Não é novidade ver alegorias políticas no cinema, tanto como críticas como em apoio.
Também não é nada incomum ver a ficção como arma para fundamentar uma alegoria (Godzilla com o questionamento às armas nucleares, o Império de Star Wars trazendo os nazistas no espaço - com uma noção mais literal dos arianos como os Stormtroopers, ou soldados idênticos e 'perfeitos').
Mas é fácil de ignorá-las, como Alan Moore brilhantemente descreve - nessa adaptação livre - no epílogo de "Do Inferno", que é muito fácil deixar de ver as pistas porque estamos muito concentrados olhando para outra coisa que chama mais atenção.
Batman Begins (2005), Batman The Dark Knight (2008) e Batman The Dark Knight Rises (2012) buscam de uma forma bastante abrangente, e sem fugir da estrutura do personagem criado por Bob Kane, criar uma alegoria da situação política norte-americana no século XXI. Mais precisamente depois dos atentados às torres gêmeas.
O primeiro filme dá a estrutura do primeiro mandato de Bush. O presidente em formação (Batman) age oscilante, confuso, e quase inexpressivo e tem seu momento decisivo na tragédia (as torres gêmeas ou no caso do filme, a investida de R'as Al Ghul contra Gotham, causando pânico e histeria na população).
No segundo é a vez da guerra ao Terror. O terror sem nome, que assume muitos disfarces, que age em meio ao caos, e o presidente que precisa fazer coisas questionáveis em nome de sua guerra ao terror... Como invadir a privacidade dos cidadãos.
Ao fim da trilogia temos o lugar de um novo presidente (Obama). Um presidente impopular e mau quisto pela opinião pública geral, e que tem uma mulher forte (Michelle/Mulher Gato) ao seu lado, se ajustando a uma nova e inusitada realidade (um presidente novo, com vontade política e a adversidade de um congresso formado por inimigos políticos), tendo de neutralizar a ameaça motriz da guerra ao terror: O número 1 da Al Qaeda.
Enquanto isso é apenas uma pincelada breve, com uma aproximação mais detalhada dos perfis e personagens, é possível ver que existem cada vez mais e mais paralelos. Tentarei manter as análises sem spoilers na medida do possível.
Os paralelos
Bruce Wayne como o tolo playboy milionário que age de forma tola em frente a câmeras enquanto tenta ser profissional, correto e coeso em suas ações enquanto nos bastidores, assessorado pelo fiel mordomo Alfred (ou Dick Cheney - que às vezes parece um tanto sinistro em suas ações - com suas histórias de atear fogo numa floresta para pegar um bandido), e a representação pública de Lucius Fox (ou Condoleeza Rice, a porta voz da Casa Branca).
Como representação dos outros poderes, o judiciário traz Harvey Dent - acionado durante a guerra ao terror, e que acaba por se tornar uma caricatura de si mesmo, após medidas questionáveis que tem por adotar, e o executivo como Jim Gordon - cumprindo as ordens, sempre baixando a cabeça, e curiosamente ganhando mais força e poder conforme o desenrolar dos fatos.
Num segundo momento (ou seja, o terceiro filme, quando ele 'deixa' de ser Bush, e passa a ser Obama) o status quo muda. Alfred tal qual Biden é um tolo iludido, ao qual pouco ou nada lhe cabe. O porta-voz Fox quase não tem expressão (como quem quer que seja o porta-voz da casa branca hoje em dia). Enquanto a primeira-dama surge como uma figura mais popular e querida que o próprio presidente.
Bin Laden?
Batman The Dark Knight Rises traz Tom Hardy (Bane) enquanto a personificação do militarismo religioso, do talibã com seu turbante que nunca remove (no caso sua máscara). A Al Qaeda, se você preferir.
A Al Qaeda regida por Osama Bin Laden (ou, no caso, Talia Al Ghul, filha do vilão R'as Al Ghul - o antigo líder, mentor e figura mór da Al Qaeda - aqui numa figura que mal faz parte do rodapé da história, o senhor Abu Ayoub al-Iraqi), com quem há um flerte temporário (ou seja, o apoio norte-americano à Al Qaeda na década de 80 para financiar a guerra no Afeganistão contra os Russos, mesmo que possa ser refletido de igual situação com o relacionamento de Bruce e R'as no primeiro filme...).
As interpretações variadas
Para definir de fato se os filmes trazem uma crítica dura à política Bush (acentuada no último filme quando é dito - mais de uma vez - que Bruce Wayne DEVERIA e PODE fazer mais pela população que investir somente em sua cruzada), ou se, ao contrário, o filme é uma apologia em tom de elevação ao mesmo (caracterizando-o definitivamente como herói e salvador da América, incluindo aqui a noção do salto de oito anos - ou seja, dois mandatos, e provavelmente dois mandatos democratas - entre os eventos do segundo filme e deste último, colocando a Mulher Gato como Sarah Palin?), é preciso entender o posicionamento político de Nolan sobre as questões americanas.
Mas isso é uma questão pra outra conversa...
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