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25 de maio de 2024

Dragon Ball - Uma longa análise

(Esse post é uma homenagem atrasada ao brilhante Akira Toriyama e demorou um pouco para tomar forma e chegar a versão atual).

Dragon Ball foi publicado entre 1984 e 1995 em 519 capítulos (divididos em 42 edições originalmente), mas que também ficaram conhecidas com duas fases, a primeira de Goku criança (até o confronto com o vilão Picollo, o que dá 194 dos capítulos) e a segunda, chamada Z (a partir do nascimento de Gohan até a batalha com Majin Boo, o que dá 325 capítulos, ou seja, quase o dobro da primeira fase). Existem vários filmes (com histórias originais) além de séries derivadas (como GT, Super e a ainda em produção, Dragon Ball Daima), mas nada além da série original escrita e criada por Toriyama será analisado nesse texto (que já será longo o suficiente como está). 

A série começa com tons bem mais humorísticos enquanto se inspira em Jornada ao Oeste (que é um romance/folclore chinês datado do século XIV), com Goku com seu rabinho claramente inspirado no Rei Macaco da história, e, flui bastante rápida com 22 capítulos (das duas primeiras edições) compilando a apresentação de vários das principais figuras da fase de Goku criança (Bulma, Mestre Kami, Yamcha e companhia) assim como os principais elementos (da busca pelas esferas do Dragão, de sua função na realização de desejos - e, não muito depois, que haveria um torneio entre as buscas pelas esferas, elemento que acaba se intercambiando até o final dessa fase). Resumindo de maneira bem geral, a ideia é a de que existem 7 esferas mágicas espalhadas pelo mundo que quando reunidas podem realizar qualquer desejo (ainda que, mais para frente seja revelado que existem algumas regras como de que uma pessoa só pode ser ressuscitada uma vez, por exemplo) e depois de realizado esse desejo as esferas se espalham novamente pelo mundo perdendo sua magia por pelo menos um ano.

Há bastante inocência, e, francamente os riscos são bem baixos nos primeiros arcos. A inocência se vê claramente no protagonista que mal entende qualquer coisa sobre o mundo externo (ainda que não melhore muito depois de adulto várias sagas depois) além das artes marciais e lutas, mas mesmo outros personagens que ao menos se mostram mais inteligentes como a garota Bulma, no início da história pretende singrar o mundo e correr inúmeros perigos para desejar encontrar um namorado...

No quesito ameaças, o "imperador" Pilaf é apenas uma piada, e os dois primeiros torneios não trazem riscos significativos (além da honra de Goku, ele não corre risco de perder absolutamente nada). Mesmo a Red Ribbon que deveria ser uma força terrível que pretende dominar o mundo (e traz um exército análogo ao nazismo), não existe risco real quando Goku facilmente derrota fileiras e mais fileiras de vilões sem qualquer ajuda, e as esferas do dragão corrigem todo mal ou consequência negativa.

O tom é mais leve, a violência mais cartunesca e infantil - assim como alguns elementos na história - o que talvez torne mais curioso que também é um dos pontos em que existe maior conteúdo, digamos, picante da série. Com elementos da garota Bulma se exibindo (e até oferecendo favores sexuais - tá, tá, é tudo um subterfúgio e acaba que o porquinho que muda de forma Oolong assume o lugar de Bulma, mas...) em troca das esferas do dragão, assim como alguns momentos de nudez (julgue como quiser se gratuita ou não).

Honestamente é algo que me incomoda um pouco no geral, em partes porque a inocência do Goku diante de alguns personagens claramente tarados como o Mestre Kami cria tanto o humor (que o autor pretendia) como alguns cenários bastante desconfortáveis, mas é mais algo que eu acho importante destacar e ressaltar do que um ponto negativo, até porque vai sumindo e acaba desaparecendo por completo da série (acredito que por parte do segundo torneio o máximo que existe são algumas indiretas aqui e ali - como o pai da Bulma tendo/vendo revistas adultas). No mais, a quilometragem pode variar de acordo com o leitor.

