do acesso aos códigos nucleares ou o que for, nada tem peso ou substância, sempre ocorrendo fora de painel. Xavier acaba como um criminoso de guerra, e Apocalipse volta a ser o grande vilão (que inclusive muito mais páginas retratam o personagem enfrentando X-men do que efetivamente o resultado das ações terríveis de Xavier) {fim da edição}

Mesmo o que poderia render algum caldo no conflito entre Xavier e Moira (e porque não com Sinistro encontrando quase divindade com o próprio Sinistro) acaba desprovido de qualquer impacto ou nuance. Moira se redime no momento final, Xavier passa incólume (e até mais limpo se pensarmos bem pois tudo o que ele faz de ruim na fase Krakoa acaba esquecido ou ignorado com o reboot) e efetivamente tudo volta a ser como antes, e o 'grande evento' é um exerício em frivolidade.

O que, novamente, é bastante curioso pois na fase Krakoa os mutantes contemplam uma potencial imortalidade (o que faria a morte dos personagens bastante inconsequente - ao passo que releva questões morais e espirituais mais complexas), enquanto o fim deste recurso não parece de maneira alguma trazer algo concreto que efetivamente mudará o status quo nesse universo (na verdade, como sabemos bem, quem é morto sempre aparece em quadrinhos de super-heróis, é só perguntar para o Professor X).

O que o "futuro" promete? Do que vi, mais do mesmo, e se eu já não estava acompanhando de perto a fase depois de Inferno de 2021, agora que eu duvido que volte para a série sem um sufixo (como '97).

12 de dezembro de 2024

{Resenhas relâmpago edição 2024} Coisas que eu não acho que merecem uma resenha inteira (mas que me despertaram interesse)

Fallout (é, eu não falei dessa, eu falei do filme Borderlands comentando por cima de Fallout) Boa série, funciona tanto para quem não conhece como quem é aficionado pela série de videogames, mas eu honestamente acho que a Amazon planejou mal a divulgação do material e muita gente nem lembra que ele saiu esse ano.

A estrutura de múltiplos protagonistas ajuda a facilitar o acesso da maluquice que é o universo do jogo para o espectador, além de oferecer as diferentes facetas de moralidade dos jogos, mas, eu honestamente acho que uma estrutura mais episódica (com o desafio da semana que o sobrevivente dos abrigos nucleares passa a descobrir ao mesmo tempo que os espectadores).

Falando de uma série que ninguém lembra que saiu esse ano Like a Dragon: Yakuza. Essa é piorzinha e eu acho que é difícil empolgar por uma série de motivos (atores fraquinhos e personagens que levam muito tempo para se apresentarem propriamente, além de um roteiro que só engata a segunda marcha depois de uns três ou quatro episódios), mas é um material que dá um bom caldo e eu preferia bem mais uma segunda temporada bem trabalhada que, bem, mais uma temporada de The Boys ou Os Anéis do Poder.

Black Doves é uma série que eu queria gostar muito. Keira Knightley (que eu descobri recentemente que tem a mesma idade que eu) e Ben "Paddington" Whishaw em uma série de espionagem com possivelmente o melhor diálogo que eu vi não só nesse ano e uma boa dose de cenas de ação. Porque não empolga então? Bem, o roteiro e a direção que não parecem trabalhar de maneira coesa para fazer o restante funcionar... Fica perdendo tempo com flashbacks ou cenas bobas e pouco interessantes que não ajudam ou contextualizam nada de relevante, perdendo totalmente o momento e o interesse do público.

Eu ainda acho que vale a pena ver o material, mas eu gosto da Keira Knightley e do Ben Whishaw, e de fato o diálogo é muito bom... Mas não vale uma efusiva recomendação não. Talvez quando você estiver de ressaca fugindo dos parentes no Natal ou Ano Novo...

O Dublê - melhor filme de ação (só de ação?) do ano, fácil. Tá, o roteiro tem váaaaaaaaaaaaarios problemas e clichês (com uma conclusão incrivelmente estúpida), mas existe algum filme de ação que não entre nessa categoria (Eu nem vou entrar no argumento sobre Duro de Matar com um cofre cheio de ações ao portador num prédio ainda em construção)? Assista pela ação, pelo carisma de Ryan Gosling e ignore o roteiro o quanto puder...

