Crédito onde ele é devido: David Dastmalchian apesar de seu nome complicado de falar (e mesmo escrever, eu fracassei algumas vezes mesmo lendo no IMDB) é um tremendo ator e produz (mais) uma performance extraordinária no filme.
Além dele, a premissa é realmente interessante - nos anos 1970 (o filme O Exorcista saiu em 1973 e havia toda uma onda de ocultismo e sentimento de medo com relação ao tema na época, algo que o filme contextualiza também) um programa de entrevistas no meio da noite aproveita para fazer um especial de Halloween com uma convidada que (alega que) foi possuída pelo demônio.
Eu realmente acho que isso tinha tudo para dar certo e fiquei realmente empolgado com o filme, e, verdade seja dita até mais ou menos a metade do material eu estava ainda realmente empolgado. Droga, quando a efetiva entrevista com a menina possuída começa eu fiquei realmente surpreendido pela escolha ousada do diretor de cortar o áudio e causar uma gigantesca confusão mental no público espectador para entender o que estava acontecendo... E aí eu descobri que só tinha caído a internet e o filme continuou passando (sem áudio) por alguns instantes, ops.
Verdade seja dita,o filme tem alguns problemas estruturais bastante gritantes e que tornam a coisa toda um exercício de frivolidade. O final é terrível sob todos os aspectos (e bobo também pra ser bem honesto, mas eu volto nesse aspecto com uns avisos de spoilers para quem não viu o filme e ainda quiser arriscar), mas honestamente é a questão estrutural que tornam as escolhas da forma como o filme é contado acabe fracassando.
Veja, esse filme tenta criar uma estrutura de um documentário falso que apresenta esse episódio perdido de um show chamado Night Owls (algo como Madrugador em uma tradução livre pois é um termo justamente para falar sobre quem fica acordado até tarde), e o filme começa contextualizando a vida do apresentador para só então começar com o episódio em questão e meio que seguir todos os eventos como se fosse a gravação do material efetivamente (sabe, sem cortes notáveis, com espaço para os intervalos comerciais - em que muda para as câmeras e conversas dos bastidores).
Aqui temos o primeiro problema, com esses cortes que ocorrem nos 'intervalos comerciais' que ainda que funcionem na estrutura narrativa não funcionam na premissa narrativa (de que isso é um documentário falso relatando esses eventos). Eu confesso que não sei como funcionam câmeras em um estúdio num programa desses - se elas continuam gravando normalmente nos intervalos ou não - mas nem é isso que eu estou argumentando que é o problema, pois em alguns destes segmentos os eventos transcorrem em locais onde não existiriam câmeras, então te pergunto, de onde vem essa filmagem para esse documentário falso?
Não, sério, tem algumas conversas na coxia do estúdio em ângulos que não fazem o menor sentido para essas câmeras (que, sabe, do estúdio seriam fixas para a gravação do talk-show).
E, vamos deixar claro, eu até acho que isso funciona na maior parte do filme por mais que me incomode (porque não é bem usado). O problema aqui na verdade é que essa escolha de construir um filme com a premissa de um documentário falso (com base em um episódio perdido de um talk-show dos anos 1970) funcionaria muito melhor se eles realmente abraçassem essa sacada e fossem de cabeça nela, sabe?
Abraçar o estilo visual como feito em Os Rejeitados (também de 2023), usar de truques para criar mais suspense e tensão como o que eu relatei que aconteceu comigo assistindo o filme (com o silêncio numa cena tensa fazendo parecer um problema de áudio por obra do sobrenatural), mas que facilmente poderia abraçar elementos mais sinistros aqui e ali (como em A Maldição da Mansão Bly - de 2020) e não efeitos especiais pobres (tem várias ocasiões de efeitos de eletricidade que são genuinamente terríveis, mas mais pro final do filme tem alguns efeitos para criar algumas imagens perturbadoras - e enquanto são perturbadoras, os efeitos são bem ruins não obstante).
