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28 de maio de 2025

{Resenhas de Quarta...?} The Inbetweeners

Uma coisa que eu ouço muito quando alguém quer elogiar uma série antiga (e criticar nossos tempos modernos) é para apontar que "Não seria possível fazer mais isso hoje em dia".

Sabe, como com os Simpsons (que continuam a produzir episódios, mas não é possível fazer as piadas que eles faziam trinta anos atrás - mesmo que tenham feito por 25 anos, e muita gente parou de rir já faz um bom tempo), ou, e eu não estou brincando, com o Chaves (eu juro que já ouvi gente comentando isso - apesar do fato que essa merda continua passando na tv).

Só que, e isso é importante, o humor mudou e muda com o tempo, porque, e isso é importante, a sociedade muda, e, não apenas a sociedade como a tecnologia.

Quando Chaplin produzia seus filmes, a necessidade de maior expressividade facial e física era necessidade quando todas as ações e emoções precisavam ser compelidas sem palavras. Isso produz uma comunicação mais dinâmica universal, é claro (e é possível se comunicar de maneira não verbal com um público maior uma vez que barreiras linguísticas se extinguem), mas não muda o fato que os temas e argumentos são datados.

O vagabundo num mundo pós-depressão e pré (e durante) a Segunda Guerra, vivia num contexto muito diferente do mundo a caminho de uma cataclísmica depressão econômica promovida por um estadista incompetente ultranacionalista que potencialmente jogue o mundo em guerra de hoje... Ok, enquanto elementos podem funcionar e colocar sob a mesma luz ou perspectiva (e nisso, mesmo Dom Quixote de quase quinhentos anos atrás também continua contemporâneo), ainda existem elementos e estruturas que o tornam completamente alienígena e não relacionával ao público moderno.

Chaplin em seu Tempos Modernos de 1940 criticava como a industrialização tornava pessoas em meras engrenagens e peças de processos industriais mais complexos, quando hoje quase um século depois a situação se tornou tão mais terrível que ensinamos às máquinas como fazer os trabalhos que nos colocaram como meras engrenagens e peças dos processos industriais mais complexos anos atrás.

O mundo mudou e as estruturas mudaram, e a tecnologia evoluiu não obstante.

Não é mais possível produzir um filme como Chaplin da mesma forma que não é possível produzir uma série como Seinfeld, e, de maneira até bastante simplista, porque isso já foi feito e se faz necessário oferecer algo único e com sua própria voz para retratar as lutas e desafios de seus autores.

Quando The Inbetweeners foi ao ar originalmente entre 2008 e 2010, a realidade retratada na série era bem diferente da realidade de hoje, por uma série de motivos - e nem apenas pela pandemia que mudou muitos hábitos e comportamentos. A série mostrava uma realidade de jovens adolescentes tentando se enturmar, serem descolados enquanto apredendo realidades difíceis sobre a vida e o amadurecimento.

Isso obviamente continua a funcionar mesmo que jovens de hoje não precisem aprender a dirigir (pois podem facilmente acionar um uber) ou não se sentem mais pressionados a beberem ou fumar (afinal não são mais bombardeados com propaganda destes produtos diariamente - e, pelo contrário, aprenderam desde cedo o quanto esses itens fazem mal para a saúde).

A série é um retratato de seu tempo e oferece piadas que obviamente não funcionariam hoje em dia (ou causariam maior desconforto do que o pretendido pelos autores e atores), ou, e aqui é onde eu acho mais relevante, não seriam um comportamento normalizado e aceitável hoje em dia... Só que esse era um comportamento normalizado e aceitável menos de duas décadas atrás - e que é algo engessado por décadas na sociedade - foi mudando para que isso não seja mais normalizado e aceitável.

Sei que os personagens usam termos que hoje em dia não seriam tão bem aceitos (ainda que muita gente ainda os use de maneira particular e privada), mas, seria no mínimo relapso ignorar. É pior do que, bem, qualquer coisa de Seinfeld, Friends ou mesmo Chaves (que continua passando na tv aberta todos esses anos)? Talvez um pouco pela repetição, afinal a série tem apenas 18 episódios e mesmo assim eles usam muitos termos que não seriam aceitos hoje, mas, considerando o contexto do período em que eram termos bem mais aceitos e normalizados (e que, repito, muita gente ainda usa sem o menor medo de represálias hoje em dia), acredito piamente que seja possível ignorar e relevar em virtude de todo o restante que é muito bem feito, escrito e atuado.

Era perfeitamente normal a ideia de se beber para se divertir e curtir, ou toda uma série de comportamentos "românticos" (que hoje se carecterizariam como perseguição, stalking ou de forma geral tóxica), e, verdade seja dita, talvez seja necessário o choque de realidade do comportamento escroto e patético de alguns dos personagens na série para revelar muito sobre o mundo real.

Talvez eu seja o único (mas dúvido muito) a me identificar com vários dos comportamentos e atitudes dos personagens e vê-los potencializados pelo exagero de seu ridículo, é muito fácil perceber nas atitudes deles um paralelo com nossas próprias atitudes exageradas e ridículas.

O conflito dos personagens em lidar com o amadurecimento, de abrir mão de fantasias tolas, como Simon que vive obcecado com sua vizinha e colega de classe Carli - que mal sabe de sua existência - ou Jay que tenta em toda ocasião parecer um especialista em sexo (ainda que seja mais inexperiente e virgem que seus colegas), permite experiências genuínas entre os personagens, e o diálogo muito bem escrito combinado com a ótima química entre o grupo, forma um retrato brilhante desse período na vida das pessoas.

Se ele fica datado após a popularização de telefones celulares, aplicativos e, principalmente da mudança de nossos comportamentos após a pandemia, bem, porque diabos isso deveria impactar sua forma de observar e analisar a obra?

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