Dan Da Dan é facilmente a animação que mais me surpreendeu em 2024 de longe. O roteiro é insano e rápido (em 20 minutos de cada episódio parece que acontece mais que em 3 horas e meio de muitos filmes), e geralmente as mudanças são imprevisíveis, malucas, hilárias e impressionantes. Existem lá seus problemas (afinal é um romancezinho - meio pervo - para adolescentes com ares de Arquivo X), mas eu realmente fico positivamente supreso com os rumos que o material vai a cada episódio.

No espectro de surpresamente confuso, Comando das Criaturas é uma série que eu não sei o que pensar ou esperar. Quer dizer, olhando num vácuo, é bem divertido como quase tudo que James Gunn fez para a DC desde O Esquadrão Suicida, combinando construção de personagens, estrutura narrativa com piadas bem escritas e bem planejadas.

No entanto, bem, qual é o ponto dessa animação no contexto maior do Universo DC que James Gunn vem construindo? Quer dizer, ele continua a história de O Esquadrão Suicida e Pacificador (que fazem parte no contexto maior do Snyderverso), enquanto trilham um caminho para um novo Superman que veremos no filme de 2025... E mais que isso, num contexto maior, existe o problema que esse roteiro é incrivelmente parecido com o daquela animação ruim do Esquadrão Suicida (grupo black-ops que invade um reino fictício para combater uma força invasora - comandada por um vilão renegado) DESSE MESMO ANO!

Tá, é muitas vezes melhor que a animação em que o Coringa dirige um carro tocando teclado (eu nem sei o que dizer disso além do quão estúpido e ridículo a coisa toda é), mas, é perigosamente próximo para preocupar.

Aguardo os próximos capítulos (que incluem o filme do Superman) para dizer mais, e espero que minhas preocupações sejam infundadas...

8 de dezembro de 2024

{Resenha Lixo} Robô Selvagem - Peter Brown

Eu sei, eu sei. Tem gente que já está revirando os olhos por eu fazer um resenha lixo de um livro infantil, mas, por favor tenham um pouco mais de fé em mim.

E eu não assisti ao filme - que estava nos cinemas e apareceu agora para aluguel em vários dos serviços de streaming - então toda a minha opinião se baseia em um livro para crianças de 288 páginas (quase o dobro do primeiro livro de Paddington com 143 e o mesmo número de páginas que Roald Dahl usa para O Bom Gigante Amigo. No entanto, Peter Brown não é nenhum Roaldo Dahl.

Peter Brown tenta muito ser A A Milne de Ursinho Pooh, com comentários aqui e ali para incluir o leitor na narrativa, enquanto cria um mundo fantástico com animais falantes (que bem todo autor de livros infantis faz, então não é nada particularmente impressionante), mas ele faz algo que nenhum dos outros autores que eu li até hoje fez: Ele terminou o livro preparando uma continuação (é o método Marvel?).

Não que eu tenha lido os 80 capítulos com uma história sem o menor propósito além de prolooooooongar uma bobageira sobre um robô se adaptando para a natureza e falando como os animais (como um Dolittle ainda mais sem-graça que o de Downey Jr) para chegar ao final e concluir que o livro é ruim, longe disso, isso é só a cereja no topo do bolo.

Vejamos, a "história" traz uma robô (sim, ela tem gênero por algum motivo) que após um desastre com a embarcação que a carregava acaba parando numa ilha remota onde ela inicia seu funcionamento e tenta se adaptar sem sucesso por longos e tediosos capítulos até ela aprender a falar como os animais (cantar como os animais, sorrir como os animais!!!) e, acidentalmente mata uma família de gansos exceto um pequeno ovo que ela ajuda a chocar e cria como se fosse dela (sim, depois de aprender a viver na natureza ela agora aprende sobre maternidade e eu juro que essa é a versão resumida - eu nem falei dos ursos, lontras e todo tipo de animais e interações até agora) até que o ganso cresce e parte com um grupo para escapar do inverno enquanto os demais animais (e a robô) precisam buscar abrigo na ilha e formar uma grande e bela família.

