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27 de novembro de 2012

A Agência de Detetives Holísticos de Dirk Gently

Faz algum tempo que eu li meu primeiro livro de Douglas Adams. Acho que era 99 ou 2001. Sei que não tinha saído do colégio ainda, e, obviamente como a maioria dos leitores brasileiros (e do mundo,  presumo eu) foi "O Guia do Mochileiro das Galáxias", o primeiro livro que introduz Arthur Dent, o Androide Paranoide e tantos outros espetaculares personagens.
Ainda acho tudo isso genial, e me orgulho de ter todos os cinco livros da série, além dos três livros de Dirk Gently (o primeiro, cujo nome se encontra no cartão da imagem, o segundo "The Long Dark Tea-Time of the Soul" e o último, semi-póstumo: "The Salmon of Doubt").

E é justamente neste confuso e brilhante livro do detetive holístico que acredita que a resposta dos mistérios se encontra na interconectividade de todas as coisas no cosmos - este mesmo detetive que sequer é o protagonista de seu próprio livro, cargo este de Richard, um fracassado programador de softwares musicais. Talvez o cavalo preso no banheiro mereça noção - a mãe de Adams quando leu o livro disse que essa foi a parte que mais gostou (tanto que está na dedicatória: "Para minha mãe que gostou da parte sobre o cavalo").

A história que se contorce para explicar personagens tão difusos e brilhantes (como o entediado cavalo ou o Monge Elétrico, ou o professor Régio de Cronologia, e claro: o detetive Dirk Gently).

Como um pequeno aperitivo, o primeiro capítulo traduzido humildemente por este que voz escreve (o Monge Elétrico).


Capítulo 1.
Desta vez não haveria testemunhas.
Desta vez havia apenas terra morta, um murmuro de trovão, e a primeira vista da interminável garoa do nordeste pela qual tantos dos eventos mais momentâneos do mundo parecem ser acompanhados.
As tempestades do dia anterior, e do dia anterior a este, e as enchentes da semana anterior, agora cessaram. Os céus ainda estavam repletos de chuva, mas tudo que de fato caíra na noite que se formava era uma melancólica forma de espinho.
O vento chicoteava através da planície escura, imensurável através das baixas colinas e com certa violência através de um vale vazio onde ficava uma estrutura, um tipo de torre, sozinha num pesadelo de lama, e inclinação.
Era um toco de torre. Ficava ali como uma extrusão de magma de um dos mais pestilentos fossos do inferno, e inclinava-se em um ângulo peculiar, como se oprimida por algo de toda forma mais terrível que seu próprio peso considerável. Parecia uma coisa morta, morta fazia eras.
O único movimento que havia era de um rio de lama que deslizava por boa parte do inferior do vale além da torre. Uma milha ou mais além, o rio seguia até uma ravina e desaparecia pelo subsolo.
Porém, conforme a noite escurecia ficava mais aparente que a torre não estava de todo sem vida. Havia apenas uma única faísca vermelha de luz surgindo de dentro dela.
A luz era apenas um pouco visível – exceto é claro que não havia ninguém para ver, nenhuma testemunha, não dessa vez, mas de toda forma havia luz. A cada poucos minutos ela crescia um pouco mais e ficava um pouco mais clara e então se apagava vagarosa até quase nada. Ao mesmo tempo um barulho agudamente baixo acompanhava o vento, crescendo para um tipo de clímax lamentoso, e então também desaparecia, abjetamente, de fato.
O tempo passou, e então outra luz apareceu, menor, mais móvel.  Ele emergiu do chão e movia-se num único circuito circular da torre, pausando ocasionalmente em seu caminho. Então ele, e a figura sombria que poderia apenas discernivelmente carregando isso, desapareceu para dentro uma vez mais.
Uma hora se passou, e ao final a escuridão era completa. O mundo parecia morto, a noite uma nulidade.
E então o brilho parecia novamente próximo do pico da torre, dessa vez aumentando de intensidade com mais propósito. Rapidamente chegou ao auge da luminosidade que já obtivera anteriormente e perseverou, aumentando, aumentando. O som agudo que a acompanhava aumentou de tom e estridência até que se tornou um grito barulhento. O grito gritava além e além até que se tornou um ofuscante som e a luz uma ensurdecedora vermelhidão.
E então, abruptamente, os dois cessaram.
Houve um milissegundo de escuridão silenciosa.
Uma surpreendente nova luz pálida ondulava e pululava de dentro da lama abaixo da torre. O céu fechou, uma montanha de lama convulsionava, terra e céu suplantavam-se uns aos outros, havia uma terrível rosidês, uma súbita verditude, uma persistente larangeza que manchava as nuvens, e então a luz afundou e a noite finalmente estava profundamente, horrivelmente escura. Não havia mais qualquer som além do suave tilintar da água.
Todavia pela manhã o sol nasceu com brilho incomum num dia que era, ou parecia ser, ou talvez até pareceria se tivesse alguém para quem ele pudesse ser qualquer coisa que fosse, mais quente, mais claro e mais brilhante – e tudo junto mais vivo que qualquer dia ainda a ser visto. Um brilhante rio corria através dos escombros do vale.
E o tempo começou a passar seriamente.

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