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4 de abril de 2013

A (última) balada de Harry Roqueiro


(Acho que já trouxe isso aqui, mas teve uma pequena revisão, tiveram algumas correções e acho que agora está mais perto da versão final).

“Maldito ar condicionado”, pensava Harry ao entrar na loja de conveniência onde iniciava seu ritual matinal. Café com um gole de leite desnatado e uma fatia de pão com manteiga, enquanto lia o jornal, que só pagaria se houvesse alguma notícia por lhe interessar (o que nunca acontecia).
“Dia lindo como magnólias, Harry?”, pergunta Carlos, o cubano dono do estabelecimento, de trás do balcão, trabalhando como um louco ao lado de sua esposa Lucia, os únicos funcionários do estabelecimento durante as longas dezoito horas que ele ficava aberto.
Harry jamais entendeu o fascínio de Carlos com as magnólias, ou o que isso de fato significava. Era de sua opinião que o cubano apenas debochasse de seu mau humor matutino. Havia algo que o sorrisinho malicioso de Carlos todos os dias ao dizer isso nos últimos três anos indicavam a existência de algo maior por trás disso... Lucy dividia o mesmo sorriso malicioso com Carlos, quase todos os dias.
E por falar no diabo.
“Bom dia, Carlos. Lucia.”. Lucy era a ex-namorada de Harry, e morava há não mais que três quadras dali, quase a mesma distância de Harry – só que em outro sentido.  Eles ficaram juntos por, quatro, talvez cinco anos, e apesar de toda a direta e indireta implicância, não havia de fato animosidade entre os dois. “Bobão”. Quase nenhuma.
Ele balança a cabeça respeitosamente, fingindo prestar mais atenção ao jornal que a presença dela, enquanto reclamava secretamente do ar condicionado, e contava os segundos para a chegada do Senhor Raio de Sol.
“Harry, meu querido!”. Thomas vinha de longe, com seus braços de nadador esticados como que pretendendo engolfar todo o universo abaixo deles. Como Harry odiava aquele cara! Todo dia era a mesma conversinha, a qual ele somente respondia com grunhidos inomináveis e meneios de cabeça. Quando necessário usava o jornal como escudo para algum possível abraço, que parecia uma necessidade de Thomas, sabe-se lá porque.  “Há quanto tempo não te vejo! Pode deixar que seu café da manhã é por minha conta!”.
Harry odiava muito aquele cara.
E não era apenas por ele ser o homem mais simpático e amável do planeta.
“Bom dia minha flor! Dormiu bem?”.
“Você sabe que sim, querido”, respondia Lucy, todos os dias com um carinhoso beijo nos lábios de Thomas.
Era a deixa para Harry sair e fumar seu cigarro.
Dependendo do dia, seria o terceiro ou quarto. Hoje era o primeiro, e foi com certo espanto que Harry percebeu isso, enquanto terminava o café e se preparava para sair.
“Maldito dia”.

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