Os gansos encontram uma fazenda onde um homem mata o líder do grupo e isso é o gatilho (sem trocadalho) para o ato final do livro em que um grupo de robôs de resgate vai para a ilha capturar a protagonista "Robô Selvagem" (e acabam destruindo e sendo destruídos no processo), enquanto o livro concluí com a protagonista aceitando o destino de 'ser resgatada' mas prometendo que voltaria para rever seu "filho".

E, vamos deixar claro, o problema não é que acontece tanta coisa, e o livro se prolonga com 80 capítulos em 288 páginas... É que acontece tanta coisa que não importa ou agrega qualquer coisa. Com metade das páginas contando a narrativa da robô se adaptando com a vida selvagem para perder isso com o 'resgate', pronto a história está ali com um conflito entre tecnologia e natureza (além de uma questão de programação contra livre arbítrio, que não vamos fingir que Peter Brown sequer cogitou).

O livro se prolooooooonga e os factóides que são relatados são bobos ou pouco interessantes, agregando nada.

Simplesmente não consigo imaginar uma criança se empolgando de ler o livro (e se for pouco mais velha não chegaria nem perto mesmo), e menos ainda a ideia de ler para uma criança o material. Nisso me pergunto, para quem é esse livro além do próprio autor?

5 de dezembro de 2024

{Resenhas Profetizadas} Duna de quinta

Duna: A Profecia se passa 10.000 anos antes dos eventos de Duna (e Duna 2, se isso te ajudar de alguma forma mais específica) e eu não consigo por motivo algum entender porque diabos tudo isso de tempo.

Quer dizer, eu entendo que é para estabelecer as Bene Gesserit e seu papel crucial para moldar a sociedade e tudo mais, mas, 10.000 anos? Droga, é um prazo muito longo (essencialmente a história da humanidade após a agricultura), e a gente ouve nomes como Harkonnen e Artreides que continuam relevantes nos eventos dos filmes de Dennis Villeneuve.

{Editado em 14-12} Sim, eu revi os filmes de Dennis Villeneuve e existe uma fala pequenininha da Madre Superiora e outra de Lady Jessica sobre como os planos das Bene Gesserit levarem SÉCULOS não meses, o que ainda me parece uma hipérbole gigantesca para chegar aos 10.000 anos sem uma notável e nítida mudança em termos de tecnologia {Fim da edição}

E enquanto nada disso é relevante para a história apresentada ou para a história dos filmes, é algo que distrai bastante (veja que eu estou no terceiro parágrafo e ainda estou tentando justificar ou ver a lógica dessa situação).

Então o que é relevante para a história? Bem, aqui as coisas ficam mais difíceis porque por um lado a gente já sabe como a história termina (afinal 10.000 anos depois as Bene gesserit ganharam, se tornaram extremamente poderosas e influentes no império de Duna), e, por outro lado, nós também sabemos que os Harkonnen e Artreides (e mesmo o império e o tráfico de especiarias) continuam firmes, fortes e basicamente iguais ao que vemos no seriado e nos filmes...

Não que as intrigas para a formação da irmandade e seus conflitos internos (sobre motivações e intenções divergentes) sejam menos interessantes, longe disso. A série tem um elenco impressionante e o roteiro é muito bem escrito, de forma que é fácil acompanhar e mesmo ignorar o ponto de que, bem, o conflito da série é irrelevante, e um baita material de nicho apenas para fãs radicais de Frank Herbert, do universo de Duna ou dos filmes de Dennis Villeneuve (que ao meu ver, é justamente o oposto do que ocorreu com Pinguim pouco mais de um mês atrás, firmemente ligado ao universo dos filmes de Matt Reeves enquanto funcionando perfeitamente isolada com o bom desenvolvimento do personagem e seu universo).

O pior, ao meu ver, se dá pelo fato que as protagonistas da série não são interessantes. Reforço, a a história é bem escrita, os atores são ótimos, mas a história das protagonistas não é interessante (três episódios lançados, ou seja, metade da temporada ou mesmo da mini-série, e nada de particularmente diferente ou interessante na motivação destas personagens - além de uma busca incessante por poder e vingança).

Talvez melhore, talvez se torne algo imperdível... Mas hoje, honestamente, melhor rever os filmes e deixar isso como uma nota de rodapé  (sabe, como Game of Thrones NO ESPAÇOOOoooo).

1 de dezembro de 2024

{Em busca do pior...} 2 pelo preço de um?

