Para aqueles que não conhecem, é preciso um pouco de contextualização.
1) Cidadão Kane, filme de 1941 de Orson Welles e considerado o melhor filme de todos os tempos - até com uma expressão para definir um clássico como o "Cidadão Kane" de seu meio. O filme conta a história de um gigante das mídias de comunicação (que começa com uma rede de jornais, mas depois expande para o rádio), o multi-milionário e excêntrico Charles Foster Kane. Mais importante que o 'mistério' da identidade de Rosebud, é uma pequena fala no meio do filme dita pelo próprio Kane "Não acredite em nada que ouvir no rádio", que é um pouco de auto-referência à história do próprio Welles sobre o caso da Guerra dos Mundos, e um pouco de crítica a qualidade da informação (a rádio em questão da cena, é do próprio Kane).
Entender essa questão de manipulação de opinião pública é o ponto chave, e é bom lembrar dessa frase (por isso está em negrito).
2) O filme de 1993 produzido pelo britânico Simon Hartog, não possui exatamente grande brilho ou relevância internacional - como muitos defensores do filme gostam de fazer parecer. O filme foi encomendado pelo "Chanel 4" que é uma alternativa à BBC Londrina no Reino Unido, e, Hartog em seu catálogo cinematográfico bastante modesto: apenas três produções, sendo dois documentários sobre o Brasil - um deles o citado nesse post, o outro sobre pornochanchadas, sabe, o que realmente caracteriza o país. Mas, ei, não é como se a Inglaterra fosse conhecida como uma nação de gente condescendente, né?
3) Ah, o motivo do título "Muito além de Cidadão Kane" é justamente para subverter a noção que Roberto Marinho segue os passos de Charles Foster em seu império midiático, mas consegue manipular os bastidores políticos na terra tupiniquim de maneira que faria Orson Welles corar.
4) Aí é onde os problemas começam... E bastante deles.
Porque, pra começar, ao filme faltam MUITOS dados que corroborem com qualquer uma das acusações (e sim, são ACUSAÇÕES, diretamente apontando o dedo na cara de quem o autor do documentário supõe como responsável - como um filme de Michael Moore). De sua 1:30 h, há muita informação pública (a grade de programação da Rede Globo na época, entrevistas com pessoas sobre as novelas, o passado de figuras públicas e a história das concessões feitas a retransmissoras de tv).
Das teorias do diretor, muita coisa é questionável, e, fica uma impressão clara de manipulação da informação sobre um contexto imperialista ("Oh, esses pobres coitados de terceiro mundo"), criando uma imagem feia e pobre do povo brasileiro. E mais que isso, altamente manipulável.
É o que acontece com a grande teoria conspiratória do filme, que a edição de um dos debates presidenciais da Globo foi o que elegeu o Collor em 1989... Ignorando uma série de fatos e premissas da mesma campanha do candidato (que realmente era um mestre do marketing com fotos como se fosse uma celebridade e slogans criativos e bem feitos, como talvez... Obama em 2008?). Mesmo que Collor vencera o primeiro turno com uma diferença de 10% sobre Lula, e mesmo com a a diminuição no segundo turno, ainda foi de mais de quatro milhões de votos...
E é importante lembrar que parte da notoriedade do filme no Brasil, no entanto, se dá pelo fato de que ele foi... Censurado.
Quer dizer, não exatamente 'censurado', mas a Globo conseguiu uma ordem judicial que impediu a exibição do filme na sua inauguração no Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro em 1994... E com o tempo ganhou a fama de 'censurado', e foi sendo distribuído devagarinho através de bootlegs e finalmente chegou ao Youtube onde ganhou grande notoriedade...
E isso mexe um pouco com o subconsciente popular (o velho 'quem não deve não teme' e coisas do tipo - Se eram mentiras, porque ter medo da exibição do negócio?).
E isso mexe um pouco com o subconsciente popular (o velho 'quem não deve não teme' e coisas do tipo - Se eram mentiras, porque ter medo da exibição do negócio?).
Mas não podemos perder de vista, por exemplo, o grupo Fox - do qual faz parte a Fox News uma emissora completamente conservadora/republicana nos EUA, e você nem precisa assistir ao Glenn Beck chorando sobre patriotismo pra entender do que eu estou falando ou o milionário de mídia Rupert Murdoch dono do grupo, e de diversos jornais ingleses (como o The Sun e o News of the World - jornais envolvidos em escândalos de grampos telefônicos, calúnias contra figuras públicas e manipulação de dados de pesquisas).
Mesmo entrando no mérito de isenção jornalistica e do valor tradicional de informar a população... Temos de nos lembrar que, para manter uma impressora funcionando, são necessários anunciantes, patrocinadores e, bem, um proprietário... Algumas 'notícias' se perdem no caminho (e infelizmente é parte do quid pro quo do capitalismo).
Mesmo entrando no mérito de isenção jornalistica e do valor tradicional de informar a população... Temos de nos lembrar que, para manter uma impressora funcionando, são necessários anunciantes, patrocinadores e, bem, um proprietário... Algumas 'notícias' se perdem no caminho (e infelizmente é parte do quid pro quo do capitalismo).
5) Não que eu queira defender a Rede Globo da situação toda... Por favor... Mas o 'documentário' é manipulador e pouco concreto, e até por isso a emissora de Roberto Marinho conseguiu liminar na justiça contra a divulgação do mesmo - lembrando que, antes de Michael Moore, documentários eram peças compostas por FATOS e associados DIRETAMENTE COM A VERDADE, sem o propósito de figura de entretenimento jornalístico barato.
As acusações, ainda que tenham relevância e fundo de verdade, acabam rasas.
Houve a edição do debate? Sim. Em uma das edições do jornal da noite DEPOIS DA EXIBIÇÃO DO DEBATE INTEIRO - além de excluir a noção da presença de outros grupos de mídia com relação ao fato, dando ênfase a um 'domínio midiático' da emissora carioca.
Houve a edição do debate? Sim. Em uma das edições do jornal da noite DEPOIS DA EXIBIÇÃO DO DEBATE INTEIRO - além de excluir a noção da presença de outros grupos de mídia com relação ao fato, dando ênfase a um 'domínio midiático' da emissora carioca.
Domínio esse que parece o tipo de coisa autoritária e feita sempre por debaixo dos panos como, sei lá, as ações da CIA no continente sulamericano - como o famoso golpe de estado no Chile de 1973, ou às Malvinas..., e que apesar de 'conspirador', oferece um tom muito mais acurado da história do Brasil do período das ditaduras e instabilidades políticas enquanto o mundo vivia numa guerra fria.
Como eu disse lá em cima ENTENDER ESSA QUESTÃO DE MANIPULAÇÃO DE OPINIÃO PÚBLICA É O PONTO CHAVE e é bom lembrar dessa frase (por isso está em negrito e agora toda em maiúsculas).
Enfim, dito isso, taí o filme para você caro leitor tirar suas próprias conclusões:
(Infelizmente legendado não tem com qualidade razoável, e a opção é essa coisa dublada...)
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