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21 de setembro de 2024

{Editorial} O Batman morreu, vida longa ao Batman!

Eu já falei um bocado sobre Batman, e, no ano que comemora seus 85 anos de existência eu acho que coloquei um pouco mais de ênfase aqui e acolá.

Mas talvez minha nostalgia ou minha falta dela no caso mais específico tenha me limitado de escrever sobre o período do personagem que eu li e gosto mais que segue as histórias dos anos 1980 e 1990, basicamente entre o período que Chuck Dixon, Alan Grant, Doug Moench e Jim Starlin escreveram as histórias que ainda hoje eu releio e genuinamente continuou a gostar do personagem.

O Batman moderno começa com Jim Lee e Jeph Loeb em Batman 608 da saga em doze volume entitulada Silêncio (que é o fim do personagem dos anos 1990 e a inserção da versão do século XXI do mesmo - ainda que cuirosamente seja a versão dos anos 1980 dos X-men com Jim Lee desenhando mulheres sexy com decotões enquanto um roteirista tenta produzir um roteiro que aloque o máximo de imagens dessa natureza possível por edição).

Mas levaria ainda algo como cinco anos pelo menos para que a transição de fato ocorresse para que o Batman do século XXI com menos coesão entre os títulos do personagem e mais participação no universo DC maior e mais abrangente como Morrison faria escrevendo tanto as histórias do Batman e do universo maior (como o Multiverso e a Crise Final) que acabariam matando o Batman/Bruce Wayne e solidificando a ideia do novo Batman, que é tanto a versão moderna/contemporânea do personagem como, bem, a versão que me desagrada mais.

Ainda que eu não tenha nenhum amor pelas versões pré anos 1970 de Neal Adams e Denny O'Neil, e eu genuinamente seja tendencioso sobre a fase dos anos 1990, principalmente após Chuck Dixon assumir o título, eu confesso que o morcegão após a chegada de Grant Morrison é para mim uma grande decepção.

Morrison é um grande escritor de quadrinhos com uma vasta carreira que contém clássicos tanto com personagens obscuros (como o Homem Animal) como bastante famosos (como os X-men e a Liga da Justiça) e quadrinhos autorais (como os Invisíveis). Dito isso, sua fase a frente do Batman é, bem, sejamos francos, ruim.

Existem algumas boas ideias aqui e ali, ele apresenta personagens bem interessantes como Damian ou o Professor Porko, mas muitas das coisas são pra dizer o mínimo bobas e pouco inspiradas. Ideias repetidas de material escrito pelo próprio Morrison meses antes nos X-men ou por outros autores em outros títulos (tem uma história do Paul Dini em Detective Comics que traz exatamente a mesma reviravolta que Morrison propõe com o Coringa em seu título mensal) e o negócio vai degringolando mês após mês com repetecos, pouca inspiração e  isso marca bastante a mudança que vemos dos anos anteriores.

A perspectiva de interferência editorial se torna mais uma ferramenta para garantir que crossovers, tie-ins e eventos (inclusive cinematográficos) do que para garantir uma estrutura coesa e evitar repetições de ideias e narrativas (de novo, Paul Dini constrói histórias com o Coringa e com o vilão Silêncio que Morisson viria a repetir em suas histórias com o mesmo Coringa e com o Doutor Hurt substituindo Silêncio). E com o que viria depois - com os novos 52 e o Batman de Tom King participando cada vez mais de crossovers - é constantemente uma repetição do que começou com Lee/Loeb e que se consolidou com a fase de Morrison.

E enquanto eu particularmente não gosto de nada da fase de Chip Zdarsky (mas honestamente eu não gosto dos quadrinhos dele no geral) seja com a ideia do Batman de Zun-En-Arrh (que é algo que Morrison trabalhou e já era incrivelmente estúpido na fase Morrison) eu continuamente me vejo num contraste das interpretações modernas do personagem que visam buscar mais uma perspectiva sobre a psicopatia latente do bilionário que viu os pais assassinados em sua frente do que a mitologia maior de um bicho-papão que habita as sombras e é mais uma lenda urbana que eventualmente elucida crimes e resolve grandes mistérios (sabe, como Sherlock Holmes, quase um século antes).

Existe toda uma perspectiva atual para revisar o privilégio de Wayne como bilionário quase como se sua evasão fiscal para comprar brinquedinhos usados para o combate ao crime fossem tão ou mais problemáticos que psicopatas assassinos (e sim, esse argumento é proposto tanto na animação da Arlequina quanto na série O Cavaleiro Branco)... Quase como se no mundo real não existissem bilionários sonegando impostos e idolatrados por uma massa de gente...

Honestamente eu me incomodo não tanto com a interpretação ou visão mas com a falta de uma consistência lógica, até porque nessas versões condena-se Bruce Wayne por ser um bilionário (afinal sonega impostos e seus familiares se apropriaram indevidamente de terras e blá-blá-blá) enquanto o assassino psicopata Coringa é redimido e se torna prefeito...

Bruce é só a máscara que Batman usa para justificar a figura social (interagindo com ricaços e outros figurões) enquanto o bicho-papão caça criminosos e resolve os crimes, e o fato dele ser um ricaço é no geral uma forma de eximir uma responsabilidade financeira (e por tangente um viés dessa mesma forma com a obrigação de resolver casos para receber algum tipo de compensação). Batman, como Sherlock, resolve crimes por frustração ou tédio ou obsessão.

Quando o dinheiro e a persona de Bruce Wayne se tornam ponto focal, o viés investigativo e conseguinte as figuras bizarras que produzem tais crimes perdem o foco ao que vemos vilões cada vez menos interessantes (sabe, como o "Jardineiro" ou o mais recente que é uma inteligência artificial criada por uma personalidade dividida de Bruce Wayne) e isso, ao menos na minha opinião, nos mostra mais e mais quanto o personagem é pouco interessante.

Mais que isso, são narrativas repetitivas que caem no clichê de algum parente, amigo do passado ou variação de uma terra alternativa (que é um parente ou amigo do passado), sem que tragam alguma ameaça diferente da ideia de algum parente (amigo do passado ou variação de uma terra alternativa - que é um parente ou amigo do passado) como uma variação sombria do Batman e capaz de expor os segredos do personagem.

Batman não é o Homem Aranha, e portanto sua vida privada é irrelevante. Não são os desafios para conseguir juntar dinheiro para pagar as contas ou os amigos que o traem ou qualquer outra variação e combinação de ambos que definem o personagem (até por isso ele é um bilionário para que o dinheiro nunca seja uma objeção), mas os vilões coloridos que representam facetas tanto de si mesmo quanto os buracos mais obscuros e perversos da sociedade. E, claro, em 85 anos essa ideia não tem como funcionar da mesma forma que na década de 1930/1940, mas ela não é de todo diferente.

O bicho-papão continua(rá) a ser a lenda urbana perseguindo o pior da sociedade, e se será um maluco fantasiado de morcego ou será um apresentador (que se lançará à carreira política usando uma cadeira como arma no lugar de bumerangues) de alguma rede de televisão ganhando milhões para fazer isso, bem, só depende do talento do roteirista.

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