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5 de junho de 2020

{Resenhas} Moby Dick - Herman Melville

Eu acho que a primeira vez que li Moby Dick eu tinha entre quinze e dezoito anos, numa dessas edições econômicas (pocket) tipo da LPM. Não é uma versão inferior ou muda o sentido do texto - ainda que o acabamento da Cosac Naify com sua editoração soberba, capa dura belíssima e extras fascinantes que incluem um mapa do itinerário do Pequod - só é um fato sobre minha primeira leitura do texto.

Na época, foi apenas um bom livro, mas essa era uma época bem diferente pra mim também (com hormônios a flor da pele na adolescência enquanto me preparando para vestibulares e toda uma dezena de outras situações pras quais não necessariamente estava preparado para lidar, como minha avó com câncer só pra ficar em um exemplo). Devo ter lido com pressa e pouca atenção aos detalhes, e, claro, também carregava eu uma bagagem literária bem menor a ponto de compreender com exatidão tudo o que o livro tinha para oferecer e por dizer.


Moby Dick não é um livro fácil. Ou direto. Ou rápido de se ler.
Por vezes o livro te vencerá pelo cansaço enquanto Ishmael narra tediosamente processos pouco interessantes como a extração de óleo da baleia ou contextualiza a história do direito na pesca internacional da baleia... Tendo tempo, podendo ler aos pouquinhos, capítulo por capítulo, esses momentos mais cansativos vão fazendo mais sentido e se justificando em sua existência: a longa viagem do Pequod é pra representar uma jornada de alguns anos entre a saída de Nantucket até o encontro com o Rachel e, posteriormente, a baleia branca, e essa longa viagem por vezes tem motivos repetitivos (encontros com outros navios que se parecem bastante uns com os outros), por vezes banais ou sem propósito (como apresentar o carpinteiro do navio em dado momento).


Só que tudo isso serve para levar o leitor que ao começo do livro está tão verde quanto Ishmael para um dedicado conhecedor do assunto ao final da leitura. Ao menos um dedicado conhecedor ao ponto do ano 1800 e poucos (afinal, a baleia é chamada várias e várias vezes como 'peixe' no livro, algo que a biologia moderna esclareceu que como mamífero ela respira através de pulmões e não de brânquias, e, claro, pela lógica da época a caçada predatória jamais seria capaz de exterminar as populações baleeiras). As longas explanações de Ishmael sobre como a baleia é análoga ao mito de São Jorge ou outras histórias bíblicas como a de Jó, da história da arte retratando a pesca de baleias tanto como um caráter mais realista quanto mais abstrato (e monstruoso) vão servindo para imbuir mais e mais contexto para uma atividade que é ao mesmo tempo obscura e essencial à época (a baleia era vastamente utilizado pela sociedade vitoriana seja o óleo em lamparinas ou o âmbar em perfumes).

Mais que isso, há o lirismo brilhante na estrutura narrativa de Melville - e brilhantemente traduzida na versão da Cosac Naify, capturando muito bem o ritmo e estrutura narrativa que capturam a imaginação enquanto constroem a sequencia de fatos e eventos descrita pello livro. 

E enquanto a personagem que dá nome ao livro somente aparece nos capítulos finais e seja citada a partir de mais ou menos a metade do texto - quando de fato começam a procurá-la e persegui-la - Moby Dick é uma presença que assombra a obra toda.

É um clássico fascinante que merece ser lido ao menos uma vez, mas, sem sombra de dúvidas uma vez em que você tenha tempo e disposição para encarar a longa viagem a frente.
Se vai encarar como uma jornada obsessiva de um homem em busca de um objetivo inalcançável (tanto o livro como a sua jornada de lê-lo) ou como a história de um homem em busca de aventura (tanto a de Ishmael quanto a sua ao ler) ou ainda de outra forma e interpretação pode modificar a sua apreciação do livro, mas dificilmente diminuirá a qualidade da obra.

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