Sim, o episódio de Lady Gaga é um dos piores episódios de os Simpsons de todos os tempos e eu não falei dele até agora (eu falei bem por cima dos problemas de episódios com Lisa e que são exatamente os mesmos problemas desse episódio - a menina brilhante lidando com problemas de aceitação, auto-estima, ansiedade e depressão), e eu genuinamente acredito que este é um episódio terrível por uma série de motivos, que incluem o uso exacerbado de uma personalidade moldando completamente o roteiro para encaixar os maneirismos exagerados (e ainda mais exagerados para se tornarem caricatos) para que toda a estrutura narrativa gire ao redor desta celebridade.

Lisa goes Gaga é o episódio final da vigésima terceira temporada, então até faz certo sentido em tentar terminar a temporada com grandiosidade e espetáculo, é uma pena que não funcione, mas, acontece que essa estrutura se repete em outras vezes, e, pensando bem, ela é bem pior em um outro episódio.

Veja bem, o episódio com Gaga é péssimo - as piadas não funcionam ou são engraçadas, a narrativa é uma constante hipérbole (que eu enxergo como uma tentativa de humor, mas que não funciona) e a conclusão é boba e clichê.

Acontece que o episódio da vigésima sexta temporada The Musk who fell to Earth (O Musk que caiu na Terra) faz exatamente isso (uma celebridade que é o centro da narrativa, com um culto exacerbado sobre sua personalidade, piadas que não funcionam e não são engraçadas e uma narrativa que é uma constante hipérbole), com um ponto fascinante que torna este episódio categoricamente pior: Enquanto no episódio de Gaga a hipérbole é clara e ridícula (droga, ela ganha super poderes como do Homem Aranha em dado momento para sentir que um de seus fãs está em apuros) com o ponto de sátira e paródia, isso parece bastante ausente no episódio com Musk.

E antes que os fãs do bilionário venham me criticar, vamos deixar bem claro que eu não vou entrar nos méritos ou deméritos da competência dele (como não fiz com a Lady Gaga, inclusive ao criticar o episódio com ela), mas um episódio em que apresenta um bilionário como o Tony Stark de carnê e osso e que genuinamente criará sozinho um futuro utópico que fará os Jetsons parecerem um desenho para crianças (hein?), é isso não funciona. Já foram 10 anos desde o episódio e além dos carros autônomos que foram mote para mais um episódio na 31ª temporada (e que também não é muito bom), o mundo da família amarela não ficou minimamente mais tecnológico ou avançado que estava na temporada 26 no longínquo 2015, e, verdade seja dita, nem o nosso mundo real avançou tanto assim.

O puxa-saquismo com Musk no episódio não é nem novidade nem exclusividade com o bilionário - outras celebridades passaram pelos Simpsons e estragaram diversos episódios - acontece que o sujeito é péssimo com piadas (vide seu episódio no SNL), e o roteiro passa tempo demais exaltando o ego e pouco construindo piadas, situações cômicas ou qualquer coisa que se salve, e, até o momento são os dois piores episódios com participação de celebridades - e, onde o problema nem são as celebridades em si, mas a narrativa forçando goela abaixo a contínua participação desta celebridade mesmo depois do ponto já estabelecido e concluído.

Notas: Lisa goes Gaga 0,5/10; The Musk who fell to Earth 0,25/10 (empatado com o pior até o momento)

28 de novembro de 2024

{Resenhas Galináceas} Guerra Civil

2024 foi um ano de filmes fracos, decepcionantes e esquisitos não necessariamente nessa ordem ou intensidade (talvez 'muito fracos, extremamente decepcionantes e terrivelmente esquisitos').

E enquanto eu consigo entender a frustração do público (não muito, mas consigo) com Coringa ou Venom, a confusão com o estranhíssimo Megalópolis e mesmo a reação a coisas como O Corvo ou Borderlands... Eu honestamente não consigo entender Guerra Civil.

Ou melhor, eu não consigo entender a covardia de Guerra Civil. Droga, com 50 milhões de orçamento, com um elenco capitaneado por Wagner Moura e Kirsten Dunst e um tema que é interesasnte e tenso sobre a escalada do autoritarismo e violência política, bem, o que o filme faz? Bem, escolhe a solução mais covarde possível e parte para uma situação em que a escalada política não é o foco ou sequer relevante (mais ruído de cenário - inclusive ignorando completamente os motivos e os personagens responsáveis por essa escalada, começando pelo Caveira Laranja futuro presidente) porque efetivamente o filme prefere usar esse cenário para retratar a importância do jornalismo.

