Na década de 50, em pleno McCarthysmo e toda a caça às bruxas dos Estados Unidos, o 'psiquiatra' Fredric Wertham lançou um livro chamado 'A Sedução do inocente' (capa ao lado) que trazia disparates e absurdos com zero de fundamentação científica, como um elaborado correlacionamento entre violência, analfabetismo e até mesmo homossexualidade com a leitura de quadrinhos.
Eram os anos 50. Qualquer desculpa para perseguir alguém publicamente era uma boa desculpa, e caso as desculpas públicas não existissem sempre existia a KKK. Infelizmente, porém, o 'trabalho' de Wertham teve um enorme peso e impacto na indústria de quadrinhos que ainda ressoa nos dias atuais (acho que já falei sobre isso em outras ocasiões, mas um exemplo bem simples reside na criação do Comic Code - que serviu em estabelecer diretrizes e um código de conduta sobre assuntos tabus para quadrinhos abordarem, dos quais inclui o divórcio. Porque comento isso? Porque mesmo abandonando o Comic Code, a Marvel comics em 2007 para tornar o Homem Aranha 'solteiro' de novo ao invés de recorrer a um divórcio ou algo do tipo recorreu a uma história que coloca o demônio Mefisto para DESFAZER o casamento por um passe de mágica... E é tão estúpido quanto esse parágrafo faz parecer).
Argumentar sobe o absurdo do texto de Wertham é chover no molhado. A correlação é absurda só para manter um contexto simples (droga que tipo de poder mágico um livro ilustrado pode exercer para tornar um cidadão exemplar em criminoso? Ou um heterossexual em gay?) e mesmo num mais abrangente (estatisticamente esse é um absurdo! Só a logística para analisar e comparar resultados - a formação dos grupos de estudo, por exemplo, para definir extratos sociais, grau de escolaridade e obviamente toda uma gama de distúrbios ou ausência deles já prévias à leitura de quadrinhos, para assim compor e estruturar os grupos de estudos...).
Isso nunca impediu os seguidores de Wertham, como nos anos 90 com o crescimento da popularidade dos videogames iniciando as longas cruzadas contra a violência gráfica e pixelada como a responsabilidade e causa da violência nos jovens e adolescentes. Sim, adolescentes dispararam contra outros adolescentes em escolas por culpa dos videogames e não porque o acesso a armas é fácil e mal e porcamente regulado... Que absurdo sugerir isso... É óbvio que a violência em bits e bytes é o que provoca uma reação em cadeia na acentuação da violência, afinal o ser humano sempre foi dócil como um cordeiro...
(EDITADO: Texto escrito, programado e editado ANTES do tiroteio na Califórnia na data de hoje, 02/12/2015. Curiosamente, porém, o texto continua igualmente válido)
.
É algo inclusive curioso quando observamos, em contrapartida, a falta de regulação e escrutínio sobre a indústria pornô ao contrário dos excessos de suposições e implicações da indústria de games, quadrinhos e entretenimento em geral. Tantos e tantos filmes pornôs retratam de estupros e incestos mas no entanto não há qualquer discussão sobre o tipo de correlação ou análise mais Freudiana acerca do tipo de pessoa que se estimula vendo esse tipo de condição - ou do tipo que o produz - e especificamente o que isso tudo implica. Tememos a violência pixelada mas não nos perturba o estupro simulado entre pessoas (sim, atores, ainda que existam todas aquelas histórias dos bastidores da indústria pornô como um ramo bastante obscuro e nefasto, com prostituição, contratos firmados de maneira que deixaria o Dom Corleone corado e o caso recente das notícias sobre estupros fora de cena do ator James Deen)...
