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31 de julho de 2020

{Editorial} Se não tem Nobel, vale o ignóbil...?

Algumas semanas atrás, em meio a mais um dos muitos bate-bocas estapafúrdios (e sem sentido) envolvendo o futebol brasileiro, um certo comentarista, obviamente muito qualificado e competente afinal trabalha para o setor esportivo da Jovem Pan, disse, como um bordão ou como o arremate de seu argumento "Mas o que se esperar de um país que não tem um Nobel ou um Oscar...?".
A primeira vista, esse vômito disfarçado de comentário ou provocação parece algo inócuo e tolo. Um mero chiste...
Mas não é o primeiro chiste similar que já ouvi - nem a primeira vez.

Claro, que poderíamos questionar quantos prêmios Pulitzer (ou ao menos prêmios Shell) este senhor comentarista possui antes de analisar seu comentário, mas a falácia desse pensamento, que, reitero é comum a um certo conjunto demográfico que notadamente admira mais esportes e possui menos neurônios ativos que o número de bolas em campo durante uma partida de futebol, esse tipo de raciossímio reverbera sem enxergar a estupidez de sua não equivalência.

O Brasil em seus quinhentos anos nunca foi chamado de país da Química, da Física, do Cinema ou da Literatura. Mas muitas vezes já foi o país do Futebol.
Inclusive já sediou duas Copas do Mundo, mas nunca sediou a cerimônia do Oscar ou prêmio Nobel ("curiosamente").
Também é notável que existe uma pequena diferença entre os salários de profissionais de pesquisa e profissionais do futebol, mesmo técnicos (e mesmo aqueles responsáveis pelos maiores fiascos da história do esporte profissional), assim como condições de trabalho entre atletas e pesquisadores.

Mas, quer dizer, sabemos que é bem provável de cortarem a verba de um campeonato ao meio para garantirem a aprovação da reforma da previdência ou algo do tipo, né?

Mais que isso, é importante destacar que a escolha de laureados por prêmios como o Oscar ou o Nobel é bem diferente de um Campeonato.
Ao contrário do Flamengo ou Santos que vão para o Japão passar vergonha e perderem o mundial, cientistas ou cineastas não entram em cúpulas do trovão com suas teses para definir qual sairá vitorioso... É um pouco difícil para uma USP ou Unicamp competir com uma Oxford ou Cambridge que foram fundadas quando Constantinopla ainda existia...

Ainda mais quando o inglês ainda é um idioma 'oficial' para a divulgação de projetos e textos acadêmicos e é o segundo idioma de pesquisadores brasileiros, e não é um empecilho para jogadores de futebol que passam largas e longas temporadas no exterior sem saber falar uma única palavra - vide o Joel Santana - muitas vezes no nosso próprio idioma.
E que vale - e muito - para o cinema. Akira Kurosawa, Ingmar Bergman e Jean-Luc Godard são alguns dos mais respeitados nomes da sétima arte e no entanto, em conjunto, foram agraciados menos na cerimônia do Oscar que Crash - No limite de 2004.

Nestes pontos, inclusive, vale destacar que existe um bocado de brasileiros que foram esquecidos, desprezados ou ignorados de premiações apesar de seu valor e talento (seja Machado de Assis ou Clarice Lispector no Nobel - que também ignorou Jorge Luis Borges, Adolfo Bioy Casares e outros grandes gênios para priorizar autores de língua inglesa nativa - seja o brilhante Cidade de Deus que sequer foi indicado - e é referenciado com um dos filmes mais influentes de nosso século atual - ou Fernanda Montenegro ignorada na cerimônia, para que a ex-esposa de Chris Martin vencesse o prêmio de melhor atriz), mas, real e efetivamente, existe algum jogador de futebol brasileiro que se enquadre nesse mesmo nível e patamar...?

Que podemos dizer que foi ignorado por seu talento monstruoso enquanto outros atletas galgavam glórias e prêmios da Fifa...? Eu diria que o oposto como a bola de ouro para o Kaká, mas, ei, eu não sou comentarista esportivo.

Inclusive com nosso 'rei' do Futebol que é um terrível exemplo fora dos campos com uma biografia que muito mais vezes do que não tiram o brilho do que ele de fato fez dentro de campo.
E, mesmo que fosse (e foi) um grande jogador, Pelé está para o futebol como Paulo Coelho está para a literatura. É famoso, claro e fez algo que é muito reconhecido e louvável, mas francamente tem muita gente melhor que não recebe o mesmo crédito e reconhecimento...

Mas, ei, como esperar do país que perdeu de sete a um numa Copa do Mundo e que tanto baba o ovo de um pra lá de medíocre Neymar que tenha bons e ponderados comentaristas esportivos, né?

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