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31 de janeiro de 2016

{Tecnicalidades} Making a Murderer

Ontem eu comentei sobre a série, e, hoje, eu entro na parte mais chata - depois de explicar o resumo grandioso eu entro nos pormenores (o que significa que, bem, SPOILERS).

O primeiro ponto, como as próprias produtoras do documentário apontam (e que eu tenho - e teimo - em concordar) é que, mesmo que Steve Avery POSSA ser culpado, não existe um caso que aponte para isso além de qualquer dúvida razoável.

Ainda que, sim, ele possa ser o culpado, o argumento da polícia não corrobora para essa conclusão.
Pra todos os efeitos e causas, pela falta de evidências que demonstrem o que aconteceu efetivamente com a vítima (onde ela foi assassinada e o que aconteceu em seus últimos momentos de vida), tudo o que a polícia encontrou é especulativo.
Avery pode ser o assassino? Sim. Assim como o Pé Grande, o Coelhinho da Páscoa ou o ex-astro do rock Elvis Presley que fingiu a própria morte para seguir sua carreira com assassino serial...

Esse é o ponto que os advogados de defesa argumentam.
- A investigação no caso foi porca, descartando suspeitos claros (o ex-namorado, o assediador cuja identidade não é descoberta, o sujeito com quem ela dividia um apartamento e o mais óbvio de todos o irmão escroto altamente articulado e com cara de culpado) sem verificação de álibis ou um acompanhamento detalhado.
Também existem pistas que não foram propriamente seguidas para estabelecer uma cronologia própria - de novo, suspeitos óbvios tiveram acesso a caixa de mensagens da vítima, o que distorce o tempo entre o primeiro relato de desaparecimento e a aparição do carro.

- O departamento de polícia de Monitowac NÃO poderia se envolver na investigação DE MANEIRA ALGUMA, devido a suspeita de parcialidade (uma vez que Avery estava processando-os e eles eram indiciados num inquérito sobre a ação do estado), o que tira a credibilidade da investigação. E curiosamente, toda prova vital (a chave, que não foi encontrada no primeiro dia em um lugar claro e óbvio, assim como a única bala com traço de DNA da vítima) para a investigação é encontrada por alguém deste departamento... Curioso, não?

- Nisso também existem pontos arbitrários e confusos do argumento da polícia, com uma narrativa inconsistente: A narrativa dos eventos que a polícia fornece não é clara (como aconteceu e o que aconteceu? Nunca é exatamente demonstrado); As provas também não corroboram (não existem traços de DNA da vítima em nenhum lugar na propriedade de Avery - ou do sobrinho que foi tratado como cúmplice (curiosamente, a polícia destaca o trabalho de perito de um homem com um QI abaixo da média para limpar com expertise todo traço de DNA).

- Do DNA, inclusive, existe um ponto assustador sobre o resultado inconclusivo do teste - que é dado em um falso positivo (uma vez que, a própria perita destaca a presença de contaminante na amostra). E isso acontecendo de novo, quando o FBI intervem com um laudo inconclusivo...

(AVISO: Os próximos pontos podem conter certa morbidez e análise investigativa)

- Sobre o 'mestre criminal' que a polícia tenta vender no caso, eu só posso dizer que não me convence.
Ainda que estudos apontem que assassinos seriais normalmente não sejam elaborados e brilhantes gênios criminosos (e sim tenham QIs na média ou abaixo como é o caso do próprio Avery) como a televisão e literatura sugerem, o nível de perícia exigido para o crime requer algo que só mesmo na televisão, enquanto cometendo falhas gravíssimas que, bem, também só na televisão.
Porque ocultar o veículo e destruir o corpo - quando se tem acesso a equipamento para compactar um veículo (que facilmente também destruiria um corpo no interior do veículo)? Ainda mais depois de tão cuidadosamente eliminar qualquer vestígio de evidência (sangue, saliva, fios de cabelo...) de um quarto e garagem cheios de equipamentos.

- Inclusive os vestígios de evidência (sangue, saliva, fios de cabelo E esperma) de Brendan Dassey, o sobrinho que, alega-se, estuprou repetidas vezes a vítima, cortou seu cabelo e garganta, de uma confissão obtida sem a presença de um advogado ou responsável legal (um garoto de dezesseis anos com uma aguda incapacidade de raciocínio).
O argumento de Dassey de se inspirar pelo livro de James Paterson (Beijos que Matam, no original Kiss the girls - que inclusive foi adaptado para o cinema em 1997 com Morgan Freeman e Ashley Judd) para as imagens que criou para o interrogatório também não é tão absurdo em se tratar de um garoto com 16 anos e dificuldade de aprendizado.

Inclusive, há um livro de 2004 sobre interrogatórios de adolescentes/crianças (destacado no link) cujo capítulo 5 destaca:

"Although the majority of child victim/witness studies have focused on the differences between preschool children and older children, there is some evidence concerning older children. For example, Richardson, Gudjonsson, and Kelly (1995) compared the suggestibility of juvenile offenders (mean age = 15.5 years) and adult offenders (mean age = 30.1 years) and found that juveniles were more suggestible (in response to receiving negative feedback) than adults (see also Warren, Hulse-Trotter, & Tubbs, 1991)."

Ou seja, a pesquisa aponta que mesmo adolescentes são bem mais sugestionáveis a feedback negativo que adultos, o que não os torna plenamente capazes de suportar um interrogatório policial desacompanhados.

- Também não há registro ou relato sobre a(s) arma(s) do crime.
O mestre criminal carboniza um cadáver, destrói a(s) arma(s) do crime, todo o DNA... E deixa um carro exposto, somente coberto com meia dúzia de galhos, numa área tangente ao próprio terreno?
Um carro que também - e mais facilmente - seria submetido a chamas...? Ou ao processo de compactação - cuja ferramente existe na propriedade?

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