Nisso caímos no segundo grande problema e o que eu acho realmente o maior. O filme, apesar de seu título e premissa (sabe, de uma Entrevista com o demônio e tudo mais), com seu pôster fazendo um aviso que pode ser perturbador para membros da audiência, bem, eu tenho sérias dúvidas se eu sequer consigo classificar o projeto como um filme de terror. Droga, eu acho que Todo Mundo Quase Morto (que é uma comédia e existe com a premissa cômica de começo ao fim) tem cenas mais assustadoras, e Entrevista com o demônio tem na minha opinião algumas piadas bem interessantes inclusive.
Perturbador? Mais para repulsivo em alguns pontos do final, mas assustador? Eu genuinamente não vejo isso. Então será que dá para chamar de um filme de terror?
Quer dizer, tudo é bastante inofensivo e inócuo no geral que é um filme que facilmente passaria na sessão da tarde exceto pelo final, e, mesmo com ele não precisaria de muito mais que mudar o horário de transmissão para mais a partir das 17 horas quando começa o Cidade Alerta e outros programas de 'jornalismo' policial que trazem bem mais sangue que o filme.
Só que, como eu disse, o final tem alguns pontos repulsivos além de ser bastante ruim, certo? E esse é o pior problema dele ao falhar em fazer funcionar a sua ideia principal e em reforçar os problemas anteriores.
Se você não quiser saber dos spoilers sobre o final, bem, agora é um bom momento para terminar a leitura entendendo que o filme é bem ruim e você passa bem sem assisti-lo (mas o fato que essa é uma resenha lixo já deveria ter te adiantado sobre essa conclusão).
Durante o filme, tem um convidado que participa de todo o segmento com a função de desmascarar charlatões e fraudes e ao final ele tem um espaço para explicar a entrevista como hipnose (o que já de cara é uma péssima explicação e mais que isso, tira bastante do impacto da ideia do filme), e ele faz uma demonstração onde efetivamente nos é mostrada a hipnose em ação (funcionando com os membros da plateia e demonstrando para nós espectadores exatamente como veríamos se fossemos hipnotizados também com os efeitos especiais repugnantes), para na sequência trazer o vt sem os efeitos especiais.
Ok até aqui? A partir daqui temos um novo vt para mostrar a entrevista tentando desmentí-la também e o filme segue numa longa sequência final que denota uma conclusão trágica dos eventos (basicamente todo mundo no palco morre de maneira grotesca) no que desencadeia uma sequência bizarra com o âncora Jack Delroy revivendo algumas de suas entrevistas e 'maiores momentos' (que nos foram exibidos ao começo do programa) sob uma ótica mais macabra (e ainda assim bastante inócua e nada assustadora) para chegar à conclusão que, tal qual na hipnose causada pelo convidado que causou uma alucinação coletiva, Jack Delroy passou por uma longa alucinação e matou todas as pessoas no palco de maneira grotesca (porque o Homem das Bolinhas tem inveja do Coringa).
E o problema disso tudo - além do fato que é uma explicação capenga que não funciona (afinal eu que estou assitindo ao filme não deveria ver o material como se fosse hipnotizado, algo que a própria "explicação" e lógica do filme diz que não foi registrado pelas câmeras), e do fato que nós espectadores não deveríamos ver a sequência das alucinações de Jack (porque isso está acontecendo na cabeça dele e as câmeras não teriam como filmar isso) - bem, é que isso é bastante sem graça.
Se o filme não se desse ao trabalho de explicar (seja com o hipnotismo ou de que foi Jack que surtou e matou todo mundo), talvez tivesse um impacto maior sobre os eventos do final - ou se a explicação fosse boa, o que, honestamente é sempre difícil quando se trata do assunto do filme, que é melhor manter um tom mais ambíguo. Mas a explicação capenga faz com que o negócio todo desmorone e deixe de funcionar e jogue querosene e acenda o lança-chamas para destruir qualquer ponte de boa fé que construiu até o momento com o espectador.
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