Pesquisar este blog

30 de janeiro de 2022

{Editorial} Mas você não omitiu alguns fatos semana passada, não...?

No meu post "Mas porque o Batman não mata o Coringa de uma vez...?" da última semana existem algumas omissões, ainda que não mudem os argumentos - na verdade mais que pioram a coisa toda - mas com o texto já bastante longo pareceu no mínimo apropriado não estender ainda mais com as informações do texto.

Por exemplo, o fato que o Batman de fato já matou o Coringa, e, inclusive é uma história bastante conhecida, publicada e republicada. E isso simplesmente foi ignorado com editores fingindo que o final da história não é exatamente isso.

Em A Piada Mortal de junho de 1988 de Alan Moore e Brian Bolland a parte 'mortal' do título vem na cena final em que Batman finge rir de uma piada ruim do Coringa para se aproximar e matá-lo discretamente em um ruidoso silêncio. O que é prontamente ignorado no arco "Morte em Família" que se inicia em Batman 426, em dezembro do mesmo ano...

Assim como é o que acontece no filme de 1989 de Tim Burton - e não tem exatamente nenhum impacto na redução da criminalidade de Gotham nas continuações sejam elas de Burton ou de Joel Schumacher (que tecnicamente são da mesma continuidade).

Isso só reforço o argumento de que é estúpido do post original, e, hoje em dia com dois atores recebendo um Oscar pelo papel, e duas animações com o personagem sendo consideradas criminosamente subvalorizadas (ainda mais quando Operação Big Hero recebeu um Oscar e Lego Batman sequer foi indicado).

E, sim, também existe uma omissão importante porque, sim, tecnicamente, o Batman já matou MUITA gente. MUITA mesmo e qualquer jogador de volei sem talento e com tempo para pesquisar ibagens na internet pode 'provar' que esse é um argumento "tendencioso e falho".

Só que isso tem uma série de idas e vindas e contexto.

O personagem em sua origem da criação de Bill Finger e marketing de Bob Kane era mais sombrio e não se importava tanto em matar desde que cumprisse o objetivo - e é com a introdução do Robin que o personagem se torna mais brando e amistoso. O que não dura muito enquanto os super heróis fazem parte do esforço de guerra e depois toda uma longa jornada para justificar o personagem mais próximo da visão super heroica, bonzinha (e meio banana) do Batman do Adam West e dos desenhos da Hanna Barbera...

Só que tem uma outra omissão no texto também, e essa é um pouco mais complicada e complexa, porque tem um viés do quanto o Batman é meio racista e xenofóbico (ou, talvez, seus autores se isso tornar a coisa um pouco melhor), não ligando muito em matar um(ou mais) terrorista(s) do oriente médio (e meio que dizendo que todo mundo daquela região é basicamente terrorista), fazendo piadinha quando um jovem negro quase morre num acidente de carro (porque ele é usuário de drogas, portanto merecedor de tal fim) ou deixando um assassino russo para morrer porque, bem, porque não?

Aqui é importante fazer ao menos mais de um parêntese - ou talvez um gigantesco par de parênteses - para explicar que essas mudanças, principalmente na época dos anos 1980 das histórias citadas no último parágrafo. Os quadrinhos tanto Marvel quanto DC começavam a buscar mais e mais histórias urbanas e 'realistas', com vilões ultra-violentos (como Venom, Carnificina e Dentes de Sabre) enquanto incorporavam anti-heróis dúbios e que não tinham exatamente medo de sujar as mãos (ou garras, como Wolverine, Justiceiro e o Motoqueiro Fantasma).

Com Watchmen isso passou a pesar ainda mais como aspecto narrativo em histórias mais realistas e violentas. Não fazia sentido que Batman enfrentasse um bobalhão com fetiche por chapéus, ele tinha que brigar com assassinos seriais, traficantes e terroristas.

Mas aqui talvez eu esteja me precipitando um pouco.

A DC fez uma grande reestruturação de sua linha editorial no anos 1980 com o mega-evento Crise nas Infinitas Terras buscando uma condição para tornar seus títulos mais atraentes com relançamentos e novas direções criativas. Superman passou por uma gigantesca reformulação nas mãos de John Byrne, a Mulher Maravilha teve o mesmo com George Pérez e vários outros personagens.

Concomitante a isso, alguns personagens migravam mais aos limiares do mundo do super heroísmo de colante. Questão de Dennis O'Neil (eu juro que faço uma resenha sobre a série ainda esse ano), Arqueiro Verde de Mike Grell (idem) e Hellblazer de Jamie Delano são apenas alguns exemplos da busca por quadrinhos mais adultos, maduros e complexos, que tinham super heróis (mas nem tanto assim).

O Arqueiro Verde operava sempre à margem da lei em operações clandestinas trabalhando ocasionalmente (ou sendo manipulado) pela CIA e caçando terroristas e traficantes numa fase bastante elogiada e inteligente, mas era difícil ver esse personagem coexistindo no universo da Liga da Justiça BWA-HA-HA que compra uma ilha para montar um cassino ou do Superman cuja cidade é destruída e reconstruída com um toque de mágica.

No meio desses dois mundos mais fantasiosos e pé-no-chão/realistas (quase que literalmente até, uma vez que Batman tinha em suas séries uma aura de lenda urbana enquanto era figura pública e líder da Liga da Justiça - e dos Renegados), e com um time editorial que basicamente não tinha muito de time ou de editorial, as histórias do morcegão meio que saiam conforme a cabeça do autor e com a trama que eles queriam sem repercussões ou muito de uma continuidade além de aspectos mais gerais (como a ideia de eliminar o Robin das histórias e fazer do Batman mais solitário e propenso ao anti-heroísmo). Fora isso, meio que tudo valia.

Ao que vale um parênteses grande de novo, porque com vendas melhores que outros personagens da DC, o controle editorial para o morcegão não era exatamente tão extenso quanto de outros personagens nessa época e não existia também muito planejamento. Então você vê essas histórias que vão e voltam sem grande repercussão e em alguns casos repetições (como o Coringa em dois eventos importantes em 1988 ou a aparição de diplomatas criminosos em Detective Comics 590 de Setembro de 1988 e Batman 421 de Outubro de 1988).

Nisso você tem uma certa tentativa de produzir algo mais 'realista' com vilões que são traficantes e terroristas (ao invés dos tradicionais bufões fantasiados), mas acaba com situações igualmente mais violentas e mortes acidentais (ou não).

Então, sim, existia maior flexibilidade na ideia sobre 'matar' do Batman, mas é algo que ou resultava em condições indiretas (como em Ano 2 citado no vídeo, por exemplo), ou expondo uma luz mais sombria no personagem (como nos filmes de Tim Burton, e, por tangente, um dos motivos de suspensão de contratos com produtos de marketing e que levaram à substituição de Burton por Schumacher... E a definir de uma vez que o personagem abraçasse um viés mais heroico definitivamente para separá-lo dos vigilantes e anti-heróis assassinos de garras afiadas e armas potentes (que, vale lembrar, é o ponto e a moral de A Queda do Morcego a partir de 1992 com o Batman tradicional substituído pelo mais violento e assassino Jean Paul Valley).

O que, honestamente não muda em uma vírgula os fatos do texto da semana passada.

Sim, o Batman já matou antes (em outros tempos com os quadrinhos buscando histórias mais 'realistas' - que envolvem invadir uma embaixada, matando uma pessoa que está ali, sem nenhuma consequência ou ramificação), inclusive o Coringa. E isso não impediu o personagem de voltar como se nada tivesse acontecido.

Nenhum comentário:

Postar um comentário