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20 de fevereiro de 2016

{Explicando o fim} Quem matou Morpheus?

Só alimentando os pombos...

Um dos grandes mistérios de Sandman de Neil Gaiman reflete num pulo cronológico que se dá na saga entre os arcos 'Um jogo de Você' e 'Vidas Breves', em que um romance entre o Lorde Morpheus e uma dama desconhecida se dá, e, colocam o Rei dos Sonhos numa enorme fossa.
Oficialmente, a identidade dessa mulher misteriosa nunca é revelada (ainda que, ao que tudo indique, seja alguém da saga Um jogo de Você, o que faz bastante sentido, e tenha uma certa quantidade de pistas indicando para isso), até porque o tempo não é exatamente uma sucessão lógica no universo de Sandman, com passado e presente se interpolando de diversas maneiras.

Existem três grandes suspeitos, com grandes motivos para executar o plano, e, que podem deliberadamente ou não ter colaborado para que o plano de um dos outros suspeitos funcionasse.

Por ordem de tentativas, primeiro temos o irmão/irmã Desejo, que trama um atentado contra o reino de Morfeus (e, consequentemente o próprio) já no segundo arco da série, 'A Casa das Bonecas' (Sandman 09 a 16, título aludindo à peça de Henrik Ibsen de mesmo nome).
Em outras ocasiões Desejo deixa clara sua rivalidade com o senhor do Sonhar - como na história 'Três Setembros e um janeiro' (edição 31). Rivalidade essa que vem de éons atrás, quando a vida mal havia surgido no universo, quando num jantar diante de todos os corpos celestes (é), Desejo fez com que a namorada de Sonho na época se apaixonasse por outro (história da edição especial 'Noites sem fim' publicado após o final da série).
Embora Gaiman acabe redimindo a personagem um bocado com o arco 'Overture' (sem spoilers, afinal é bem recente ainda), não apaga os eventos das edições seguintes da série, e, toda a animosidade.
Como disse, Desejo pode não causar a morte de Sonho diretamente, mas sem dúvidas elas manipula (e bastante) as coisas nos bastidores... Como a irmã gêmea Desespero durante toda a série, e, sem muita dúvida a irmã Delírio em sua busca pelo irmão perdido no arco 'Vidas Breves' (Sandman 41 a 49 - que acaba como o estopim para a morte de Sonho).

O suspeito número 2 não é nenhum peso pena também. Na verdade é o príncipe das trevas Lúcifer em pessoa, que, logo no começo da série (edição 4) promete se vingar de uma humilhação pública provocada pelo lorde dos Sonhos, ao demonstrar que seu poder (o dos sonhos) é maior que o do próprio demônio. Ainda que Lúcifer apresente um plano terrível no arco 'A estação das brumas' (Sandman 21 a 28 em alusão ao poema de John Keats 'Ao Outono') em que abdica o controle do Inferno e entrega a Morfeus o controle do reino, Lúcifer não parece exatamente satisfeito com a conclusão de seu plano (que não consegue destruir ou abalar em quase nada as atitudes de Sonho).
É verdade que o Lúcifer de Gaiman, mesmo em seus momentos mais inspirados não seja exatamente ameaçador ou uma força a ser reconhecida... Ele mais frequentemente que não é um infortúnio na linha do 'inconveniente'. Ainda assim ele é bastante manipulador - e terrível.

Por último, uma suspeita que tem motivo, acesso à arma do crime (as 'bondosas') e não tem exatamente um álibi para justificar (não que os outros tenham algum álibi, ainda mais considerando que o assassino apontou o caminho ao invés de puxar o gatilho ele próprio). Calíope, a ex-mulher de Sonho viu seu filho sofrer por uma eternidade sem a menor compaixão de seu companheiro na época (e demonstrou certo ressentimento mesmo depois de ser salva pelo rei dos sonhos em Sandman 17).
Veja bem, o desenrolar dos eventos de Entes Queridos/As Bondosas (The Kindly Ones - Sandman 57 a 69) se dá quando alguém joga Lyta Hall na trilha das Fúrias com o pretexto de vingança pelo filho desaparecido, mas, seguindo as regras sobre as conjurações às senhoras - de como elas podem ou não atuar, inclusive sobre a possibilidade de matar até mesmo um dos Eternos (as criaturas como Morfeus e seus irmãos/irmãs), no caso de derramar sangue de um dos seus.

Curiosamente, eu não acredito que o assassino seja qualquer um destes três, ao menos sozinho.
Tudo me parece com um enorme e elaborado plano que o Detetive Poirot se depararia no Expresso do Oriente conforme eu leio e releio Sandman vez.
Vários personagens tem os motivos e recursos para fazer isso - e alguns tem maiores facilidades para colocar os eventos em andamento.
Desejo muito facilmente poderia inspirar a irmã Delírio em sua busca descabida em Vidas Breves, sabendo que causaria na morte de Orpheus e portanto na justificativa para as Bondosas assassinarem Sonho... Mas isso parece um plano muito intrincado e maldoso que somente alguém como, bem, Lúcifer poderia tramar. Enquanto isso, meio que na última faixa vai correndo a personagem que tem, não apenas motivo e arma do crime - mas que saberia exatamente o que levaria uma mãe à beira do abismo.

Essa, infelizmente, é uma ocasião em que eu não tenho a resposta definitiva, e, que inclusive preciso admitir que talvez nem exista uma.
Talvez seja tudo apenas entropia cuidando das coisas - como Destruição deixa claro em Vidas Breves - e não um ultra-elaborado plano.
Isso, é, inclusive, a beleza da coisa toda.

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