Eu não sei o quanto do filme eu perdi enquanto meus olhos reviravam ou inclusive estavam quase olhando para meu próprio cérebro do tanto que reviraram conforme a narrativa tentatva justificar a nobreza e importância do jornalismo em tirar fotos de um conflito (enquanto o filme ignora o cerne e os motivos desse conflito, inclusive com esses nobres jornalistas fingindo que manter um distanciamento e "objetividade" quando tem uma arma apontada para suas cabeças equivale a integridade jornalística).

Ah, mas o filme mostra violência e diversas cenas grotescas, isso não vale para alguma coisa? Quer dizer, além de ignorar ou mesmo declarar diretamente que os agentes da violência são calhordas fascistas e estão errados (porque, de novo, o jornalismo tem que ser imparcial e relatar os eventos sem julgamento de valor) e por outro lado meio que justificar ou mostrar que a culpa de todo o cenário é do presidente norte-americano fraco que não agiu para unificar o país com os fascistas formando milícias armadas para derrubar o país (e um presidente que pode até não ser a intenção do filme mas parece claramente com o atual presidente democrata estadunidense Biden).

Ou seja, a culpa da violência é da vítima que não tentou fazer as pazes com os agressores (argumento brilhante, Alex Garland, escritor e diretor do filme).

Droga, desenhos animados para o público infantil trazem argumentos mais complexos que isso (a Liga da Justiça Ilimitada fazia citações a Borges além de complexas reflexões sobre um estado vigilante) além de conclusões mais contundentes. Droga, o filme do Silvio Santos que é potencialmente o filme mais caça-níqueis do ano - lançado às pressas após a morte do apresentador na tentativa de capitalizar ao máximo com o evento (e eu nem ficaria surpreso se sequer tivessem terminado de escrever o roteiro até o minuto final de edição do filme) - até essa droga de filme é melhor, mais coeso e interessante que uma superprodução de Hollywood com um baita elenco!

Nota: Você não precisa de nenhuma Guerra Civil (ela alimenta os ricos enquanto enterra os pobres)...

21 de novembro de 2024

{Resenhas de Cancelamentos abruptos} Mindhun

Mindhunter foi lançado em 2017 e teve duas temporadas (a segunda dois anos mais tarde, em 2019) com direção de David Fincher (de Se7en, Zodíaco, Alien³ e um clipe musical do Justin Timberlake, portanto plena experiência com monstros e serial killers) e enquanto a versão oficial para o cancelamento da série seja o orçamento, eu não sei se acredito nessa versão.

A série completou 7 anos agora em 2024 e, nesses sete anos eu tentei assistir ao material possivelmente uma vez cada um destes anos sem passar dos minutos iniciais ou muito chegar ao final do primeiro episódio - e o primeiro episódio detém a menor avaliação da série toda junto ao IMDB. O ritmo é glacial, a história demora para engrenar com toda uma gama de jargões técnicos para justificar um processo acadêmico investigativo sobre o comportamento de criminosos e assassinos (de novo, tudo de um ponto de vista extremamente técnico e teórico até ali por volta do episódio 5 da primeira temporada quando eles tentam colocar o conhecimento em prática) e honestamente o primeiro episódio serve somente como um prólogo longo do que um episódio em si, e é a entrevista com Ed Kemper do segundo episódio que efetivamente faz com que o material engate uma segunda marcha e comece a ter algum ritmo.

Mas para ir da segunda à terceira marcha, bem, praticamente não acontece na primeira temporada inteira, é sempre aquele ritmo lento quase glacial que progride milimetros não metros.

Veja bem, não estou dizendo que o material é ruim nem de longe. As entrevistas com os serial killers são tensas para deixar qualquer um na beirada de seu assento com suor frio escorrendo, e quanto a teoria inovadora encontra um espaço para prática, vemos algo efetivamente genial... O que acaba perdendo espaço para narrativas desinteressantes e que não vão a lugar nenhum (como a psiquiatra alimentando um gato - é, isso é uma cosia que acontece - ou um sujeito bigodudo esquisitão do Kansas que aparece por alguns minutos quase todo episódio e cuja narrativa nunca rende coisa alguma, inclusive porque a série é cancelada antes disso render qualquer fruto).

