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11 de abril de 2013

Gordon Way


Essa era a noite do último dia de vida de Gordon Way, e ele se perguntava se a chuva cessaria ao menos para o fim de semana. A previsão do tempo dizia sujeito a alterações – uma noite de névoa hoje seguida por dias claros porém frios na Sexta e Sábado com talvez algumas ocasionais chuvas no final do Domingo enquanto as pessoas estão voltando para casa.
As pessoas, quer dizer, exceto Gordon Way.
A previsão do tempo não havia mencionado isso, claro, afinal não era o trabalho da previsão do tempo, mas o seu horóscopo fora bastante tendencioso também. Mencionava uma quantidade fora do comum de atividade planetária em seu signo e o forçara a diferenciar entre o que ele achava que queria e o que de fato precisava, e que precisava enfrentar problemas emocionais ou de trabalho com determinação e total honestidade, ainda assim falhara miseravelmente em mencionar que ele estaria morto antes do final do dia.
Desligara o motor próximo de Cambridge e parou em um pequeno posto de gasolina para abastecer, onde ficou sentado por um momento finalizando uma ligação de seu telefone².
“Ok, veja, te ligo amanhã” ele dizia “Ou talvez mais tarde ainda hoje. Ou você me liga. Devo estar no chalé em meia hora. Sim, eu sei quão importante o projeto é pra você. Tudo bem, eu sei quanto ele é importante, ponto final. Você quer, eu quero. Claro que quero. Não estou dizendo que cessaremos o apoio financeiro dele. Só estou dizendo que ele é caro e que deveríamos olhar a coisa toda com determinação e total honestidade. Veja, porque você não aparece no chalé, e podemos falar sobre isso. Ok, claro, sim. Eu sei. Entendo. Tudo bem, pense nisso, Kate. Falo com você mais tarde. Tchau”.
Desligou e continuou sentado no carro por um momento.
Era um carro enorme. Uma Mercedes enorme cinza-prateada do tipo que é usada em comerciais, e não apenas nos comerciais da Mercedes. Gordon Way, irmão de Susan, chefe de Richard MacDuff, era um homem rico, e fundador da WayForward Technologies II. WayForward Technologies obviamente havia falido, pelos motivos usuais, levando a primeira fortuna que adquiria no processo.
Por sorte, ele conseguira acumular outra.
Os “motivos usuais”, no caso, era que ele estava no mercado de equipamentos para computador enquanto todos garotos de doze anos do país repentinamente ficaram entediados com caixas que fazem “Bing”. Sua segunda fortuna, ao contrário da primeira, era com programas de computador. Como resultado de dois grandes softwares, um dos quais é chamado Anthem (o outro, muito mais rentável que nunca sequer fora lançado), WFT-II era a única empresa britânica de software a ser mencionada numa mesma frase que fale de grandes empresas norte-americanas como a Microsoft ou a IBM³. Uma frase que seguiria mais ou menos assim “WayForward Technologies, ao contrário de grandes empresas americanas como a Microsoft ou a IBM...”, mas já era um começo. A WFT estava ali, e ele era o dono dela.
Ele colocou uma fita no som do carro, que aceitou com um suave click e um momento ou dois após Bolero de Ravel soava de oito perfeitamente equivalente caixas de som com mate preto bem mexido. O som era tão suave e espaçoso que parecia com um rinque de patinação. Ele batia os dedos no painel. Figuras de bom grado iluminadas e minúsculas luzes imaculadas passavam por seus olhos. Depois de um tempo ele percebeu repentinamente que este era um daqueles postos de gasolina self-service e saiu do carro para abastecer.
Isso levou um minuto ou dois.


Notas:
2  Nos anos 80 eram comuns os ‘car phones’ como sinal de poder e ostentação, nem tanto pela praticidade...
3 No original é mencionado a Lotus (empresa que fez considerado sucesso, até ser comprada pela IBM).
4 Apesar de incomum no Brasil, esses postos são bastante comuns fora daqui, onde normalmente o consumidor paga antes de abastecer no caixa, que libera o funcionamento da bomba.

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