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14 de novembro de 2015

{EXPLICANDO O FIM} O episódio final de Seinfeld

Faz algum tempo desde o último episódio dessa coluna, não?
Enfim, retomando a um ritmo mais normal com um dos episódios mais bizarros e ainda assim fantásticos do show sobre nada, Seinfeld: The Finale.
Um especial de quase uma hora que muda completamente a estrutura do show (terminado com um dramalhão de tribunal) tem um grande efeito polarizador sobre fãs. Alguns gostam, alguns odeiam mas muito poucos vêem como um dos melhores momentos da série, porque se existe uma coisa que de fato não faz sentido sobre o final de Seinfeld é o quanto ele não faz sentido, e, ora pois, é o ponto de 'explicar o fim'!

Uma coisa é fato: Sem esse final, a série bem possivelmente ainda estaria no ar (como os Simpsons), ou pior, teria definhado para uma triste e depressiva continuidade em que nada mais faz sentido (como os Simpsons).
O show era bastante popular, com uma base sólida de fãs e com as cifras que estavam movimentando, é não só é fácil acreditar nesse argumento, como é fácil prová-lo (Larry David carregou quantas temporadas de seu 'Segura a onda' só com ocasionais aparições dos integrantes do elenco de Seinfeld e uma temporada inteira sobre a reunião do grupo para um episódio especial?).

Primeiro um comentário geral sobre o episódio: Sim, ele é brilhante.
É uma aula magna como deve ser um final de série - retratar os aspectos mais importantes que foram abordados, achar uma maneira de trazer de volta aquelas participações especiais que deram vida a tantos episódios e contar uma história conclusiva da qual não existe mais pra onde seguir.

O final retrata praticamente todos os temas recorrentes dos episódios de Seinfeld, e isso tudo ANTES do drama de tribunal começar e o festival de personagens desfilar.
Dúvida? A premissa do episódio é de que o elenco de Seinfeld após um pouso forçado de um jato particular se defronta com uma situação peculiar (um homem acima do peso sendo assaltado). Não obstante, por não oferecerem auxílio à vítima, o grupo é aprisionado e condenado pela condição de uma lei nova que os juízes locais querem mostrar quão séria é.

Essa é a amálgama de várias críticas sobre a sociedade americana em um único e poderoso golpe.
De novo, retratando temas já abordados, como a frivolidade do sistema judiciário americano - Kramer tem toda uma lista de episódios do chicaneiro Jackie Chiles, processando a companhia de tabaco por deixar seus dentes amarelos ou a de café por vender o produto quente demais... - assim como a incompetência policial - Jerry é assaltado diversas vezes, inclusive questionando sobre a validade de registrar um boletim de ocorrência se as autoridades nunca encontram os itens - e, não menos importante, de todo o circo da mídia ao redor da situação.

Porque a polícia não persegue o criminoso que assaltou o homem acima do peso? Porque a mídia não foca nessa incompetência policial e sim num grupo de pessoas irritantes rindo do outro lado da rua?
Porque o sistema jurídico em si se leva a sério a julgar tamanha mesquinharia quando o verdadeiro criminoso continua a solta, a vítima continua lesada e, indiferente dos atos e situações, o grupo muito pouco ou nada poderia fazer (esse é o quarteto de Seinfeld não as Tartarugas Ninja!).

Todas essas perguntas são bastante importantes e relevantes, e o que é mais importante: Ao invés disso ser o foco do julgamento, se faz todo um circo incluindo trazer toda sorte de pessoa que cruzou o caminho do grupo (dando todo o trabalho de trazer um homem extraditado do Paquistão somente para depor).
E esse cenário kafkaesco (sim, O Processo, um dos melhores livros do autor alemão!) traz uma série de sérias reflexões sobre a vida. E se nós mesmos fossemos examinados dessa maneira e com esse escrutínio sob pessoas que passaram por nossa vida (e perdemos o contato)? Qual o efeito ou marca que nós seríamos responsáveis de imprimir?

Aqui é onde a coisa toda fica meta, e é por isso que é importante entender a prévia contextualização.
Por um lado, o final de Seinfeld busca uma perfeita sinuca de bico em que, os personagens não teriam mais por e de onde voltarem, e, com um final tão confuso e bizarro nem executivos e estúdio ou fãs pretenderiam o mesmo. Ao mesmo tempo, o show busca os fogos de artifício e a pirotecnia para sair num rastro de glória, chamando a atenção (com um episódio mais longo que teve toda uma longa divulgação - inclusive na própria última temporada com um episódio de clipes das temporadas anteriores) e buscando colocar o fã, o espectador como um integrante daquele julgamento - vendo as testemunhas, o circo da mídia, as opiniões de especialistas... Tudo para formar sua própria opinião, pois de forma direta ou indireta é o que fará (oferecendo seus conceitos e veredictos sobre o teor e qualidade do episódio).

Mas, e, tolere um pouco minha linha de raciocínio aqui, essa é a grande sacada da comédia: Subverter expectativas e provocar o público.
Durante a nona temporada - inclusive no próprio episódio - existem vários momentos em que o seriado tenciona em oferecer um final feliz, de que tudo daria certo (Jerry e Elaine voltariam, a grande chance para um programa na televisão que eles passaram anos tentando conseguir e com isso a prosperidade)... E nisso vão seguindo expectativas que o programa infla somente para destroçar ou não levar a lugar algum, e mesmo diante de todo o absurdo e ridículo da situação os protagonistas parecem confortáveis (Elaine lida com o dilema de usar sua 'única ligação' para falar com uma amiga invejosa).

Isso ERA o que eles queriam, e fizeram.
Fizeram os fãs esperarem por um final meloso e até piegas para entregar um final maluco ainda que coerente.
Fizeram o show ficar na memória dos fãs (e daqueles que resolveram assistir apenas o final), deixando uma marca inquestionável durante o auge de sua popularidade.

6 comentários:

  1. Acabei de terminar de assistir Seinfeld e to ainda mind explode hahahaha Misto de emoções...Sei q o post é antigo, mas se ainda estiver por ai, saiba q adorei seu texto

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  2. Crítica perfeita! Esse episódio foi épico.

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  3. Que texto excelente! Concordo plenamente com a frivolidade do sistema jurídico apresentado na história, onde moveram muitas forças para julgar pessoas que nada poderiam fazer diante da situação. Mas aí reside a graça: imagine se você fosse julgado e trouxessem como testemunhas apenas as pessoas que você rejeitou de alguma forma no passado, para quem disse não ou negou alguma mínima ajuda. Um final excelente, não apresentou evolução dos personagens e entregou o banal.

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  4. Que texto excelente! Concordo plenamente com a frivolidade do sistema jurídico apresentado na história, onde moveram muitas forças para julgar pessoas que nada poderiam fazer diante da situação. Mas aí reside a graça: imagine se você fosse julgado e trouxessem como testemunhas apenas as pessoas que você rejeitou de alguma forma no passado, para quem disse não ou negou alguma mínima ajuda. Um final excelente, não apresentou evolução dos personagens e entregou o banal.

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