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22 de dezembro de 2022

{Deixa eu te explicar...} A diferença tonal de Adão Negro (e da DC de Geoff Johns)

 Sim, temos uma parte três afinal de contas, e, essa será a parte final (inclusive de 2022).


Adão Negro é um filme de 2022 com um problema sério que fica incrivelmente óbvio na primeira cena em que The Rock aparece usando o manto do personagem que dá o título do filme. Depois de momentos diretamente saídos de um filme da Marvel com piadas idiotas (que não faria rir nem um fã de Adam Sandler - sacou, o outro Adam), nós temos a primeira aparição do herói titular da história, e ele prontamente eletrocuta um homem, arremessa outro com tanta força que causa seu desmembramento e nos minutos seguintes causa uma enorme destruição (e um número gigantesco de assassinatos ao som de Rolling Stones). Não melhora muito quando ao final do filme chega-se a conclusão de que, de vez em quando, um herói mais violento é exatamente o que se necessita (sabe, o oposto da conclusão do Reino do Amanhã e de basicamente tudo o que o Geoff Johns - cocriador do universo compartilhado de filmes da DC e com o dedinho em boa parte de tudo que a própria DC vem fazendo nas últimas décadas em termos de quadrinhos).

O tom do que o filme produz em sua 'comédia' claramente é para um púbico mais jovem (ainda que eu realmente não entenda que público jovem eles esperem que entenda a referência a filmes de western spaghetti, a presença do Fonzie, Henry Winkler, no filme ou músicas dos Rolling Stones), e as imagens dessa comédia infantil - e infantilizada - destoam claramente das imagens violentas e pesadas.

Não é algo que converse com um público adulto - pois não oferece reflexão ou dilemas efetivamente complexas - sabe, como Shaun of the Dead refletindo sobre rotina da vida adulta que nos torna em zumbis ou Hot Fuzz sobre como mesmo uma pequena comunidade pode pender para um estado policial fascista com a justificativa do 'bem maior', ou mesmo mantendo no gênero de super heróis, como a natureza humana (e superhumana) de Miracleman de Alan Moore.

No entanto, e aí é algo que mostra talvez o mais absurdo da história toda pra mim, com uma classificação indicativa de 14 anos - sendo a história de uma criança que grita o nome 'Shazam' para realizar suas fantasias infantis de se tornar um campeão grande e forte, e que, vamos lembrar, a DC/Warner fez muito bem em 2019 ao produzir algo na toada do clássico do Tom Hanks, Quero ser grande, mas com super heróis - e algo que parece feito para vender brinquedos nas mais diversas redes de restaurantes disponíveis com tantos personagens chamativos e interessantes (ainda que não no filme), e a Warner/DC parece ter esquecido o que aconteceu com a Warner/DC na década de 1990 quando Tim Burton era diretor para os filmes do Batman, e aquela rede de restaurantes com um M amarelo bem grandão fez um enorme boicote (que incluiu plantar crianças atemorizadas em programas de televisão e nos jornais dizendo que o filme de 1992 era assustador demais, além de não produzir os brinquedos junto com aquele lanchinho sem-vergonha).

Em 2022 a empresa não enxerga que colocar o herói eletrocutando uma pessoa em sua primeira aparição (e com uma classificação etária de 14 anos) não faria exatamente o material chamar a atenção de crianças e pais.

Claro que existe outro problema bem maior no filme, ao apontar um herói internacional que critica a opressora máquina militar norte-americana e seu senso de justiça (mesmo que aqui e ali e sem enfatizar com todas as letras que é o imperialismo norte-americano o problema - afinal são organizações paramilitares que controlam o país lá, poxa...) promovendo um campeão do oriente médio, o que, obviamente não traduziria bem com o público do Trumpnistão nem que o filme fosse bom (e que prefere sempre a bobageira unfanista da 'Murica em primeiro lugar). Mas não vamos fingir que o filme fracassa por esse motivo - como eu disse no primeiro parágrafo, já a primeira cena do Adão Negro mostra que a coisa toda já não funciona bem desde o começo, e, se eu tiver que ser bem honesto, não melhora.

Em termos narrativos, o filme tenta condensar em duas horas e pouco a história de um país imaginário com seu campeão imaginário (desaparecido há 5 mil anos) e todo um pelotão de super-heróis (que existem há gerações como é apontado pela presença de Pierce Brosnan e do já citado Henry Winkler) que coexiste(m) no universo DC - sabe, com Amanda Waller do Esquadrão Suicida fazendo uma pontinha, e, junto dela outro personagem que aparece na cena do meio dos créditos (e que, sim, também bizarramente parece uma referência a uma animação da DC com os super pets). Nas mãos de uma equipe competente, talvez até funcionaria, por mais que seja difícil manter o equilíbrio de tantas peças se mexendo ao mesmo tempo...

Só resumindo, a Sociedade da Justiça não tem lugar algum nesse filme (ela nada agrega a estrutura, e, francamente as escolhas dos integrantes do grupo deixam muito a desejar também - o analítico Senhor Incrível com suas Esferas T ao lado do detetivesco Sandman seriam inclusões muito mais interessantes que Ciclone e o Esmaga-Átomo só pra não me alongar muito), pelo contrário. O filme perde tempo do desenvolvimento e da jornada do herói de Teth Adam e do Adão Negro (que não tem nenhum desenvolvimento no filme - ele começa o grande, poderoso e irrefreável Adão Negro, e ele termina o grande, poderoso e irrefreável Adão Negro - mas ele derrota um demônio genérico no processo).

Poderíamos ter aqui um vilão em comum ao grupo e ao Adão Negro como Mordru, Eclipso ou Johnny Pranto - e cada uma dessas escolhas funcionaria muito melhor no contexto do filme que o que nos é apresentado, além de justificar a presença da Sociedade da Justiça e sua união para deter um inimigo em comum. Inclusive nisso poderíamos justificar a ausência do Shazam (já apresentado no DCU) ou mesmo outros dos inúmeros buracos lógicos da trama.

Droga, até mesmo na melhor piada do filme - quando o Senhor Destino faz uma piada de humor negro com um personagem secundário - não funciona justamente pela inconsistência tonal entre direção e roteiro, mas não só isso. O protagonista The Rock funciona (?) quando atua em comédias ou filmes de ação em que não se levam a sério, principalmente porque ele é um ator extremamente limitado (com sua formação em "atuação" derivada da Luta Livre) e quanto mais o roteiro exige de uma performance contida e com qualquer nuance, menos ele consegue fazer.

Resumindo: Uma bagunça completa.

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