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13 de junho de 2019

{Resenhas de Quinta} Nózes de Jordan Peele (2019) CUIDADO, SPOILERS!

Enquanto é fácil dizer que o filme é político e segue um bocado do comentário de This is America do Childish Gambino, parece difícil de decifrar o ponto que o filme efetivamente pretende questionar, e onde ele quer de fato chegar.

Quer dizer, o simbolismo está ali e pra todo lado, mas ele não forma necessariamente uma grande estrutura narrativa coesa, e esse pra mim é um problema fundamental. Eu consigo escrever uma tese de doutorado sobre todos os milhares de simbolismos que o filme levanta (tal como This is America)? Provavelmente. Desde a camisa branca de Lupita Nyong'o (que arrasa nesse filme) que vai aos poucos se tornando mais e mais vermelha, até coisas beeeem mais sutis durante a película... 
Mas isso se alinham e funciona...? Não.

Vamos deixar bem claro: O filme tem muitos predicados, e eu gostei de muita coisa.
A atuação é excelente (com destaque para Lupita Nyong'o mas todo o restante do elenco, incluindo Elizabeth Moss, Winston Duke e principalmente os atores mirins Evan Alex, Shahadi Wright Joseph e Madison Curry), a direção constrói cenas como poucos e existe um equilíbrio incrível entre levidade e tensão durante quase todo o filme. A trilha sonora é brilhante, a fotografia excelente e tem inclusive um bocado mais de coisas para se destacar e eu até poderia fazer uma resenha sem spoilers mas acho que não faria muito sentido, então fica o aviso já desde o título. Se você não quer spoilers do filme (lançado em março), pare por aqui.

Nota: 7,0/10

Quer dizer, no finalzinho, mais ou menos quando o garoto Jason derrota sua contraparte maligna de uma maneira que não condiz com o restante dos eventos ocorridos no filme, o negócio começa a degringolar de tal maneira que eu questionei se a coisa toda fazia sentido.
Ao ponto que depois disso ainda tem toda a explanação digna de vilão de Bond explicando cada ponto de seu plano maligrino (pra que exatamente eu não sei, não me pergunte), e o negócio vai fazendo cada vez ainda menos sentido.

E a gente pode voltar a Keanu de 2016, o primeiro longa metragem da dupla Key e Peele (o diretor de Nós), com roteiro de Jordan Peele e justamente um filme que traz 'dopplegängers' dos protagonistas (que, pra resumir, é um filme com protagonistas se passando por assassinos infiltrados numa gangue para recuperar um gato e encontram os verdadeiros assassinos que se parecem com eles). O que deixa claro que a ideia já estava na cabeça do diretor/roteirista de algum tempo para cá...

Ela só não é muito bem desenvolvida é o meu ponto.

Sim, claro, você pode mascarar as imperfeições do roteiro com todo o simbolismo como se isso fizesse tudo mais lógico... Mas não faz.
É diferente de Magnólia (1999) disfarçando referências aqui e ali (com a previsão do tempo, com a passagem bíblica) enquanto constrói uma história que entrelaça as vidas de diversas de pessoas ATÉ chegar a um evento de proporções extraordinárias. O evento bíblico de Magnólia é irrelevante para as conclusões das tramas de cada um dos personagens.
A reconciliação de Frank (vivido por Tom Cruise) com seu pai no leito de morte, intermediada por Phil Pharma (Phillip Seymour Hoffman) não tem nada a ver com o evento em si, nem desencadeia no evento do final do filme, e Paul Thomas Anderson constrói o filme dessa maneira.
Ele avisa que tal coisa acontecerá através de pequenos detalhes (de novo, os 8 e 2 espalhados pelo filme como menção ao livro do Êxodo 8:2).

Com Nós, esse simbolismo acaba se confundindo na narrativa. 
É a chegada dos 'americanos' de verdade como uma menção à virada diretista de Trump ou é literalmente o povo que vive na Caverna de Platão (ou que são os Morlocks, vou saber eu) que querem sua chance na superfície? O filme não se esforça em deixar em aberto o suficiente para que qualquer alternativa seja justificável - de novo, com a explicação de vilão de Bond mais ao final - e o simbolismo acaba meio que se perdendo conforme essas análises fazem menos sentido (de novo, porque existe uma explicação dada).

De novo no argumento de Jason derrotando seu duplo, a cena toda não faz exatamente sentido com o que aconteceu no filme até aquele momento. E nisso os duplos acabam parecendo incrivelmente confusos como vilões/monstros.
Talvez de novo pelo simbolismo do que de fato representam esses duplos no viés político e tudo mais? Bem, mas de novo não faz exatamente sentido se você levar tudo em consideração, não é?
Eles passaram trinta e tantos anos se organizando para o que eles fazem no filme refletindo exatamente o que no mundo real que passou quase trinta anos se construindo...?

E o problema reside justamente na explanação... Sem ela, o filme seria bem melhor.
Jack Torrance não precisa explicar que ou se é um espírito amaldiçoado preso ao Hotel Overlook (ou que existe uma fenda temporal), assim como Phil Pharma não precisa citar a bíblia para explicar o que está acontecendo...
Sem a justificativa, o negócio flui melhor e, na minha opinião, funciona de maneira bem mais aterradora (pois estaríamos nós espectadores tomando cada qual nosso julgamento do que tudo isso significa com base nos simbolismos e analogias que fomos capazes de entender).

Uma pena.

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