(EDITADO: Texto escrito, programado e editado ANTES do tiroteio na Califórnia na data de hoje, 02/12/2015. Curiosamente, porém, o texto continua igualmente válido)
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É algo inclusive curioso quando observamos, em contrapartida, a falta de regulação e escrutínio sobre a indústria pornô ao contrário dos excessos de suposições e implicações da indústria de games, quadrinhos e entretenimento em geral. Tantos e tantos filmes pornôs retratam de estupros e incestos mas no entanto não há qualquer discussão sobre o tipo de correlação ou análise mais Freudiana acerca do tipo de pessoa que se estimula vendo esse tipo de condição - ou do tipo que o produz - e especificamente o que isso tudo implica. Tememos a violência pixelada mas não nos perturba o estupro simulado entre pessoas (sim, atores, ainda que existam todas aquelas histórias dos bastidores da indústria pornô como um ramo bastante obscuro e nefasto, com prostituição, contratos firmados de maneira que deixaria o Dom Corleone corado e o caso recente das notícias sobre estupros fora de cena do ator James Deen)...
O trabalho de Wertham também serviu para ofuscar alguns trabalhos sérios como a pesquisa de Ariel Dorffman sobre a noção imperialista imbuída nos quadrinhos, principalmente Disney (do seminal "Para ler Pato Donald" de 1976), além de perpetuar preconceitos que, com o viés acadêmico da publicação só se reforçaram (com a sugestão do homossexualismo entre Batman e Robin - um adulto solteiro que adotou uma criança órfã - implicando que no homossexualismo do adulto OBVIAMENTE o conduz em posição de molestador, mas mais que isso perversor da moral, bons costumes e modos)
No entanto, e isso é particularmente curioso, em contrapartida a indústria do cigarro conseguiu manter por várias décadas 'estudos' que desacreditavam os malefícios do produto (malefícios já conhecidos desde antes da década de 60, diga-se de passagem, como destacado em Mad Men, e muito bem destacados no brilhante 'Obrigado por fumar', livro de 1994 e filme de 2005).
Mesmo com todos os vínculos entre cigarro e câncer (e a obrigação em imprimir em embalagens o aviso dos malefícios causados pelo produto) a indústria ainda existe. O gigantesco império do tabaco respira e subsiste onde já outras magníficas empresas cessaram de existir...
Verdade seja dita, exemplos não faltam.
Do carro elétrico de Tesla surgindo quase na mesma época do carro de Ford (e desaparecendo graças ao lobby do petróleo, não pela falta de eficiência) ao caso mais recente de Mariana em Minas Gerais em que a Samarco destruindo todo um riquíssimo ecossistema, causando incalculáveis impactos ambientais para a nossa e (muitas) futuras gerações, com tudo isso eles somente foram multados em alguns milhões de dólares (algo similar ao que acontece com toda petroleira responsável por vazamentos, mortes e incontáveis prejuízos ambientais, como o caso da BP em 2010)... Enquanto um grupo de pessoas protestando contra a Samarco foram presas por crime ambiental.
São pesos diferentes praticados de acordo com a conveniência e conivência a que lhes cabe.
Busca-se um bode expiatório para lhe aplicar todo o rigor da lei enquanto alguém se beneficia e escapa pelas rusgas do sistema. Como o título propõe, dois pesos e duas medidas.
Mesmo com todos os vínculos entre cigarro e câncer (e a obrigação em imprimir em embalagens o aviso dos malefícios causados pelo produto) a indústria ainda existe. O gigantesco império do tabaco respira e subsiste onde já outras magníficas empresas cessaram de existir...
Verdade seja dita, exemplos não faltam.
Do carro elétrico de Tesla surgindo quase na mesma época do carro de Ford (e desaparecendo graças ao lobby do petróleo, não pela falta de eficiência) ao caso mais recente de Mariana em Minas Gerais em que a Samarco destruindo todo um riquíssimo ecossistema, causando incalculáveis impactos ambientais para a nossa e (muitas) futuras gerações, com tudo isso eles somente foram multados em alguns milhões de dólares (algo similar ao que acontece com toda petroleira responsável por vazamentos, mortes e incontáveis prejuízos ambientais, como o caso da BP em 2010)... Enquanto um grupo de pessoas protestando contra a Samarco foram presas por crime ambiental.
São pesos diferentes praticados de acordo com a conveniência e conivência a que lhes cabe.
Busca-se um bode expiatório para lhe aplicar todo o rigor da lei enquanto alguém se beneficia e escapa pelas rusgas do sistema. Como o título propõe, dois pesos e duas medidas.
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