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10 de novembro de 2013

It's always sunny in Philadelphia e televisão norte-americana

Já faz um tempo que eu venho tentando entender o bizarro seriado estrelado por ilustres desconhecidos, e que em sua segunda temporada conseguiu embarcar o brilhante Danny DeVito. E eu confesso que nove temporadas de escatologias, humor negro e sarcasmo da mais ácida composição, ofensas, brigas sem sentido e situações tão malucas que beiram o completo e total non-sense... Eu confesso que depois de tudo isso eu ainda muito pouco entendo de tudo isso.

Mas com certeza vale a pena esforçar um pouquinho de tempo e atenção para essa amalucada trupe, e buscar entender o que eles querem dizer.

Exemplo claro essa nona temporada, com o episódio "The gang desperately tries to win an award" (algo como "A turma tenta desesperadamente ganhar um prêmio", o terceiro episódio da nona temporada), incrivelmente afinado e ávido como um laser numa das mais poderosas críticas sobre o sistema existente de premiação na tv - e mais que isso, na sociedade americana.

Por enquanto vamos focar na primeira parte: A TV.

Desde o começo, o episódio flerta com a quebra da quarta margem, brincando com a metalinguagem toda da situação de que o seriado não ganhou nenhum prêmio (apesar de estar na nona temporada e ter um considerável sucesso, incluindo turnês, disputadas sessões na Comic Con e uma boa quantia de fãs - inclusive na crítica). E mesmo assim, nove anos em sequencia sem indicações ao Emmy, Golden Globe ou outros prêmios da tv americana.

Na primeira cena eles já deixam claro o sentimento com relação a isso nas falas dos criadores - e atores principais - da série ("Frank, nós nunca somos indicados para premiações - e não nos importamos porque elas são estúpidas" - "Eu tenho curiosidade pelo fato de nunca sermos indicados? Claro. Eu me importo? Nem um pouco" - "Quer dizer, é um pouco estranho que nunca sejamos indicados, não? - Chega a um ponto que é quase agressivo"), só que o episódio brinca com tudo isso por muito e muito de seu tempo de ar, usando dos contatos dos excelente atores para demonstrar outros injustiçados de prêmios (como Oscar Nunez - da série The Office - ou Chad Coleman de The Wire)... Séries também com muito poucas indicações, e menos ainda em prêmios, principalmente considerando a qualidade assombrosa de roteiro, produção, direção e tudo mais.

E vai além, deixando claro uma série de muletas usadas por outros seriados de humor para desenvolver plots por anos - como a tensão sexual pungente entre o 'casal que não sabe que é um casal' (você sabe, quase toda comédia tem disso, como Ross e Rachel em Friends ou praticamente todo o elenco de The Big Bang Theory - que ganhou Emmys seqüência há alguns anos já...), inclusive brincando com as risadas forçadas de espectadores, assim como o timing de piadas (também igualmente forçado, com um personagem que sai do nada somente para aproveitar a punchline)... Não obstante, após o grupo ficar um pouco alcoolizado, é fácil denotar como passam a ficar mais favoráveis e coniventes aos clichês e todos os padrões existentes em seriados (atores que representam papéis de gente comum, apesar de gente comum não ser tão bonita - e que pra isso não precisa ser engraçado).

Mesmo a iluminação, as cores e os contrastes (o seriado denota através das roupas e iluminação o tom mais sombrio de seus assuntos apontados - Mac aponta isso "E essas cores artificias fortes? Cadê a sutileza?") ao som de alguma música pop adolescente sem qualquer contexto ou relevância para o conteúdo apresentado (novamente, entenda que isso é uma crítica a outros seriados - ganhadores de prêmio). Há a questão do erotismo e sensualidade abordada por outros seriados - rendendo premiações...

Além disso, o enfoque no racismo na televisão americana (algo que dá a volta para o primeiro episódio da série - e aqui entra na questão do racismo da sociedade americana como um todo), sobre o fato da necessidade de apontar a presença de uma pessoa negra, ou denotar que existem negros demais (e curiosamente esse tipo de ambiente não recebe prêmios - crítica nem um pouco velada a ausência de prêmios a The Wire).

Eles inclusive mudam seu estilo e jeito para produzir algo que force a sensação de que eles, com todas suas imperfeições e idiossincrasias podem ser mais próximos do que, bem, as premiações querem - inclusive criando uma música tema incrivelmente genérica e estúpida...

Mas a questão vai além, pois pra isso você precisa analisar um pouco mais fundo a trupe e os roteiros desenvolvidos.
E é onde entra na questão da sociedade americana, porque, de uma forma bastante geral, o grupo do Paddy's Pub são na verdade uma representação mais acurada dos estadunidenses do americano médio, expondo as cretinices e absurdos de toda a sociedade através dos cinco amalucados donos de um bar.
Isso posto demonstra o que vemos desde as primeiras temporadas (de novo sobre a questão do racismo no primeiro episódio da série, mas avançando para questões ainda mais difíceis como religião, aborto e outros tantos tabus).
Eles servem e são aquele 'espelho sombrio', que mostram e focam nas coisas desagradáveis, e que infelizmente cada vez mais representam cada vez mais pessoas...
Fica difícil entender onde termina e começa a ficção com esse grupo.

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