Eu acho difícil avaliar essa obra como um todo, e, farei meu máximo esforço para julgar e explicar meus pontos da maneira mais objetiva possível.
Promethea é uma série de Alan Moore e J H Williams III para o selo ABC (America's Best Comics) que foi por um período o playground particular do Alan Moore dentro da DC - mas, com um certo distanciamento. Dessa época surgem trabalhos bem pouco memoráveis como Top 10, Tommorrow Stories, Tom Strong e o caso em questão, Promethea.
A arte é espetacular e eu não acredito que seria capaz de sumarizar qualquer quadro em particular sem dizer que é algo sobrenatural. J H Williams III está no auge de seu trabalho e produz algumas das peças mais criativas, brilhantes e originais de toda a história dos quadrinhos, e, vale muito a pena conferir sua arte nem que seja somente sua arte.
Fica bem claro que Moore não se esforça na construção de personagens carismáticos ou mesmo para contar uma narrativa coerente com começo meio e fim, ao ponto que a história simplesmente eclipsa no final da edição 23 com o final da longa jornada pelo mundo da magia (iniciada na edição 13, que aqui saiu no volume 1 do encadernado).
A versão da Panini tem algo de peculiar, ao dividir de maneira a compilar em apenas dois volumes o material compilado nos EUA em três: O primeiro com as edições 1 a 12, o segundo com as edições 13 a 24 e o terceiro com as edições 25 a 32 com alguns extras como a edição 36 de Tom Strong e histórias curtas como da Pequena Margie.
Aqui os dois volumes trazem as edições 1 a 16 no primeiro e 17 a 32 com extras, incluindo roteiro, esboços mas SEM a edição 36 de Tom Strong.
Não acho que seja nem ruim nem boa a divisão da Panini... Particularmente faz mais sentido na versão americana pois cada volume traz um arco em particular que são começo, meio e fim da série respectivamente (ainda que, em se tratando do começo fraco e o final decepcionante não é exatamente um positivo) mas me parece, no mínimo estranha, a opção de omitir a edição 36 de Tom Strong em detrimento de material como roteiros e outros extras claramente mais dispensáveis... Mas, bem, não é o tipo de coisa que fede ou cheira.
Seria mais interessante como nota complementar para o final da saga, mas, francamente, não é como se o final fosse relativamente interessante por si só, e, por ser a parte mais fraca da série eu começo a falar justamente dela.
Com um roteiro bem perdido e que meio que aos quarenta e nove do segundo tempo resolve que deve ser mais que apenas tangente ao restante de outros materiais do universo ABC, a fase final da série traz um crossover com Tom Strong e, daí por diante o personagem vira figura fácil surgindo aqui e acolá para justificar que ele e seu grupo de 'heróis científicos' estão tentando deter o fim do mundo (que Promethea irá causar).
Sei que pode parecer spoiler, mas, bem, o mundo acaba assim mesmo e é altamente desapontador. Mais pro 'fim do mundo metafórico' com o início de uma nova era e blá-blá-blá. E aí vem uma edição poster com um monte de figuras bonitas pra fechar a história, com uma série de textos que mais tentam recapitular o que você leu nos capítulos anteriores que qualquer outra coisa...
E, uma grande parte do problema aqui reside na fraca introdução da série que é o começo (dos primeiros 12 capítulos, mas principalmente os primeiros 9). É um começo truncado que, tenta construir um universo diferente - e incoerente - apresentando personagens e mais personagens que, como a conclusão desapontante deixa claro, não vão ser desenvolvidos de maneira apropriada ou significativa.
São personagens que não acrescentam muito (como os 'Cinco Caras Legais' ou mesmo o grupo de vilões do 'Templo') ou mesmo estruturas e tendências pouco interessantes (a tal da 'Textura' que é um tweeter antes do Tweeter e o prefeito com milhões de personalidades que é a Crazy Jane sem graça - e sem Grant Morrison), somados a personagens que são um pé no saco como a Stacia (a amiga da protagonista e pior inimiga do leitor).
Mas aí a série dá uma bela guinada no capítulo 10 e começa a focar mais no universo da magia, contextualizando magia com ciência, com imaginação e religião, e, com isso a estrutura que vai abrindo mão dos personagens secundários desnecessários e das ferramentas inúteis, vai focando cada vez mais na história da protagonista Sophie conforme ela avança no seu aprendizado pelo caminho da magia.
E aqui a série é realmente espetacular.
Com a explicação do mago Fausto sobre símbolos e magia, passando pelo ótimo capítulo Metáfora com as cartas de tarô justapondo o texto e explicando algo muito maior do que a própria série - e explorando meios e ferramentas para produzir uma narrativa, e a série vai cada vez mais abordando e abraçando essas ideias bizarras.
São textos circulares em volta de tiras moebius, splash pages em que você não sabe pra onde olhar primeiro, formas cada vez diferentes para retratar cada pedaço do subconsciente e traçar neles a jornada pela alma/imaginação/magia e construir algo realmente brilhante e único.
Tem as rebarbas aqui e ali em tentar contextualizar essa jornada de Sophie e Bárbara com algo no 'mundo real' (que é o mundo sem graça e mal construído dos capítulos anteriores) mas felizmente nessa grande jornada dos capítulos 13 a 23 o foco está no lugar certo e vale a leitura sem sombra de dúvidas.
Talvez não agrade o paladar de qualquer um com toda a ênfase em misticismo (e eu acredite piamente que se fosse um pouco mais famosa a série já seria alvo de críticas de vários desses pastores políticos), mas vale a pena ler emprestado, ler numa biblioteca ou o que for.
Nem que seja só pra contemplar a espetacular arte de J H Williams III e, se sobrar algum tempo ler os capítulos de 13 a 23.
Nota:
Arco 1 - Introdução (1 - 12): 7,0 (principalmente pelos ótimos capítulos 10 e 12)
Arco 2 - Desenvolvimento (13 - 23): 9,5 (dá umas embarrigadas na mudança de foco para personagens secundários que pouco ou nada acrescentam para a trama principal e que, dificilmente alguém se importava);
Arco 3 - Final e extras (24 - 32 e tirinhas da pequena Margie e etc): 4,5 (final decepcionante trazendo de volta uma série de personagens dispensáveis com reviravoltas - que não impressionam ninguém - inclusive com um capítulo final que parece imitar o excelente capítulo 12 e falhando miseravelmente).
Média: 7,0.
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