E enquanto a segunda temporada é melhor em alguns aspectos, inclusive com um foco mais centrado em uma grande investigação que coloca em prática o trabalho teórico desenvolvido na primeira temporada (assim como apresentando um diretor do FBI bem mais favorável ao trabalho dos agentes Tench e Ford no desenvolvimento de perfis para assassinos seriais), a narrativa também em um número ainda maior de subtramas que não agregam coisa alguma, o que acaba com histórias demais ganhando tempo (como o relacionamento da doutora Carr, ou os interrogatórios de Charles Manson) enquanto histórias interessantes não são devidamente desenvolvidas (como os ataques de pânico de Ford que não resultam em nada na segunda temporada inteira ou toda a ação burocrática da polícia de Atlanta dificultando a investigação ou conduzindo o processo de maneira porca mesmo).

Então deixa eu resumir: Um começo fraco, um material extremamente técnico com subtramas que não vão a lugar nenhum (e algumas inclusive são incrivelmente estúpidas e desnecessárias). Tem muita coisa positiva, e o saldo é vastamente positivo diga-se de passagem, mas exige uma perseverança que, honestamente eu não sei se é para todo mundo.

Ainda mais quando você sabe que o material foi cancelado antes de concluir várias histórias, mas, mais importante, uma que tentou desenvolver nas duas temporadas do assassino BTK (que sim, é o bigodudo esquisitão do Kansas), acabando com um episódio que é bastante cínico sobre os sucessos da investigação recém concluída como do trabalho todo desenvolvido até aquele ponto.

Recomendo com ressalvas, principalmente para quem gostou do filme Zodíaco de David Fincher e gostaria de mais.

Quem gosta de séries policiais facilmente se decepcionará porque a estrutura é diferente (não tem como comparar com um Law and Order ou CSI e o público para estes seriados dificilmente se empolgaria com esse material mais lento, candenciado - e, pior, que sequer resolve os crimes que apresenta). Nada de vilão da semana ou mesmo uma investigação planejada e estruturada (mesmo quando pegam os bandidos, fica uma sensação de que ou pegaram a pessoa errada ou faltou alguma coisa mais concisa - e que, sim, é intencional).

Então, o argumento que a série foi cancelada pelo valor elevado faz sentido? Bem, considerando que a estimativa é de um belíssimo 15 milhões de dólares por episódio (ainda menos que os 35 milhões que a Warner gastou por um piloto engavetado de spin-off de Game of Thrones Bloodmoon ou o caríssimo os Anéis do Poder da Amazon - cuja primeira temporada ficou nos 281 milhões e a segunda pode ter custado até 1 BIlhão), ainda temos que lembrar que Wandinha que foi um considerável sucesso de público e inspirou diversos acordos publicitários para a Netflix, e custou algo em torno de 3 a 4 milhões por episódio - ou seja, até 1/5 do valor - faz sentido que seja o ângulo escolhido para justificar o cancelamento.

No entanto, e aí é onde talvez o argumento seja mais relevante, é que Wandinha é um seriado para o público infanto-juvenil (afinal é Harry Potter com a Família Adams) enquanto o outro material é claramente para o público mais adulto, e, a Netflix peca bastante em material para esse público (exceto com extrapolações) e fica bem atrás da Max, Disney (com o catálogo da Fox/FX) ou mesmo o Prime... Então será que produzir material para o público adulto simplesmente não ressoa com audiências em geral para compensar financeiramente ou o público da Netflix é mais jovem (ou prefere conteúdo mais jovem)?

Bem, para responder a essa pergunta precisaríamos de acesso a dados que obviamente a plataforma de streaming não teria a menor vontade de compartilhar, e, mesmo assistindo a todos os episódios da série não é possível traçar um perfil psicológico detalhado o suficiente para entender. (Mas eu apostaria consideráveis quantias de que é bem mais interessante para a plataforma investir no público infanto-juvenil que gastará bem mais horas vendo e revendo material que os adultos - que talvez ainda prefiram tv a cabo ou mesmo a TV aberta para seus esportes ou novelas).