Se você tem um ou dois amigos que gostam de livros, provavelmente já ouviu o quanto 'Hollywood entende errado' ou que 'o original é sempre melhor' e outros chavões tradicionais que também se aplicam para outras mídias (meus amigos fãs de quadrinhos são ainda mais chatos, talvez porque eu tenho mais amigos fãs de quadrinhos - e eu sozinho sou mais chato que todos eles combinados).
O que acontece, porém, é que eu não acho que essa premissa seja de todo válida.
Quer dizer, claro, claro, existem muitos e muitos filmes ruins baseados em livros espetaculares, e é até fácil entender porque (são feitos mirando um lucro rápido sem intento de desenvolver um produto de qualidade, algo que o original almejou).
Vejo eu que a palavra chave aqui é a qualidade do roteirista/diretor envolvido, e, obviamente a liberdade oferecida pelo estúdio.
Jurassic Park de Steven Spielberg é genial (fascinante e uma obra prima de Spielberg na arte da desorientação), e, pra mim, muita vezes melhor que o livro de Michael Crichton (muito técnico e primado na ficção científica), e, acho que um exemplo brilhante do que estou falando.
Se você leu o livro de Crichton e viu o filme, sabe que existe uma diferença enorme entre os dois, na figura do empresário John Hammond.
No livro, ele é um empresário frio, calculista e, resumindo em uma única palavra, um tremendo dum escroto. No filme ele é o Papai Noel - um velhinho simpático, bem humorado e que realiza sonhos!
E isso faz muita diferença quando observamos o restante do conteúdo PRINCIPALMENTE o conteúdo que não é exposto com todas as letras, subentendido, que é o de que Hammond está aplicando o golpe mais elaborado de todos os tempos (é, ele não 'clonou' nenhum dinossauro, os criou a partir de concepções artísticas e genéticas - e, é essa a intenção dele em chamar os cientistas para visitar o parque, oferecer validação e credibilidade para seu grande esquema... Ei, se ele engana cientistas que passam a vida toda estudando essas criaturas, que dirá a nós, leigos?), no que as representações diferentes dele fazem com que esse aspecto seja visto de maneiras diferentes.
Frio, calculista e escroto? É, eu meio que esperava que ele elaborasse um plano terrível com o intento de enganar todo mundo.
O simpático Richard Attenborough que demonstra claramente como é um avô preocupado e carinhoso (que manda seus netos para uma expedição com dinossauros assassinos em equipamentos bem pouco seguros)? O talento de Spielberg consegue nos mascarar a perspectiva e possibilidade dele ser alguém vil.
E isso faz toda a diferença!
Um deles ganha nossa simpatia, e portanto nosso perdão por mentir, enganar e ser responsável pela morte de vários funcionários. O outro não.
E isso muda a experiência da compreensão do conteúdo.
E isso é a diferença entre as mídias.
Talvez ver um filme (ruim) de um livro (bom) seja um primeiro contato que vai nos proporcionar a estrutura para compreender o conteúdo, para posteriormente encontrar no material fonte respostas e perguntas que nunca antes nos haviam ocorrido (que acontece bastante com materiais 'obscuros' como Guia do Mochileiro das Galáxias, que só foi publicado até o final aqui no Brasil graças a recepção do filme).
O contrário também nos serve para contrastar as múltiplas possibilidades de interpretação de uma mesma história (algo que faz toda a diferença, se não em todos os casos, principalmente em suspenses como "Garota Exemplar" de Gillian Flynn ou de David Fincher, que a perspectiva do sexo do autor/diretor muda sutilmente a forma de enxergarmos alguns aspectos).
Então, a grande pergunta, porque os filmes ruins de adaptações nos incomodam tanto?
A resposta fácil é que o fã sabe do potencial do material fonte. A resposta mais complexa é que o fã sabe do potencial e nunca vai se sentir realizado se sua visão onírica não for 100% acurada, e é a percepção de fã que realmente estraga a reação ao material.
E essa parte de fã também tem em sua relação o preciosismo absurdo, que em alguns casos é inclusive do próprio autor (como Stephen King criticando vez após vez após vez a versão de O Iluminado de Kubrick - que é mil vezes melhor que o livro, diga-se de passagem - mas não apenas ele).
Preciosismo é uma palavra chave aqui, e, infelizmente não tem cura. Quem acha que tem por direito preservar uma ideia em âmbar sob um pedestal de cristal protegido por avançados sistemas de segurança para as gerações futuras se esquece que isso facilmente só representará mais facilmente no desinteresse e esquecimento. Ideias se constroem e crescem quando pensadas e discutidas.
(Sejam boas ou ruins, afinal, quantas vezes Edison precisou falhar para criar uma única lâmpada que funcionasse?)
O problema que vejo é quando uma obra erra completamente no tom - e se torna mais popular que o original - mas isso não é exatamente frequente. Errar o tom sim é comum (a mudança no final de Watchmen mostrando o quanto Zack Snyder não entende de quadrinhos) e não é preciso nem muito esforço para achar outros exemplos, mas ainda assim aproxima de mais e um maior público.
E essa parte de fã também tem em sua relação o preciosismo absurdo, que em alguns casos é inclusive do próprio autor (como Stephen King criticando vez após vez após vez a versão de O Iluminado de Kubrick - que é mil vezes melhor que o livro, diga-se de passagem - mas não apenas ele).
Preciosismo é uma palavra chave aqui, e, infelizmente não tem cura. Quem acha que tem por direito preservar uma ideia em âmbar sob um pedestal de cristal protegido por avançados sistemas de segurança para as gerações futuras se esquece que isso facilmente só representará mais facilmente no desinteresse e esquecimento. Ideias se constroem e crescem quando pensadas e discutidas.
(Sejam boas ou ruins, afinal, quantas vezes Edison precisou falhar para criar uma única lâmpada que funcionasse?)
O problema que vejo é quando uma obra erra completamente no tom - e se torna mais popular que o original - mas isso não é exatamente frequente. Errar o tom sim é comum (a mudança no final de Watchmen mostrando o quanto Zack Snyder não entende de quadrinhos) e não é preciso nem muito esforço para achar outros exemplos, mas ainda assim aproxima de mais e um maior público.
Não que o filme do Mochileiro das Galáxias seja bom... Longe disso, mas seu lançamento trouxe luz a uma obra que dificilmente teria a mesma recepção de outra forma, e outros tantos exemplos similares são fáceis de destacar, já que livros publicados com as capas de pôsteres de filme são uma condição bastante comum, e, possibilitam a manutenção da obra nas livrarias por um tempo maior!
Então se ao menos elas permitem uma maior representação no mercado dos trabalhos que gostamos e admiramos e isso trará mais possibilidades para autores novos, para vozes novas e perspectivas diferentes... Porque nos incomodar?
Então se ao menos elas permitem uma maior representação no mercado dos trabalhos que gostamos e admiramos e isso trará mais possibilidades para autores novos, para vozes novas e perspectivas diferentes... Porque nos incomodar?
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