Apesar disso, o real problema dessa fase é o quanto ela descarta personagens e conceitos sem pestanejar. Eis um grande grupo de terríveis vilões no exérctio Red Ribbon, cheio de generais e subalternos com planos nefastos... Pronto, Goku derrotou todos eles antes do café da manhã. Eis um potencial rival que pode ser mais forte que Goku e... (é, mal dá tempo de terminar a frase e já surge alguém muito mais forte que invalida completamente a existência do rival anterior - seja Tenshinhan, Yamcha ou Picollo, ainda que esse último por ser favorito do autor se manteve por bem mais tempo na série).

O aspecto aventura vai perdendo espaço conforme os arcos avançam, e são os duelos e lutas que tem cada vez mais espaço (talvez até pelo tanto de personagens e conceitos descartados, quando Toriyama percebeu que poderia prolongar uma luta por vários capítulos sem precisar de muita trama ou história - mas verdade seja dita, Toriyama consegue produzir lutas extremamente empolgantes e cinéticas que parece difícil largar o material antes de chegar ao final).

As coisas começam a mudar quando Picollo surge e logo de cara sua ameaça se faz notável ao matar participantes do torneio de artes marciais, e, dentre suas vítimas está justamente Kuririn, o melhor amigo de Goku, tornando a ameaça mais real e próxima, e, posteriormente tornando os riscos maiores ao impedir o uso das esferas do dragão por sequestrar o guardião das mesmas, Kami Sama.

A fase Goku criança termina com a derrota de Picollo (que consolida Goku como o mais forte da Terra e finalmente vencendo o torneio de artes marciais), e o casamento com Chi Chi, e, poderia facilmente ser o final da série sem grandes complicações. É um final feliz o suficiente e ainda que não explique todas as coisas sobre as esferas do dragão e vários dos personagens estranhos (como tanto Kami Sama e Picollo que são verdes ou o rabo de macaco de Goku), funcionaria perfeitamente para encerrar o material e, bem, funciona melhor como final que o que acabamos vendo anos mais tarde (e de novo com as séries derivadas GT e Super).

Nisso há um salto de alguns anos de idílica paz em que Goku tem um filho (Gohan) e a vida segue para os demais personagens sem muitas alterações até a chegada de um alienígena terrivelmente forte que afirma ser irmão de Goku. Aqui começa a fase Z e uma das sagas mais memoráveis da série, a saga dos Sayiajins.

Goku e Picollo precisam se unir para derrotar o vilão Raditz, e, após isso se preparar para a invasão dos outros guerreiros Nappa e Vegeta (que aconteceria um ano após a derrota de Raditz, e, que se mostrou muito superior a tudo que eles enfrentaram até o momento). Goku acaba morrendo, e, passa esse um ano treinando no mundo sobrenatural enquanto Picollo treina com Gohan para ajudá-lo a se tornar um grande guerreiro, e, claro, os demais personagens das sagas anteriores estão lá (para serem aniquilados sem piedade por Nappa e Vegeta).

O começo é bem interessante justamente ao eliminar boa parte dos personagens secundários e mover a série em um rumo diferente (eliminando também as esferas do dragão da Terra e forçando os personagens a uma nova busca diferente - por esferas do dragão em outro planeta para restaurarem as esferas do dragão da Terra). Os riscos são maiores que nunca e ninguém está a salvo - sem a rede de segurança de desejos permitindo que tudo voltasse como era antes.

Ao mesmo tempo a saga dos Sayiajins e posteriormente o arco de Freeza explicam vários dos pontos misteriosos e de contingência da série até agora (a origem de Goku e Picollo - assim como as esferas do dragão - como alienígenas), enquanto apresentando menos personagens secundários que vilões nos arcos que se seguem (Freeza tem um exército gigantesco, e nele estão alguns dos personagens mais fortes apresentados até o momento, como as forças especiais Ginyu, e posteriormente com a saga de Cell, além do personagem que dá nome à saga, são pelo menos mais 4 andróides numerados e seu criador). As ameaças e os riscos aumentam exponenciamente, e isso força os personagens a buscarem aliados inesperados como Vegeta (que até pouco tempo era o grande vilão e ceifara a vida de vários dos amigos de Goku) para chegarem ao objetivo em comum.

