Tanto Cooke quanto Brubaker nos anos seguintes ficariam conhecidos por produzirem material sobre criminosos noir/pulp como a série de graphic novels de Parker (adaptando os contos/livros de Richard Stark) e a série Criminal, Reckless ou Pulp respectivamente de ambos mostra que eles tem bastante interesse e gosto pelo gênero detetivesco com (anti)heróis lidando sempre com situações claramente indo de mal a pior, e Mulher Gato é claramente a gênese desses projetos. Heróis pulp são geralmente perdedores fodidos que cansaram de ser humilhados constantemente pela vida e tentam assumir as rédeas da situação ao uma vez na vida (e, talvez sair por cima), e não obstante são criminosos (geralmente ladrões) ou detetives corruptos e a Mulher Gato se encaixa como uma luva nessa estrutura que Cooke e Brubaker desenvolve, e a série flui magnificamente como poucas vezes foi possível.
Enquanto as histórias são uma continuação direta da série mensal anterior da Mulher Gato (que termina com ela simulando sua própria morte, e eu não vou entrar nos detalhes até porque se eu li isso eu não me lembro), mas não exige mais do que a nota de rodapé para entender que esse é o pontapé da história (a Mulher Gato simulou a própria morte e portanto todo mundo acha que Selina Kyle está morta), e não exatamente um capítulo necessário para a compreensão dos fatos. Cooke deixa claro que isso aconteceu fora de painel e das páginas e ponto (Selina Kyle está morta aos olhos de todo mundo e a principal suspeita pelo assassinato é a Mulher Gato, ponto, agora vamos ver Selina buscando velhos conhecidos para cometer um novo crime).
Inclusive porque Cooke (e depois Brubaker) seguem num tom bem diferente em várias vertentes do que veio aqui, seja narrativamente, seja estruturalmente ou seja, e talvez aqui seja o maior baque, na condição de arte.
Enquanto a Mulher Gato da série mensal anterior era (bem) mais voluptuosa com a arte de Jim Balent (e dois balões que fazem inveja para personagens de animê, inclusive aumentando consideravelmente com os anos) e bem mais típica heroína de quadrinhos de super heróis (sobrevivendo explosões, enfrentando terríveias monstros e criaturas e no geral fazendo o impossível 8 dias por semana, 29 horas por dia), com algo muito mais estúpido e fácil de desligar o cérebro e curtir a jornada, a nova fase muda bastante a partir de O Grande Golpe da Selina, e as coisas são bem plausíveis ainda que não 'pé no chão' ou realista, o contexto é sempre muito importante - as histórias tomam mais tempo e tem menos ação - e coadjuvantes são sempre relevantes na construção de fatos (ao que suas mortes são significativas ao mesmo passo que trágicas).
Na minha opinião, Brubaker aqui está plenamente em seu elemento, ao contrário de outros quadrinhos que ele produziu na mesma época (tanto para a DC quanto para a Marvel, ainda que tenha bem mais sucesso na Marvel com o Capitão América). Selina é o tipo exato de protagonista que vemos nas outras séries independentes/autorais dele, e ainda que talvez não se encaixe perfeitamente com o restante dos quadrinhos da DC (ou do Batman onde ela faz parte).
Selina vai roubar um trem carregando dinheiro para comprar drogas e precisa de uma equipe de confiança para o serviço (e, obviamente, as coisas dão errado). Depois Selina precisa ajudar gente de seu passado (e, seu passado não é a versão sanitizada das histórias da fase de Jim Balent, fica bem claro com todas as letras que ela era uma prostituta - e que ela está ajudando pessoas de seu passado enquanto prostituta).
E enquanto a saída de Darwyn Cooke (ainda que Cameron Stewart consiga manter um estilo próximo) e tramas que acabam trazendo de volta vilões coloridos e histórias com mais ação (e bobagens como ninjas para tentar aumentar as vendas), ainda temos excelentes histórias como o arco Disfarces (que traz toda uma complexa trama envolvendo policiais corruptos e a amiga/ajudante de Selina que luta para manter sua sobriedade) a série se mantém como uma ótima fase até o grande crossover Guerra das Gangues (que é o ponto de saída de Brubaker e reestruturação editorial da DC, que não demoraria para trazer Adam Hughes para produzir capas com a personagem sensualizando ou com imensos decotes).
Eu acho que foi uma aposta extremamente ousada que eu não acredito que tenha recompensado financeiramente (em termos de vendas, pelo menos porque a crítica constantemente elogiava a série a cada oportunidade), o que, até curiosamente acaba resultando nas ideias e apostas do que vemos no selo Black Label da DC de hoje em dia (onde, sinceramente, muitos ainda estão bem aquém dos pontos mais baixos da série de Brubaker).
Recomendadíssimo!
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