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11 de fevereiro de 2017

{EDITORIAL} Advogando o diabo

A justiça é cega.
Tarda, mas não falha.
Dormir o sono dos justos...

Bem, eu acho difícil acreditar em qualquer afirmação das tantas que se faz e se repete como se existisse uma noção antropomórfica lógica e coerente do que definimos como justiça atuando em um gigantesco esquema cármico e cósmico.

E não me venha com as piadinhas de que anos atrás você queria estar melhor que o Eike Batista e finalmente conseguiu (e não somente porque ele gastou mais dinheiro neste intervalo que você provavelmente vá ganhar).

Ou que é justo que os policiais do Espirito Santo sofram da ironia do destino de ver o governo mandando-os às favas (como fizeram com professores por anos e anos a fio enquanto a polícia era usada para descer a porrada nos professores).

Não.
Justiça é um conceito que não pertence a uma visão singular e definitiva e é isso que torna a coisa toda complexa, é isso que torna a interpretação e coerência da justiça algo muito mais subjetivo que a mera interpretação de que algo seja ou não legal (no termo de "dentro da lei" e não de "descolado").

O exemplo mais fácil (e inócuo para não levantar bandeiras demais para o primeiro editorial do ano) para isso é a questão toda do Oscar, e, eu nem preciso apontar um caso específico (já que são tantos).
É justo que Deadpool não seja indicado a nenhuma estatueta em 2017? (Sim, sem sombra de dúvidas para qualquer pessoa que assistiu a algum dos outros filmes).
É justo que Cidadão Kane (considerado por muitos o melhor filme já feito) não tenha vencido a estatueta de melhor filme?
É justo que tantos e talentosos atores negros, asiáticos e de outras etnias foram e sejam excluídos tão frequentemente nos principais troféus da agremiação (com o caso mais recente do diretor iraniano que, graças a um veto de Donald Trump não poderia comparecer à cerimônia...)?

Bem... A resposta mais fácil nesses e em todos os casos é a da interpretação lógica do que é o Oscar: Um prêmio. Só isso.
Nada de 'o maior prêmio' ou 'a grande marca e reconhecimento pelo talento e competência' (se fosse assim Sandra Bullock não seria 1) Indicada e 2) Vencedora de estatueta) e sim uma visão subjetiva defendida por interesses bastante particulares (ou não é curioso que em tempos de Bergman, Kurosawa, Truffaut e Goddart, eles mal eram lembrados e reconhecidos e hoje muitos dos melhores cineastas tenham de se contentar com um mero 'melhor filme estrangeiro').

Não é uma questão de justiça, de reconhecimento ou de algo mais que acaso - lembrando o caso do filme resenhado ontem, Conduta de Risco, concorrendo contra filmes espetaculares como Onde os Fracos não tem vez e Sangue Negro, enquanto se fosse lançado alguns anos antes, como vamos dizer 2006 em que o fraquíssimo 'Crash - No Limite' venceu como melhor filme (verdade que contra os muito superiores Munique, Capote e Brokeback Mountain)... Ou 1996 quando 'Babe - O porquinho atrapalhado' foi indicado (sério, eu não estou inventando isso).

Então o que eu quero dizer, para todos os efeitos e causas (não apenas no caso do Oscar mas com este como um aforismo para os demais causos) é que a 'justiça' é apenas uma forma de interpretar os fatos e que, se calha de coincidir com nossa visão e interpretação é 'correta', é 'justa'.
Claro que, para diminuir a intangibilidade da perspectiva abrangente que é a interpretação subjetiva existem diretrizes muito melhor definidas para outras coisas que para a interpretação do que é um bom filme - ou mais amplo, boa arte - e, no metiê jurídico são as leis, que servem de base para nossa (co)existência social pacífica.

Só não deixam de ser subjetivas como quando um juiz liberta sem a menor dúvida três adolescentes (ricos) de assassinarem de maneira brutal um senhor indígena - e um deles vem a se tornar um (sic) policial...

Não, a justiça não é cega.
Ela só não existe, mesmo.

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