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29 de abril de 2015

{RESENHA} Demolidor - primeira temporada

"Você acha que eu sou algum tipo de amador (como eu de fato sou)?" pergunta o capanga mais importante do Rei do Crime ao deixar uma arma carregada ao alcance - e voltada - para a pessoa que ele tenta ameaçar.
Essa cena do episódio 11 da primeira temporada de Demolidor do Netflix é o que, pra mim, resume da maneira mais exemplar o que eu simplesmente deplorei desse material.

É um tipo de construção de cenas e roteiro tão aquém... Tão parvo... Que essa não é nem a pior demonstração dos 'planos' infalíveis do Cebol... digo, Rei do Crime.

Isso é um dos meus grandes problemas com a série, afinal, o 'Rei' é a figura central e o grande vilão da temporada e justamente ele é destacado e boa parte das coisas giram mais ao redor dele próprio que do protagonista da série (sabe, o advogado cego que às noites combate o crime).

Não que seja um material impraticável, nem de longe. É entretenimento 'cerveja barata' - você não está consumindo pelo sabor ou pela qualidade, porque sabe que rapidamente isso sairá de você...
E nesse sentido, como entretenimento cerveja barata ele é divertidíssimo.
Boa interação entre personagens, excelentes cenas de ação, fantásticas subtramas contextualizando personagens secundários... Droga, eu assistiria fácil a uma temporada focada só no Foggy e Karen!
Só que todas essas resenhas babando ovo que estão publicadas por aí, bem, elas me causam alguma preocupação (até porque quase todas vem de sites com baners para a série e/ou Netflix).

Existe uma má concepção de que a televisão moderna precisa de 'tramas complexas', que a ideia de vilão da semana (ou monstro da semana) não funciona mais uma vez que isso diminui a capacidade de desenvolvimento de personagem e o desenvolvimento de uma trama mais intrincada...
E enquanto isso faz sentido para muitos propósitos, existe uma diferença fundamental entre o propósito e a execução.
Funciona para Breaking Bad, The Wire ou Os Sopranos a ausência de vilão da semana e a análise de personagem/situação como o grande tema da temporada/série. EXISTE um tema a ser explorado e abordado.
Existe um personagem com problemas reais e coerentes para que exploremos, para nos aprofundarmos.
Sejamos francos por um minuto: Estamos falando de super heróis aqui.

Todo o drama, todo o desenvolvimento perde um pouco de sentido e propósito quando um sujeito com um anel mágico que cria luz física pode se materializar a qualquer momento... Então o 'desenvolvimento' de personagens deve se fazer de outra forma, e, a forma mais coerente é a do vilão da semana. Funcionou belamente para a série animada de Batman (e do Superman, e para os seriados, que goste ou não, Smallville chegou a sua DÉCIMA temporada, enquanto Arrow já gerou três séries derivadas...), e eu desafio qualquer roteirista, fã ou quem quer que seja a apontar UM filme/seriado baseado em personagens de quadrinho que seja melhor que a série animada do Batman. UM.
Isso permite o desenvolvimento de um contexto maior, de uma perspectiva mais abrangente - permite destrinchar mais os lados e vertentes da persona e do conflito interno desse personagem.

Ainda assim, SE o roteiro fosse bem escrito, SE o plano geral do roteiro descompressado fizesse sentido - e fosse bem planejado - TALVEZ o resultado seria bom.
Demolidor parece o tipo de coisa que acontece quando algum idiota (como o produtor executivo Jeph Loeb, escritor de atrocidades como Ultimates vol 3 e Ultimatum, além de ser o criador do [sic] Hulk Vermelho) assiste uma temporada de The Wire e pensa "Ei, eu posso fazer algo igual a isso!"...
E remove todos os elementos que humanizam os personagens, todo o estudo de situação que caracteriza os personagens menores e oferece brilhantes análises a um mundo mais abrangente - e mostra as falhas de nossos sistemas legais e judiciários na visão sobre um problema bastante real, inclusive levantando perturbadoras conclusões sobre isso.

Remove tudo isso e faz um vilão genérico (mas [sic] 'complexo' pois ele tem problemas para expressar sentimentos e é atormentado pelo crime que cometeu quando tinha doze anos - o que me faz realmente questionar como esse cara chegaria ao topo da cadeia alimentar com tantos competidores vorazes) com um plano idiota que se desmancha mais fácil que uma casa feita de palha (ele tem um contador com todos os registros que comparece a todas as reuniões do sindicato do mal, pelamor!)...

Entendo os argumentos favoráveis de que isso é diferente do que se faz normalmente (em que o vilão é, bem... Competente em suas funções), mas não vejo qual o charme de transformar um personagem tão perfeito como é o Rei do Crime nos quadrinhos (de novo, um empresário/filantropo bem relacionado e bem quisto na comunidade que comanda secretamente um império criminoso gigantesco) nessa mescla que quer ser a versão dos quadrinhos mas com algumas 'melhorias'... E eu odeio isso.
Não que seja impossível melhorar sobre coisas estabelecidas nos quadrinhos, não é isso.
É essa atitude arrogante de que é possível melhorar algo que já está no seu máximo nos quadrinhos.

O Rei dos quadrinhos é tudo que Tony Soprano queria ser, ponto.
O Rei do seriado é tudo que os autores dos Sopranos excluíram...
Preciso mais?

Bem: Pelo menos não fizeram com ele o que fizeram com Melvin Potter - que passou de homem com baixa inteligência e até algum nível de atraso mental para um extra de Simple Jack.
O cúmulo no entanto estão nas doenças tanto da esposa de Ben Urich quanto da mãe do Rei do Crime... Conveniente porque são doenças raras e sem nome e que na hora em que precisam vão causar os efeitos que precisam - ei, ela precisa agir como alguém senil/esquecida, pronto. Ei, ela precisa agir como alguém vulnerável como uma pétala de rosa... Pronto! Ei, ela precisa demonstrar que é a âncora moral da situação através de um discurso complexo sobre coisas que ela provavelmente não lembraria ou saberia... Pronto!

Pouco se discute, pouco se caracteriza... O tratamento é caro, continuado e... É isso.
Se fosse apenas uma personagem eu até entenderia, mas duas?

Eu poderia focar um pouco nas confusas tramas e planos do Rei, nas histórias paralelas que não se desenvolveram direito (É Stick e o Tentáculo, estou falando diretamente com vocês!), mas aqui eu entendo que é mais subjetivo.
Falha, sem dúvidas, mas existe tamanha lacuna para exploração futura de maneira que isso seja reinterpretado de maneira mais favorável... Então é fato de esperar uma segunda temporada para ver, mas ainda acho que o formato do Netflix não favoreça, e, que eles deveriam rever a estrutura de maneira a, ou focar em tramas menores, conduzidas de maneira mais inteligente, ou realmente contratar uma equipe de bons roteiristas para desenvolver uma grande trama que englobe toda a temporada.

Nota: 6,5/10
Passa na manha e na margem, mas ainda está longe de ser bom...

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