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18 de maio de 2016

{EDITORIAL} O fim do MinC

Poderia começar com uma metáfora elaborada e complexa sobre a frugalidade da vida e a necessidade de arte, mas sejamos honestos, o título do texto já entregou o propósito - e isso gastaria significativos instantes para chegar ao ponto.

O fim do Ministério da Cultura junto de outros tantos não vem como exatamente uma surpresa num movimento de redução de ministérios como planejado pelo governo de transição de Temer, mas vem como aquela medida covarde de alguém que não tem ou visão ou competência (e eu particularmente duvido de Temer para ambos).

Começando pela competência, é fácil reduzir o número de ministérios. Na verdade é beeeem fácil.
Pra que um ministério para a Pesca, outro para Minas e Energia e um terceiro para a Agricultura quando todos são derivações do ministério do Meio Ambiente (e todos lidam com as mesmas coisas - licenças, permissões e medidas de controle)?
Claro que a resposta vem com obviedade de que um político patrocinado pela John Deere ou o grupo Monstanto não vai defender a reconstituição de mata nativa ou unidades de preservação, não é mesmo?

Nisso temos um sem número de ministérios agregados para servir propósitos conflitantes (quando deveriam focar como um laser nos problemas reais e efetivos da nação).

Na verdade, numa medida bem ousada e fodona dava para reduzir o número de ministérios para pouco mais que cinco (cada qual com inúmeras pastas e diretorias atreladas para adequar suas necessidades), como numa faculdade com Economia (englobando todas as condições de exatas que não requerem cálculo), Ciências e Tecnologia (englobando as engenharias, obras, meio ambiente e etcs), Humanidades (todos os ministérios de humanas como Educação, Esporte, Cultura e por aí vai - basicamente tudo que não entra na área de Saúde), Segurança Pública e Saúde (os dois últimos são um pouco mais claros em suas atribuições).

Só que é aquela ilusão paliativa que finge que isso é o problema (e não as verbas de gabinete, de auxílio terno e moradia e os milhares gastos anualmente com prostitutas DENTRO do Congresso)... Assim como o absurdo número de congressistas e senadores - mas isso é outra conversa completamente diferente.

E é onde entra a falta de visão.
A necessidade de Ministérios se faz justamente pelo pressuposto da necessidade de corrigir falhas em uma determinada área e apontar medidas e estratégias para melhorá-la (não é exatamente uma surpresa, é?), e de toda uma gama de áreas mal geridas, conduzidas e mantidas nesse país, é difícil encontrar quem sofra mais que a Cultura.

Relegada como supérflua em um mundo de informação incessante e constante, num país que historicamente foi relegado a somente consumir a cultura alheia sem qualquer incentivo para a produção nacional, ela sofre ainda mais quando temos de levar em conta que a peça chave do princípio da cultura é a educação - e essa é uma área que só é lembrada quando se precisam de votos.

No mínimo é problemático relegar a cultura a papel secundário, mas é ainda mais problemático quando a cultura precisa efetivamente de subsídios e estruturas para que possa existir, para que possa competir com os anos de incompetência da cultura internacional servida a pratos cheios enquanto os artistas nacionais tinham de brigar por restos e migalhas. É ainda mais difícil quando existe tanta corrupção nas engrenagens que movimentam o processo (com filmes que quebram bilheteria com salas vazias, que tiveram ingressos magicamente esgotados ou distribuidoras que cobram duas - e mais - vezes pelo mesmo serviço).

Claro, como qualquer um pode concluir, obviamente, não é o fim do mundo.
Tchekhov não recebeu dinheiro do ministério da cultura russo para escrever Tio Vânia, nem Shakespeare recebeu dinheiro da coroa inglesa (na verdade viveu na miséria por boa parte da vida perambulando com uma trupe de artistas viajantes) ou Borges, Bolaño (que inclusive foi exilado) e tantos outros. E, com toda a boa vontade do mundo, é verdade que um bom - e competente - ministro da educação poderia fazer projetos inteligentes e que visem uma melhor estrutura para a cultura.

Na primeira parte, a pergunta é "E se tivessem?" Imagine o quanto Tchekhov, Shakespeare, Borges, Bolaño, Van Gogh, Poe e tantos outros poderiam acrescentar a mais para às artes se tivessem um pouco mais - ou mesmo um pouco - de subsídios?
Da outra parcela, mais otimista, oras, um peixe também pode vencer os 100 metros rasos da Olimpíada do Rio. Eu só não vou prender minha respiração esperando por isso...

Atualização - A "nova" Secretaria da Cultura que é apêndice do MEC está com uma tremenda dificuldade de achar alguém pra assumir o rojão (5 mulheres já pularam fora, incluindo Daniela Mercury, Bruna Lombardi, Marília Gabriela e Cláudia Leitão - ex secretária de economia do MinC - e deve acabar com mais um sujeito caucasiano...) Não muda nada do texto em absoluto, na verdade até ilustra bem o quanto a coisa toda está fora do controle.

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