Cada grupo tem suas motivações próprias (os heróis buscam fins altruístas e querem salvar seus amigos e restaurar as esferas do dragão da Terra, ou prevenir o fim do mundo enquanto os vilões buscam fins egoístas e querem derrotar seus inimigos e consolidar seu poder) ao passo que essas motivações são trabalhadas e desenvolvidas, de forma que ao final do arco conhecemos melhor Vegeta e empatizamos mais com o antigo vilão, assim como os andróides no arco de Cell.

Da mesma forma os vilões são construídos cada vez mais como pessoas terríveis e cruéis. Sádicos que sentem prazer em destruir o que há de bom e puro e que vivem para esmagar os mais fracos (o que vão fazendo de maneira gradual até que encontram seu fim diante de um dos protagonistas da série).

Goku deixa o papel principal para o filho Gohan, ainda que ele continue decisivo para as grandes batalhas - mas ficando no banco treinando, se recuperando ou viajando durante o desenvolvimento das tramas, até o momento em que literalmente passa a tocha para ele na derrota de Cell e que efetivamente deveria ser o final da história (seria satisfatório e uma conclusão digna e legítima).

No entanto após a derrota de Cell há um novo salto de alguns anos quando surge o novo vilão Majin Boo que ao contrário dos sádicos monstros de arcos anteriores é só uma figura de cara tola que é literalmente manipulado por seu mestre até que resolve agir por conta própria (e continuar sendo um personagem sem graça).

Me parece que o material existe mais para ser um epílogo (pois é bem nisso que ele começa, com os tempos de paz, Gohan no colégio e tudo mais e a revanche entre Goku e Vegeta) visando alguns marcos como o aniversário de 10 anos da publicação e o capítulo 500 mais do que, bem, uma conclusão interessante para a série (o que, como eu disse várias vezes durante o texto, poderia funcionar muito bem em vários outros pontos anteriores).

A saga final falha ao oferecer um vilão que é indestrutível ao mesmo ponto que não tem motivação ou é interessante, o que só prolonga a história enquanto os heróis gastam ideias e técnicas para tentar vencê-lo... De forma geral ele é um marshmallow rosa idiota e nada ameaçador, mas que, como o lacaio Dibura resume perfeitamente:

Isso fica ruim porque, bem, capítulo após capítulo o personagem não evolui, cresce ou se torna mais interessante. Ele começa um marshmallow rosa idiota e nada ameaçador e ele termina um marshmallow rosa idiota e nada ameaçador. Tá, ele é super forte e indestrutível - e causa enorme caos e destruição, além de matar gente a torto e a direito transformando essas pessoas em doces - mas falta alguma personalidade para torná-lo interessante e ameaçador. Ele é só idiota.

Mesmo depois quando o lado maligno de Majin Boo (que é roxo e não mais rosa) aparece, não existe grande mudança. Sim, ele é "maligno", mas continua idiota e sem personalidade (a menos que ser menos malvado que o primeiro vilão da série, o Imperador Pilaf conte como uma personalidade).

No geral, o arco final fica patinando sem ter uma direção clara para a história ou uma conclusão lógica em vista e a história só vai se alongando. Vegeta se sacrifica - que não serve de nada, Gohan passa por toda uma série de procedimentos com o Supremo Senhor Kaioh - que não serve de nada, Goten e Trunks aprendem a técnica da fusão - que não serve de nada, Goku se transforma no super saiyajin 3 - que não serve de nada, e por aí vai... Mesmo quando Majin Boo finalmente é derrotado, ainda surge um novo epílogo que acaba parecendo vazio, e, pouco conclusivo (e justamente por isso que tantas séries com GT e Super - além de filmes) continuem a história depois disso.

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