Pesquisar este blog

24 de maio de 2017

{EDITORIAL} A pergunta que não quer(em) calar

Não quero entrar em embates políticos (acho que o Greg News sumarizou tudo que eu penso e vejo sobre o assunto então não vou ficar repetindo argumentos, mesmo que tenham alguma - ou algumas enormes - diferenças), mas vou penetrar aquele assunto complicado que todo leitor e/ou fã de cinema já contemplou em algum momento de sua vida.

Adaptações.

Por anos esse é o debate que mais vezes eu voltei a, com gente questionando e criticando determinado filme ou assunto devido a essa ou aquela mudança no conteúdo e o quanto o livro sempre é melhor que o filme e etcs e etcs e etcs.

Porque entro nesse debate? Bem, encontrei um grupo de amigos, e, dentre eles havia o grande bazingueiro. O que é um bazingueiro, você pergunta?
Basicamente é alguém que tem a mesma percepção da cultura popular daquela absorvida (como uma esponja) pelo seriado The Big Bang Theory, sabe? A pessoa que tem uma 'Lanterna' do Lanterna Verde (apesar daquilo ser uma bateria que recarrega o anel, tecnicamente) porque isso é legal, e que assistiu todos os filmes da Marvel mas não lê os quadrinhos que são coisa de nerd e esse tipo de argumento. Esse é o tipo de gente que me enoja.
Francamente, pra que querer PARECER que gosta de algo sem REALMENTE gostar de algo?

E para deixar os detalhes o mais vagos possíveis, só vamos dizer que foi sobre Watchmen (porque Zack Snyder - é, o cara que fez o 'Martha!' em Batman v Superman - conseguiu um final melhor que dos quadrinhos) e Constantine (o filme do Keanu Reeves), inclusive do segundo sendo melhor que o seriado de 2014 - o que é particularmente difícil quando o filme tem 1) Shia Labouf e 2) O diretor de Eu Sou A Lenda, além, é óbvio, de ser muito mais tangencial ao universo de quadrinhos (Constantine americano, sem humor negro e sarcástico que deixa de fumar na primeira oportunidade), principalmente da extraordinária história na qual é baseado (O arco Hábitos Perigosos).
Sério, com o ótimo monólogo escrito por Garth Ennis (está na resenha do link anterior) da cena no restaurante, como pode alguém em sã consciência achar que é melhor começar um filme com uma cena idiota sobre uma lança que matou Cristo que está no México?

Isso sempre vai acontecer com quem é fã do material (normalmente há mais tempo, pois leu os livros, os quadrinhos ou o que quer que seja que inspirou a adaptação - o blog? O canal do youtube?) e, normalmente vê as nuances que, bem, a adaptação está deixando batido, e por isso existe a máxima de que 'o livro é sempre melhor que o filme'


No entanto, isso não é verdade.
Kubrick fez um trabalho excelente com suas adaptações de Laranja Mecânica (a escrita de Burgess é indigesta com um pseudoidioma baseado em um sem número de gírias idiotas - e constantemente usadas), 2001 - Uma Odisseia no espaço (que, muita gente não entendeu como filme, imagine o livro que rendeu várias estranhíssimas continuações) e O Iluminado (que é bem fácil de explicar, uma vez que Kubrick impõe muito mais nuances com o relacionamento dos personagens e o contexto do sobrenatural como uma metáfora - enquanto King deixa bem claro que o sobrenatural existe e é tangível). Claro, ainda existe Lolita, que talvez não seja melhor que o livro, assim como Barry Lyndon (que eu nem sabia que era um livro), mas vamos tentar não focar somente em Kubrick por um instante.

O excelente filme de Milos Forman, Amadeus (brilhante adaptação da peça de mesmo nome) consegue uma carga de nuances e dramaticidade, além de enfatizar a genialidade de um roteiro sagaz e inteligentíssimo, assim como construir as óperas, interlúdios e cenas de maneira que é simplesmente impossível a uma peça. De mesma forma, Kurosawa fez um trabalho impecável adaptando Shakeaspeare para o universo do Japão feudal (O Rei Lear é a base de Kurosawa para Ran, e ainda que seja possível argumentar que não é 'melhor', há toda uma gama de contextos que são adidas pela simples mudança de cenário - que ressalta a manutenção da mensagem - que torna o material, no mínimo, tão bom quanto).

Sei que, só nesses dois parágrafos já fica claro que é necessário um enorme talento e capacidade dos envolvidos (todos os diretores citados até agora são geniais e vale conferir a filmografia deles de cabo a rabo) para que o filme seja melhor que o livro (ou peça, ou canção de ninar ou canção da Legião Urbana), mas esse é o fato que se requer para entender porque a suposição de que 'o livro é sempre melhor' é essencialmente falha.

O livro é melhor quando há mais interesse do estúdio que qualidade do diretor envolvido.
Ou quando existe mais talento no diretor que no autor do livro - mas essa eu sei que vai provocar mais indignação, principalmente nos fãs de Stephen King...
Ponto (pode me citar nessa quanto quiser).
Quando existe talento, mesmo que o livro seja tão bom quanto o livro ou complementar, que é o que acontece com a filmografia de David Fincher com Garota Exemplar (existe uma dinâmica diferente no livro e no filme, e a observância dessas diferenças faz com que o conjunto de livro + filme seja melhor) ou Millennium  ou Clube da Luta, e mesmo mudando muito do contexto do original, quando o talento está ali é possível ver o respeito e reverência com a obra original (como o Sherlock da BBC na Inglaterra moderna - ou o mesmo para 007 que não se passe na Guerra Fria).

Nenhum comentário:

Postar um comentário